Por Roberto Samora
SÃO PAULO (Reuters) - A prorrogação da isenção de tributos federais para combustíveis tiraria a competitividade do etanol frente à gasolina, afetaria o planejamento de usinas que contavam com o retorno do PIS/Cofins em 2023 e seria um "atentado" ambiental e social contra a população, disse nesta terça-feira Evandro Gussi, presidente da Unica, poderosa associação de usineiros do centro-sul do Brasil.
A fala veio após o futuro ministro da Fazenda, Fernando Haddad, pedir ao atual governo para que deixe vencer em 31 de dezembro a desoneração de impostos federais sobre combustíveis, conforme previsto, após notícias de que o governo atual havia decidido prorrogar por 30 dias a isenção dos tributos.
A prorrogação significaria que a gasolina continuaria mais competitiva do que o etanol, potencialmente levando as usinas a focar na produção de açúcar na próxima safra, como ocorreu na temporada atual, quando o governo zerou os impostos como uma das medidas de controle da inflação, após a disparada dos preços do petróleo por conta da guerra na Ucrânia.
Se não houver prorrogação da desoneração, o etanol hidratado tende a ganhar competitividade contra a gasolina, uma vez que antes tinha uma vantagem tributária. Era cobrado 0,24 real por litro do combustível renovável, enquanto para a gasolina a taxa era de 0,69 real, disse Gussi, que participou da equipe de transição do governo eleito.
"Espero que sejamos racionais, represento o setor de etanol, mas a manutenção de desoneração é prejudicial para a sociedade brasileira", disse Gussi, em entrevista à Reuters.
Embora houvesse previsão da desoneração acabar em 2022, o Orçamento de 2023, aprovado pelo Congresso na semana passada, prevê a manutenção da desoneração no próximo ano, a um custo de 52,9 bilhões de reais para os 12 meses.
Desse total, a renúncia de arrecadação é estimada em 34,3 bilhões de reais com PIS/Cofins e Cide de gasolina, etanol e gás veicular e em 18,6 bilhões de reais com PIS/Cofins sobre diesel, biodiesel, gás liquefeito e querosene de aviação.
"Existem necessidades para coisas mais fundamentais no Brasil. Vai renunciar à receita comprometendo setores econômicos, comprometendo os mais pobres? Essa renúncia fiscal não beneficia os mais pobres", afirmou, acrescentando que essas pessoas em geral não têm carros.
"Por isso que falo que é um atentado social... é um atentado político ao novo governo, o governo que perdeu as eleições quer mexer na receita do governo que vai entrar... é um atentado econômico, ambiental...", comentou, citando as vantagens de menores emissões de gases do renovável.
Segundo ele, todos os sistemas das usinas já estão "parametrizados" para a cobrança dos tributos. "Pessoas que sempre falaram sobre segurança jurídica, previsibilidade, o Brasil como porto seguro do investimento, aí mudar a regra que está prevista desde julho para acabar em 31 de dezembro?", questionou ele, citando integrantes do governo atual.
Gussi comentou ainda que a desoneração de combustíveis fósseis não existe mais no mundo, com exceção de "dois ou três Estados totalitários".