Bom dia, Pessoal! O artigo de hoje foi coescrito em parceria com Camila Affonso e Joseph Boukai, respectivamente sócia e consultor do Leggio Group, experts em logística. Explicaremos o que é e como funciona uma Zona de Processamento e Exportação (ZPE), discutindo os benefícios fiscais e tributários envolvidos e que devem, portanto, ser considerados em uma eventual modelagem financeira. Esperamos que gostem: vamos lá!
As ZPEs começaram a ser implementadas globalmente no final do século XX como um mecanismo para promover o comércio internacional e atrair investimento estrangeiro. Países como a China e a Coreia do Sul utilizaram essas zonas como parte de suas estratégias de crescimento econômico e inserção no mercado global. A China, em particular, foi pioneira ao criar ZPEs como a de Shenzhen, que se tornou um dos maiores polos de manufatura e exportação do mundo. A partir da década de 1980, as ZPEs chinesas desempenharam um papel crucial no rápido crescimento industrial do país.
No Brasil, as ZPEs começaram a ser regulamentadas apenas em 1988, porém, a implementação prática demorou a ganhar tração devido à complexidade do ambiente regulatório e à falta de infraestrutura. Nos últimos anos, no entanto, houve avanços significativos, com diversas ZPEs sendo criadas em várias regiões do país, especialmente nas regiões Norte e Nordeste.
MAS O QUE, DE FATO, É UMA ZPE?
De forma geral, uma ZPE é uma área industrial delimitada destinada à produção de bens e serviços voltados para exportação, no qual seu objetivo principal é promover o crescimento industrial, aumentar a competitividade internacional e atrair investimentos estrangeiros diretos através de incentivos fiscais. Estas áreas são delimitadas pelo governo e normalmente possuem infraestrutura de apoio para atividades industriais e logísticas, além de acesso facilitado a portos e aeroportos.
Essas zonas são bastante estratégicas para economias emergentes, pois incentivam a instalação de empresas estrangeiras e domésticas com a promessa de desoneração tributária e simplificação administrativa, oferecendo um ambiente regulatório diferenciado, no qual as empresas ali instaladas se beneficiam destes incentivos fiscais, aduaneiros e cambiais, criando um espaço de operações mais competitivo no cenário global. Em troca desses benefícios, as empresas que operam nas ZPEs comprometem-se a exportar uma parte significativa da sua produção, sendo essa uma das condições básicas para se manterem nesse regime especial.
Os benefícios fiscais e tributários oferecidos às empresas dentro de uma ZPE são um dos maiores atrativos desse regime, sendo respaldados pelas Leis Federais 11.508/2007 e 14.184/2021. Os principais benefícios são:
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Isenção de impostos na aquisição de bens importados: As empresas podem importar insumos, máquinas e equipamentos sem a incidência de taxas e impostos tais como: Imposto de Importação (II), AFRMM (Adicional de Frete para Renovação da Marinha Mercante) sobre o valor do frete cobrado por empresas de navegação que utilizam os portos nacionais, PIS/PASEP Importação, COFINS Importação e Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI).
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Suspensão de tributos federais e estaduais: As ZPEs concedem a suspensão ou isenção de tributos federais como o PIS/PASEP, COFINS e o ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços). Isso reduz os custos de produção e aumenta a competitividade dos produtos brasileiros no mercado externo.
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Desoneração cambial: Empresas instaladas em ZPEs também têm a vantagem de operar sem a necessidade de converter a moeda estrangeira obtida com exportações para a moeda local, eliminando o impacto de eventuais flutuações cambiais nas operações.
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Simplificação aduaneira: As ZPEs oferecem um regime simplificado de controle aduaneiro, reduzindo a burocracia no processo de importação e exportação. Esse fator contribui para a agilidade das operações e reduz os custos administrativos.
