Por Geoffrey Smith
Investing.com – O Banco Central Europeu enfrenta uma das suas mais difíceis reuniões de todos os tempos amanhã (8), forçado a escolher entre opções impalatáveis.
Como a inflação no patamar recorde de 9,1%, que não para de surpreender na alta, o banco desesperadamente precisa elevar suas taxas de juros acima de zero ou arrisca perder toda a credibilidade como instituição capaz de defender o valor da sua moeda.
Por outro lado, a zona do euro está muito mais próxima de entrar em recessão, diante da combinação sem precedentes dos cortes de fornecimento de gás da Rússia com sanções ocidentais, o que está fazendo os preços de energia alcançarem patamares que podem desestruturar completamente a economia em pouco tempo.
Essas pressões conflitantes já trouxeram à tona divisões profundas dentro do conselho dirigente do banco, com membros da Alemanha e de outras partes do norte e leste da Europa pedindo em voz alta ao banco que aumente as taxas em até 75 pontos-base na reunião de quinta-feira, em Frankfurt.
Mas, ao contrário do Federal Reserve (Fed, banco central dos EUA), no qual membros com posturas mais flexíveis, como Neal Kashkari e James Bullard, agora pregam o evangelho da ortodoxia do aperto monetário com todo o zelo dos convertidos, o risco de recessão faz com que os membros menos “rígidos” com a inflação evitem se despojar de todo de suas armas, defendendo que uma agressão forte demais agora será um erro horrível, como durante as elevações de juros em 2011, que provocaram uma crise nos mercados de títulos da zona do euro.
Dessa forma, embora uma elevação das taxas seja tanto favorável quanto garantida, há uma genuína incerteza em relação ao seu tamanho.
Um aumento de 75 pontos-base parece ser o caminho a ser seguido, depois que a integrante do conselho, Isabel Schnabel, fez um discurso rígido no evento de Jackson Hole do Fed, na mesma semana em que a inflação na zona do euro atingiu o recorde de 9,1%.
No entanto, essa crença foi certamente testada por eventos como a interrupção da operação do gasoduto Nord Stream pela Rússia, elevando temores de um inverno inteiro sem o gás russo na Alemanha, e a possibilidade de racionamento em toda a região.
“A zona do euro e a Alemanha, em particular, devem registrar um pico mais alto de inflação, e a recessão será mais profunda do que o consenso e a expectativa do BCE”, afirmou Holger Schmieding, economista-chefe do Berenberg Bank, em nota aos clientes na segunda-feira.
Comentários publicados na terça-feira na revista semestral Eurofi, de autoria de Mario Centeno e Yannis Stournaras, presidentes do banco central de Portugal e da Grécia, também sugeriam que Lane contará com algum suporte na defesa de uma elevação mais gradual dos juros.
Stournaras disse acreditar que a inflação estava perto do pico e que, em breve, começaria a desacelerar, enquanto Centeno defendeu que uma elevação muito rápida das taxas, diante de um choque de oferta, poderia dificultar a tarefa de evitar um problema “low-flation” que persegue o BCE desde a crise financeira de 2008.
Os preços de energia dispararam desde então, em meio a notícias de que uma tentativa coordenada da UE de estabelecer um teto para eles durante todo o inverno. Mas, para o BCE, trata-se de uma faca de dois gumes: o efeito de baixar a inflação geral sem dúvida seria bem-vindo, mas ao sustentar a demanda geral, acabará respaldando a lenta disseminação das pressões inflacionárias para áreas da economia não ligadas à energia.
Mesmo desconsiderando os preços de alimentos e energia, a inflação na zona do euro continuou em patamares históricos de 4,3% em agosto, sem sinal de desaceleração.
Além disso, como apontaram os analistas da Vontobel Asset Management, o cenário não é nada favorável: o crédito bancário, especialmente para o consumidor, continua forte, e o desemprego na zona do euro está na mínima histórica de 6,6% da população ativa. A política fiscal continua pressionando os preços, especialmente com o pacote de alívio de energia de 65 bilhões de euros aprovado pelo governo federal da Alemanha no fim de semana.
Talvez o argumento mais convincente para uma elevação de 75 pontos-base seja o fato de que a janela para o aperto da política esteja se fechando rapidamente: tudo indica que o banco precisa subir os juros antes que não seja mais possível fazê-lo politicamente.
Nas palavras de Carsten Brzesk, do ING, em uma nota aos clientes: “Elevar juros às portas de uma recessão é uma coisa. Fazê-lo ao longo de uma recessão é outra”.
Brzeski avalia que a última chance do BCE elevar juros será em outubro.
O fato de o BCE ter abandonado recentemente a prescrição futura, ou forward guidance, significa que todos os resultados continuam possíveis pelo menos no papel.
A factibilidade de elevações após isso depende do sucesso do seu novo instrumento de controle dos diferenciais das taxas dos títulos da região, o chamado Instrumento de Proteção de Transmissão.
Seja qual for o resultado da reunião de quinta-feira, em vista do estado frágil em que se encontram os mercados europeus neste momento, a real medida do sucesso da decisão será a intensidade da intervenção nos mercados de títulos nos dias seguintes.