Apesar da queima de caixa por conta da sazonalidade e do prejuízo devido à variação cambial (que vou explicar melhor), o resultado da companhia foi bom e teve muitas melhoras.
QUADRO DE DESTAQUES
A companhia encerrou o trimestre com uma receita líquida de R$ 56,5 bilhões, alta de 27,3% vs. 1T19. Houve crescimento no lucro bruto de 24,6% em comparação ao 1T19, com Ebitda ajustado de R$ 3,9 bilhões e alta de 22,6% vs. 1T19, com margem de 7%.
Forte geração de caixa operacional de novo, 43% de alta vs. 1T19. A alavancagem da companhia caiu para 2,17x em dólares e 2,77x em reais (é o EV/Ebitda, neste caso).
Para quem não lembra, eu comentei no 4T19 que a melhora no lucro líquido do ano de 2019 se deu por uma melhora operacional, mesmo com uma melhora nas receitas financeiras. A JBS soube fazer uma boa gestão dos ganhos e perdas de suas operações. Quem quiser entender melhor o final de 2019 antes de começar a entender 2020, eu sugiro ler neste link.
Voltando ao resultado. O que chamou a atenção de quem olhou para o resultado da companhia foi isso aqui:
A JBS apresentou um resultado financeiro líquido de menos R$ 9 bilhões, o que fez com que o resultado antes do IR e CS fosse negativo, assim como o lucro líquido, que virou um prejuízo de R$ 5,9 bilhões.
Vamos entender como isso aconteceu. Dentro de "resultado financeiro líquido", o que aconteceu foi o seguinte:
Houve uma variação cambial absurda em cima do resultado da empresa, com alta de 4674,4% vs. 1T19. Isso acontece por conta da exposição da dívida da JBS, que hoje está atrelada em cerca de 94% ao dólar.
Logo, o que aconteceu foi é que, por ter grande parte da sua dívida em dólar, segundo as normas vigentes de variação cambial de ativos e passivos, essa variação entra no resultado da companhia como uma “despesa”. Sendo assim, a alta do dólar fez com que a despesa também crescesse muito. Aí acontece isso, transforma um possível lucro em prejuízo.
O dólar se apreciar em relação a nossa moeda é bom para a empresa, já que 75% da sua receita vem do exterior, mas, se a dívida é atrelada ao dólar, quando ela volta para o resultado da companhia é ruim também, por isso aconteceu esse prejuízo.
Então, podemos concluir que o prejuízo não se deu por piora operacional da companhia e sim por um evento que é normal quando se tem dívida em dólar. Se descontar a variação cambial, a companhia teria tido um lucro de R$ 800 milhões neste trimestre, um pouco abaixo do 1T19, mas devemos levar em conta o Covid-19 também, que parou várias economias para as quais a JBS vende.
Vale ressaltar que não é porque ela tem uma dívida em dólar que é ruim também. A geração de caixa operacional cresceu bastante (43% de alta) e a despesas financeiras (trimestre contra trimestre) caíram em US$ 26 milhões. Ou seja, em linha com o que a companhia esperava quando se olha o custo médio da dívida. Esse ano, espera-se uma redução em torno de US$ 100 milhões vs. o ano passado.
Comentando ainda sobre a dívida: não vejo problema na companhia para honrar com suas obrigações pelos próximos anos.
Lembrando que JBS encerrou o trimestre com 24 bilhões em disponibilidades mais linhas de créditos a sua disposição. A relação da dívida líquida/Ebitda continua caindo e está praticamente em linha com os demais players do setor.
Olhando para cada segmento, pode-se perceber que Seara e Brasil estão dando um show:
Seara cresceu quase 40% vs. 1T19, e JBS Brasil, quase 21% no quesito receita líquida. Olhando para o Ebitda ajustado então, Seara cresceu 253% vs. 1T19 e JBS Brasil, 73%. Essa melhora mostra que as operações do Brasil continuam fortes ao passo que a demanda dos países asiáticos continua aquecida. Inclusive, grande parte deste aumento não veio da valorização do dólar ante ao real, mas sim de um mix de produtos melhor.
Destaque negativo para JBS USA Pork, que cresceu em receita, mas teve queda de 44% no Ebitda quando comparado com o 1T19. Porém, a empresa reportou que houve um crescimento de 56% nas exportações de porcos para a China no primeiro trimestre, o que deixa mais positivo o cenário para esse segmento ainda no resto do ano.
Sazonalmente, o momento é pior para essas divisões. JBS Beef estava enfrentando uma margem menor na Austrália também (sazonalmente fecham as plantas por lá, mas ficaram um período maior neste ano, o que também impactou negativamente). Todavia, espera-se que no segundo trimestre tanto JBS Beef quanto Pork já apresentem resultados muito melhores devido à volta de “spreads” melhores nessas divisões e por um custo menor da cabeça do gado.
COVID-19 E ALGUMAS NOTÍCIAS
Nesta parte eu vou comentar um pouco sobre a Covid-19 e sobre algumas notícias que afetam o curto prazo da companhia, mas que não mudam seus fundamentos no longo prazo ainda. Acho válido fazer esse comentário para muitos não se perderem nos ruídos do curto prazo, e traz mais segurança quando formos olhar a companhia.
