Já trabalho no mercado financeiro há 15 anos, e sempre escutei dos nossos clientes, amigos e parceiros que investir lá fora não dá! No Brasil, sempre tivemos uma taxa de juros de dois dígitos e um ganho real muito acima da inflação. Obviamente, a taxa livre de risco norte-americana deveria ser sempre muito menor que a brasileira. Esse gap aumentou com a crise de 2007-2009. De 2007 até 2021 vimos as taxas de juros caírem a uma taxa de 6% ao ano e chegar a zero em 2021.
Com a grande crise do subprime, os bancos centrais mundo afora começaram uma nova era, a era do juro negativo. A grande crise de 2008 jogou o mundo inteiro em recessão, afundou as economias mundiais em um grave problema social e de difícil solução. O então presidente do FED (Banco Central Americano) Ben Bernanke, foi um dos maiores estudiosos da grande depressão de 1929 e sabia quais caminhos deveriam ser seguidos para a recuperação mundial. O medo era uma “japanização” do mundo desenvolvido: o Japão vive um dilema de baixo crescimento e deflação desde o fim dos anos 1980. O país não cresce, tem uma deflação corriqueira e persistente; deixou de ser uma economia pujante para tornar-se um país que não cresce mais.
Qual foi a solução encontrada? Ben Bernanke aderiu à estratégia de utilizar um mega estímulo monetário como solução, o famoso quantitative easing. Os banqueiros centrais definiram como estratégia a manutenção das taxas de juros mais baixas possíveis e ainda utilizam o balanço dos bancos centrais para alavancar as economias. Os bancos centrais passariam a ser compradores de ativos financeiros de toda qualidade. A ideia era pressionar o preço das ações, bonds (renda fixa) e ETFs para cima. Como a economia é toda alavancada, um portfólio apreciado valeria mais, os donos desses ativos poderiam comprar mais ativos com a alavancagem e o seu enriquecimento. Seria uma forma de fazer a roda da economia girar mais rápido, evitaria uma recessão e também a temida deflação.
No mesmo período, os governos mundo afora também abriram as torneiras e gastaram muito em incentivos. A maior parte do mundo desenvolvido viu os seus orçamentos entrarem em grandes déficits fiscais, gastando muito mais do que o governo arrecada. Essa dinâmica ajudou na recuperação global, mas, por outro lado, vimos que as dívidas de alguns países aceleraram muito. Alguns casos emblemáticos como Grécia, Portugal, Espanha e Itália encheram as manchetes dos jornais. Não se limitando aos países europeus, os EUA entraram em evidência, pelos menos motivos. Vimos um aumento crescente de seu déficit, problemas com os bloqueios das contas públicas devido ao estouro do teto de gastos e ainda, os rebaixamentos de ratings pelas agências de risco. Esse período acima foi conhecido como “A grande bonança”, um período de grande prosperidade, dinheiro barato e valorização de ativos.
Tudo começa a mudar no fim de 2019. Começam a aparecer os rumores de um vírus chamado COVID-19, que provocou em 2020 a maior pandemia do mundo desde 1918, a gripe espanhola. Essa foi a gota d’água da expansão monetária pelos agentes financeiros. Os bancos centrais intensificaram compras de ativos, os governos gastaram mais e o mundo se recuperou da crise sanitária; apesar disso tudo, as cicatrizes estavam abertas.
A derivada dessa “farra” financeira foi o aparecimento de um fenômeno distante do mundo desenvolvido, a inflação. Hoje o entendimento geral é de que os estímulos financeiros foram muito exagerados, que se passou do ponto e o problema da inflação é derivado disso tudo. Ao longo de 2022, vimos vários países atingirem os dois dígitos de inflação, ainda agravado pela guerra na Ucrânia.
O trabalho precisaria ser feito, os bancos centrais deveriam agir e corrigir a rota. No começo do ano passado, o FED e demais bancos centrais, começaram a jornada de elevação de juros e desalavancagem de seu balanço, ou seja, a reversão da política expansionista tinha se iniciado. O quantitative tighten era a nova realidade, se começou a vender os ativos em excesso, aperto da condição de crédito e consequentemente, aumento de juros era uma nova realidade. A esperança era que a economia norteamericana esfriasse rápido e as pressões inflacionárias se acomodassem, mas não foi isso que aconteceu. De lá para cá, vimos os juros americanos subirem fortemente, de 0,25% ao ano para 5,50% ao ano, além disso, o crédito vem secando e o FED já vendeu mais de U$ 1 trilhão de dólares em ativos.
Esse movimento tem sido muito intenso, principalmente para o mercado de renda fixa. Na minha visão, esse momento é único. Para o investidor global, que sempre quis investir em moeda forte e ter um retorno decente em dólar: esse dia chegou. Hoje, é possível ter uma carteira de renda fixa em dólar te remunerando mais de 5% ao ano, sem riscos, com liquidez e segurança. O trabalho “sujo” do FED pode ajudar ainda mais e a venda dos títulos pode gerar uma oportunidade ainda maior, com taxas acima de até mesmo esses 5% de hoje, mas não é óbvio esse movimento daqui para frente.
A questão fiscal brasileira e a mudança do Banco Central podem ser catalisadores, esse ainda pode ser um ponto importante. Se o novo Banco Central for mais complacente com a inflação por aqui, poderemos ver o câmbio se apreciando e isso tudo pode provocar um ganho dobrado.
Essa janela não deve ficar aberta por muito tempo: o FED ao longo de 2024 deve parar de vender os títulos em excesso em seu balanço, a economia americana deve esfriar e os juros caírem. Para os investidores globais, a oportunidade é agora.