Saudações.
A trombeta poderosa espalha seu som
Pela região dos sepulcros
Para juntar a todos diante do trono
A morte e a natureza se espantarão
Com as criaturas que ressurgem
Para responderem ao juízo
Um livro será trazido
No qual tudo está contido
Pelo qual o mundo será julgado
Logo que o juiz se assente
Tudo o que está oculto, aparecerá
Nada ficará impune
O que eu, miserável, poderei dizer?
A que patrono recorrerei
Quando apenas o justo estará seguro?
A reputação importa.
Somos livres para escolher, mas escravos das consequências – e seremos, sim, julgados amanhã pelo que dissemos e fizemos ontem e hoje.
Por vezes há a sensação de que não, de que é possível sair impune. Mas acredite: é questão de tempo.
Pertenço a uma casta em franca extinção: aprendi análise à moda antiga, com profissionais old school que, em sua maioria, simplesmente não estão mais por aí. Uma das coisas mais primordiais que aprendi com eles é que, em uma tese de investimento, nada importa mais do que a história por trás dos números.
P/E? EBITDA? ROE? ROIC? Isso tudo é uma imagem borrada, distorcida, de uma trama muito mais profunda e complexa que precisa ser compreendida.
E que não cabe – e nunca caberá – em uma planilha. Na mente de um Tolstói ou Dostoiévski, talvez.
Uma das coisas que mais me incomoda na nova geração que aí está hoje é que, não raro, pouco ou nada sabem sobre o passado das empresas, e pouco ou nada sabem que extrapole o que se encontra nas demonstrações financeiras.
Serei franco: boa parte do que importa simplesmente não está ali. É em outros níveis que a trama se desenrola.
Uma decisão de investimento, bem como decisões de diversas outras naturezas, envolve um problema muitíssimo bem trabalhado pelos economistas e conhecido como problema de agência, ou problema de agente-principal.
Exemplo prático: como investidor, você é o principal, que dispõe de determinado capital para investir na empresa controlada pelo agente. A sua expectativa é de que o agente conduza seus negócios de maneira a rentabilizar seu investimento de maneira adequada.
Observe, no entanto, que há um intervalo temporal entre a sua decisão de investir e a apuração do resultado. Você precisa confiar na capacidade e na intenção do agente em cumprir o mandato que lhe é confiado
Por que reputação importa? Simples: você se dispõe a investir nas mesmas condições junto a dois agentes distintos, A e B, sendo que A tem um excelente histórico de cumprimento do acordado, enquanto B vem de uma sucessão de desavenças?
Provavelmente não.
Mas... como disse, o mercado tem memória curta. As histórias se perdem ao longo do tempo: como ouvi dizer um gestor dias atrás, boa parte dos analistas que hoje recomendam comprar ações estava assistindo Nickelodeon durante a crise do subprime.
Da mesma forma, renova-se o público investidor.
Isso permite que agentes do tipo B voltem, de tempos em tempos, com roupa e discursos novos.
São as empresas-problema que mudam de nome, de estratégia, de gestão... às vezes até mesmo de negócio: os cabelos, quanta diferença; mas a voz – ah, a voz! – continua a mesma!
Sabe que momento é particularmente propício para coisas assim? Bull markets. Quando tudo sobe, todos se sentem confortáveis para deixar de lado o passado como se não tivesse importância. Agora é diferente, os tempos são outros, dizem...
Uma safra de novos homens desponta, com uma minoria sênior fingindo que não lembra o que fez no verão passado, enquanto uma maioria incauta se vê maravilhada com aquele admirável novo discurso.
Um conselho? Busque saber, sim, o que fez no verão passado aquele a quem você confia seu dinheiro.
Por mais que você se sinta tentado a pensar que aquilo é apenas um número em uma tela, não perca de vista: não é. Se hoje o comportamento do ativo financeiro não encontra correspondência direta no mundo real, alongue o período da observação... e você perceberá que, inevitavelmente, isso importa.
Você está preso à reputação de pessoas que, talvez, nem saiba quem são e o que fizeram até aqui. Talvez seja hora de começar a pensar nisso.
Afinal, tem uma guerra lá fora.