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Flexibilidade regulatória: Em muitas ZPEs, as empresas operam com maior flexibilidade em termos de regras trabalhistas e ambientais, de acordo com a legislação local, o que pode reduzir custos e aumentar a competitividade das indústrias.
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Segurança Jurídica: Os benefícios concedidos são garantidos por um período de 20 anos (que pode ser prorrogável), sendo estes independentes de eventuais alterações futuras na legislação.
Os benefícios tributários, como mencionado, são concedidos apenas para venda ao mercado externo. Em caso de venda para o mercado interno, é necessário o pagamento de todos os tributos sem isto implicar na renúncia do regime fiscal, que segue válido para vendas ao exterior.
Um exemplo notável a nível nacional é a ZPE de Pecém, no Ceará, que tem se destacado como um hub para a exportação de produtos siderúrgicos, possuindo uma área de 6.182 hectares (61,8 milhões de m2) e uma completa integração com o porto de Pecém, sendo este um forte diferencial competitivo deste complexo.
Atualmente, a ZPE de Pecém conta com 3 empresas instaladas no local – Arcelor Mital, Phoenix Global e White Martins, sendo as duas primeiras ligadas ao setor siderúrgico e a última ligada ao setor de gases industriais e engenharia.
Por Pecém estar situado no estado do Ceará, existem outros benefícios fiscais, na esfera federal, estadual e municipal, como a redução de até 75% do IRPJ através do programa da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE), incentivo de até 75% de isenção do ICMS próprio gerado na produção industrial (por 10 anos, sendo este período prorrogável), possibilidade de redução do ISS e IPTU, além de diversos outros programas de desenvolvimento específicos de cada setor.
Desta maneira, os benefícios fiscais e tributários oferecidos pelas ZPEs exercem um impacto significativo na modelagem financeira de empreendimentos instalados nessas zonas. Ao eliminar ou suspender impostos e tributos, as margens de lucro se tornam mais amplas e geram maior rentabilidade sobre o capital investido. Da mesma forma, a isenção tributária sobre insumos e equipamentos possibilita a aquisição de tecnologias de ponta a preços mais competitivos, aumentando a produtividade e a eficiência da cadeia produtiva. Além disso, a flexibilidade cambial ainda reduz a exposição às variações da moeda, criando uma previsibilidade maior no fluxo de caixa, especialmente em períodos de maior volatilidade cambial.
Assim, sob o aspecto da análise de investimento, todos esses fatores contribuem para a melhoria de indicadores tais como o período de payback, o valor presente líquido e o retorno sobre o investimento, gerando um valuation mais elevado do ativo e, portanto, maior atratividade para investidores.
Apesar do atraso inicial, as ZPEs brasileiras têm demonstrado potencial para impulsionar o desenvolvimento regional, promovendo a industrialização em áreas que tradicionalmente não teriam presença industrial marcante. Isso contribui para a diversificação da economia nacional e para a diminuição das desigualdades regionais, atraindo investimentos tanto de empresas nacionais quanto internacionais. ZPEs podem ser um instrumento eficaz de política econômica, mas também dependem de fatores como infraestrutura, políticas consistentes e atração de capital humano e tecnológico para serem bem-sucedidas.
Entendemos que o tema ZPE é muito pouco debatido por aqui e que, portanto, trazer esse assunto para vocês seria algo interessante. Sintam-se à vontade para comentar abaixo e deixar dúvidas, nosso maior objetivo é fomentar discussões em prol da disseminação do conhecimento.
* Carlos Heitor Campani é PhD em Finanças, Certificado pelo CNPI e Pesquisador da ENS – Escola de Negócios e Seguros. Além disso, ele é Diretor Acadêmico da iluminus – Academia de Finanças e Sócio-Fundador da CHC Finance e da Four Capital. Campani pode ser encontrado em www.carlosheitorcampani.com e nas redes sociais: @carlosheitorcampani. Esta coluna sai a cada duas semanas, sempre na quinta-feira.