Prezados leitores e leitoras, é com imensa felicidade que, a partir de hoje, assinarei esta coluna no investing.com semanalmente. Toda sexta-feira trarei algo para refletirmos. Essa perspectiva me anima porque gosto de discutir e pensar no mercado em geral, de modo que um portal com esta enorme visibilidade me permite expressar pontos de vista e fundamentos para um público vasto. Tenho a vocação de sempre trazer a teoria aplicada à prática no mundo real, algo que não abro mão. Para mim, a teoria sem a prática é de pouca valia e, por outro lado, a prática sem a boa teoria torna tudo no mínimo mais difícil e ineficiente.
Pretendo abordar um sem número de assuntos, mas todos dentro de Finanças, área na qual conquistei meu título de PhD: mercado financeiro, investimentos, previdência privada e previdência pública, finanças pessoais e familiares, finanças públicas e corporativas são alguns temas que gosto muito e, portanto, faço pesquisa. Muitas das minhas opiniões serão, aliás, embasadas por pesquisas que conduzo como professor do Coppead, a escola de negócios da UFRJ. Sejam muito bem-vindos e fiquem à vontade para deixar seu comentário abaixo.
O tema de hoje pode ter provocado uma curiosidade. Hora de ganhar dinheiro fácil? Infelizmente, o título foi meramente provocativo e não condiz com a dura realidade que os gestores têm vivido nas últimas semanas. Em primeiro lugar, não existe dinheiro fácil, muito menos no mercado financeiro. Aliás, poderia usar aqui a famosa expressão "não existe almoço grátis". Jamais acredite nessa falácia. Se você quiser ganhar dinheiro na bolsa, terá que assumir riscos.
É bem verdade que, em alguns momentos, parece (e eu digo, parece!) fácil o discurso. Pois bem, vejamos essa fala: “Rapaz, desde que veio o Coronavírus, a maior volatilidade do mercado era esperada e, com isso, passei a operar diariamente, com umas duas ou três ações, comprando sempre após uma queda braba e vendendo com a subida, que sempre vem com a volatilidade: estou fazendo um bom dinheiro assim”. Amigos leitores, percebam como essa fala parece razoável, sincera e até óbvia, não? Mas, acreditem, mostrarei que ela é absolutamente vazia.
Para início de conversa, se fosse assim fácil, a maioria dos grandes fundos de ações e multimercado que contam com gestores qualificados e extremamente competentes, apresentaria talvez um retorno negativo inicial com a chegada do Covid-19 no mercado, mas logo depois performaria bem “com a volatilidade esperada”. Não é assim. Primeiro porque, lá no início de março, não havia a certeza da magnitude da crise, assim como, aliás, hoje ninguém tem a certeza se o Ibovespa já passou pelo seu fundo do poço ou se ainda passará (lembre-se que infelizmente o pico de mortes no Brasil ainda está por vir e tudo indica que ainda teremos semanas de isolamento!).
Além disso, as partes “comprar após uma queda braba” e “vender com a subida” carecem de melhores definições. O que seria uma queda braba? Em que momento da subida, mais precisamente, tal venda seria realizada? E, se no instante imediatamente anterior à venda, o ativo tornar a cair e atingir um patamar pior do que o da compra? Será que voltará a subir no curto prazo? E se o preço jamais voltar? E se, pior, cair ainda mais? Estas questões, se em um primeiro momento parecem simples, posso afirmar: não são. Notem que não estou afirmando que uma estratégia de curto prazo não funcione jamais. Apenas afirmo que tais estratégias precisam ser muito bem definidas e sempre carregarão uma boa dose de risco – lembre-se: não existe almoço grátis.
Uma estratégia bem definida é algo do tipo: devo comprar após uma queda de 3% e vender quando o preço atingir 2% acima do que paguei. Ok, a estratégia está bem definida e é incrivelmente simples. Entretanto, o lucro não é certo e o risco é eminente. Tais estratégias, que podem ser diferentes (mas dentro da mesma linha), são alvo de testes (os famosos backtestes) por todo o mercado e pela academia, inclusive, há muito tempo. Pasmem: a maioria não funciona, comprovadamente (pelo menos de maneira robusta e sustentável). Na teoria, se o mercado é eficiente de maneira forte, o que aconteceu ontem (“caiu 3%) não influencia o amanhã (subir 2%) e, portanto, tal estratégia estaria fadada ao aleatório, o que, via de regra, levaria a prejuízos por conta dos custos operacionais. Ok, tudo bem, mas e na prática? Na prática, posso afirmar que não há estratégia fácil, nem em momentos previsíveis de alta volatilidade. Isto porque com a volatilidade, pode vir junto uma quebra estrutural que jogue o mercado na direção oposta à sua operação! Simples assim.
Tudo bem, então nada pode ser feito, é isso? Não, também não é o outro extremo. Por um lado, tais estratégias que se parecem com almoços grátis são, na verdade, abrigos ocultos de enorme risco e, portanto, chamarizes para perdas inesperadas – aliás, não é incomum a história do vizinho que passou a operar na bolsa e no início, só felicidade: com o tempo, ele parou de operar e não falou mais do assunto. Boas estratégias de curto prazo existem, mas precisam estar tecnicamente muito bem construídas e, se as premissas da estratégia se mostrarem consistentes, ela pode sim dar certo. Mas sempre com uma boa dose de risco e com muito conhecimento técnico! Aliás, esse assunto é ótimo e ficará para uma nova sexta-feira. Forte abraço a todos vocês.
* Carlos Heitor Campani é PhD em Finanças, professor do Coppead/UFRJ e especialista em investimentos, previdência privada e pública e finanças pessoais e públicas. Ele pode ser encontrado em seu site pessoal.