O mercado futuro de açúcar em NY encerrou a sexta-feira com o vencimento julho/2020 negociando a 12.05 centavos de dólar por libra-peso, 17 pontos melhor do que o fechamento da semana anterior. A volatilidade do real uma vez mais incentivou as usinas a prosseguirem – acertadamente, diga-se de passagem – na fixação de preços do açúcar de exportação para esta e para as safras seguintes.
Os preços obtidos nessas fixações, considerando para esse efeito a média simples dos fechamentos dos meses correspondentes de cada safra, ou seja peso igual para o maio/21, julho/21, outubro/21 e março/22, para a composição da média da safra 2021/2022 e assim sucessivamente, mostrou quase R$ 1,500 por tonelada para os três meses remanescentes da 20/21, R$ 1,478 por tonelada para a 21/22 e R$ 1,458 por tonelada para a 22/23.
A aceleração na fixação de preços pelas usinas reafirma o alto grau de comprometimento na gestão de risco cada vez mais presente no dia-a-dia das empresas do setor. A determinação, o profissionalismo e o foco que as empresas desenvolveram ao longo dos últimos anos trazem frutos no momento de abertura e renovação de linhas de crédito junto às instituições financeiras cada vez mais restritivas ao risco.
Sejam por restrições creditícias, por dificuldades na administração do fluxo de caixa, normalmente apertado, ou ainda, por comodidade, muitas usinas fazem o hedge indiretamente (na conta da trading, ou via NDF, um contrato a termo de moeda com liquidação financeira, junto aos bancos, com provedores de OTC, etc). Se pudessem usar opções com maior liberdade o valor agregado seria muito maior. No entanto, o ajuste diário é um fantasma que habita o imaginário de todo aquele gestor que já sentiu na própria pele a magnitude de destruição de uma chamada de margem. Nossa estimativa é que ao longo de uma safra, operações bem estruturadas usando calls (opções de compra) e puts (opções de venda) adicionam em média 6 dólares por tonelada.
A oitava estimativa da Archer Consulting apurou que 21.1 milhões de toneladas de açúcar da safra 2020/21 já estavam fixadas até dia 31 de maio. Tendo em conta que nossa estimativa de exportação para esta safra é de 23.5 milhões de toneladas de açúcar, o volume fixado até aquela data era de 89.8% o maior percentual desde que começamos esse levantamento, há dez anos.
O valor médio desse volume é de 12.91 centavos de dólar por libra-peso ou 56.82 centavos de real por libra-peso (ambos sem considerar o prêmio de polarização), equivalente a R$ 1,305 por tonelada FOB Santos (incluindo pol). No ano passado, nesse mesmo período, o valor médio das fixações foi de 13.04 centavos de dólar por libra-peso equivalentes a R$ 1,163 por tonelada FOB Santos com pol. A desvalorização do real fez a diferença.
Comparando a curva atual do açúcar em NY com a de dois meses atrás é percebe-se que houve uma intensificação nas fixações dos contratos com vencimentos mais longos. Os meses correspondentes à safra 2022/23 caíram 18 dólares por tonelada em relação à média da 21/22 e esta caiu 21 dólares por tonelada em relação à safra corrente.
Relatórios de diversos analistas conceituados ao redor do globo apontam que o consumo mundial de açúcar está caindo. A amplitude dos números é da mesma magnitude da incerteza que assola cada um de nós. Único fato é que o consumo de açúcar cai, bem como o de combustível. No entanto, os preços do físico seguem ora o caminho do mercado de petróleo, ora na trajetória oposta à da real. Esta semana foi bem isso. O real caiu 5.20% em relação ao dólar, mas o açúcar de curto prazo subiu, independentemente disso. O açúcar fechou ao equivalente a R$ 1,468 por tonelada, ou seja, quase R$ 90 por tonelada na semana.
A Índia deve anunciar a nova política de exportação para a safra 2020/2021 que se inicia no próximo mês de outubro. A produção indiana é estimada em 31 milhões de toneladas de açúcar. A redução do consumo naquele país, em linha com o resto do mundo, somada ao acréscimo na produção de açúcar comparativamente à ultima safra, são componentes encorajadores para o aumento das exportações daquele país. Índia e Tailândia devem amargar uma retração na atividade econômica da ordem de 5.8 e 5.6%, respectivamente.
Num webinar que participei na semana passada, originado por um corretor nos EUA, duas perguntas a mim dirigidas mostram a preocupação de diferentes ordens sobre o Brasil.
A primeira diz respeito ao nível de endividamento das usinas e seu percentual em dólar, pois nem todas estariam se beneficiando do dólar mais firme considerando que estão endividadas na moeda americana. A nossa estimativa é que, no final de maio, o endividamento das usinas no Brasil era de 111,3 bilhões de reais, dos quais 36% lastreados em dólares, o que dá um endividamento médio de R$ 173 por tonelada de cana moída.
A segunda, diz respeito a possibilidade de o Brasil ter um governo (golpe) militar. Minha resposta foi “nenhuma”. As Forças Armadas brasileiras respeitam a Constituição e as instituições no País são fortes apesar dos arroubos autoritários de uns e de outros.
A imagem do Brasil lá fora, como dissemos aqui, é a pior possível em vários setores. Será que os brasileiros perderam sua capacidade de indignação? É inacreditável que entra governo e sai governo, desde 2005 no primeiro mandato do presidente Lula, que os brasileiros de bem são surpreendidos com casos de corrupção que abalam os alicerces do poder. Com a prisão de Fabricio Queiroz, ex-assessor do filho do presidente, por movimentações bancárias suspeitas, só temos uma certeza: as coisas vão piorar muito no campo político. O governo Bolsonaro vai se arrastar sabe-se lá até quando. E mais um ano se passa sem que tenhamos as almejadas reformas política, tributária e administrativa.
Boa notícia: Os jornalistas Carlos Raíces e Bruno Blecher criaram o EstúdioAgro (ouça no Spotify (NYSE:SPOT)), um podcast voltado ao agro sempre trazendo grandes nomes do setor para conversar: os professores Alexandre Mendonça de Barros e Marcos Jank, por exemplo, foram os últimos entrevistados. Vale a pena conferir.
Um bom final de semana a todos.