Comentei no 4T19 que existiam três preocupações que deixavam os investidores inquietos em relação ao case da JBS: (i) logística; (ii) operação das plantas e (iii) demanda do consumidor.
Parece que somente a (ii) foi um pouco impactada devido ao fechamento de algumas plantas temporariamente. Essa semana agora tivemos outra interdição de uma planta da JBS em Caxias do Sul por 14 dias devido à Covid-19. Até aqui é super normal isso acontecer: o vírus realmente se espalha com mais facilidade que os demais e as paradas são temporárias, o que não afeta os resultados da companhia no médio/longo prazo (horizonte que eu julgo correto de olhar).
A companhia tem conseguido acelerar a produção em outras plantas, buscando por um equilíbrio. Tomazoni (CEO Global) comenta que assim que companhia acabar de aumentar a comunicação e os procedimentos de proteção contra o vírus, os níveis de produção deverão começar a voltar à normalidade em algumas plantas.
Em relação à logística, foi também mais desafiador para a companhia. Na parte de JBS Brasil, no primeiro trimestre a empresa comenta que houve uma dificuldade na logística para atender aos mercados que tiveram uma ruptura por conta do vírus.
Porém, já estamos vendo notícias melhores, com as exportações para a Ásia crescendo a números astronômicos novamente:
Isso responde um pouco da demanda. “Food Services” continua lutando, até por ser um segmento mais “commoditizado” e estar passando por uma mudança. Mas, no geral, parece que está melhorando bastante o cenário e a volta do consumo. A JBS ainda comentou em sua teleconferência que já normalizou suas operações logísticas para os próximos trimestres.
Por fim, tivemos recentemente uma notícia de possível cartel de frangos envolvendo a JBS (no caso, a Pilgrim’s Pride, que pertence a ela). Se de fato for constatada alguma irregularidade no mercado em que ela atua, eu concordo 200% que a companhia tem que arcar com as consequências. Mas esse processo já não é de hoje e parte de uma época (2012) em que a companhia tinha outra administração.
Além disso, concorrentes de peso como Tyson Foods, Sanderson Farms e Perdue Farms foram apontadas como as formadoras. Vale ressaltar que a indústria de frangos nos EUA é dominada por cinco players que possuem 61% do mercado de aves norte-americano. Só a Tyson, maior do país, possui 21% do mercado, enquanto o grupo JBS, via Pilgrim’s Pride, possui 17% do mercado.
Acho válido esperar por conclusões mais concretas em relação às notícias expostas, e não acho que muda o fundamento da companhia no médio/longo prazo. No mais, comento novamente, o que eu comentei no 4T19: a depreciação da nossa moeda, a demanda inelástica por conta da bagunça no cenário macro e a posição em que a companhia está inserida me deixam mais tranquilos em relação aos seus resultados futuros.
MEU OUTLOOK PARA JBSS3 (SA:JBSS3)
O ano de 2020 para muitas companhias vai ser “como se não tivesse existido”. Estamos em um ano realmente singular e em alguns países ao redor do mundo já estamos vendo uma reabertura bem mais otimista. Eu mesmo estava bastante pessimista no mundo pós-Covid, sabendo que não voltaríamos a normalidade de antes, mas pelo o que eu tenho visto em outros lugares, talvez não seja tão ruim assim.
A companhia acredita que o pós-Covid, a reabertura da China e de outros países asiáticos e o impacto da Gripe Suína Africana indicam que esses lugares continuaram líderes de importação de carnes (suíno, beef e aves) por mais algum tempo.
Eu concordo com essa premissa, estamos vendo isso nos dados recentes de exportações. Além disso, o pacote de dólar alto, cenário macro favorável para o setor e a posição em que a companhia se encontra me deixam ainda atraído pelo case.
Olhando para seus múltiplos em 2021, a JBS se encontra num valuation bem interessante e com boa margem de segurança:
A JBS é a segunda maior produtora de proteína do mundo. Está negociando a 7,5x lucros para 2021 e 5,2x EV/Ebitda, enquanto o setor negocia a 24,5x (11,5x se ajustarmos BRFS3) e 6,7x respectivamente.
Pegando o EV/Ebitda dos últimos 9 anos, este múltiplo se encontra abaixo de 1 desvio-padrão:
Ainda assim, vejo ela negociando a um FCFE (fluxo de caixa para o acionista) de 15% yield, nada mal. Logo, acho viável, pelo tamanho dela, pela melhora de resultado e por estar melhor colocada, que ela negocie no mínimo a R$ 31 reais por ação (faixa azul da minha tabela). Acredito que ela consiga entregar melhores resultados nos próximos anos e que provavelmente deva negociar a um premium em relação ao setor.
Lembrando que ainda existem dois eventos que a favorecem: saída do BNDS e IPO da parte global nos EUA, que poderia destravar mais valor para a companhia.
Era isso, valeu!