Por José de Castro
SÃO PAULO (Reuters) - Uma "tempestade perfeita" se abateu sobre o dólar no mercado brasileiro nesta quinta-feira, com a moeda norte-americana fechando no menor patamar desde junho e aproximando-se do suporte psicológico de 5 reais, puxada por forte ajuste de posições pró-Brasil num contexto de esperanças sobre reformas locais e de mais ingresso de fluxo estrangeiro.
A sinalização do Banco Central de que o ciclo de cortes da Selic caminha para um fim, o salto nos preços das commodities e a confirmação pelo BC de que dará saída parcial ao mercado na esteira do desmonte do overhedge minaram qualquer demanda pela moeda norte-americana nesta sessão.
O dólar à vista caiu 2,55%, a 5,0417 reais na venda, menor nível desde 16 de junho (4,9398 reais) e maior queda percentual diária desde 6 de novembro (-2,80%).
A cotação oscilou em baixa durante todo o dia, indo de 5,1334 reais na máxima (-0,78%) a 5,0322 reais (-2,73%) na mínima.
No mercado futuro da B3, o contrato de dólar para primeiro vencimento cedia 2,90%, a 5,0215 reais, às 17h40, após tocar 5,0170 reais no piso da sessão.
O real foi, de longe, o maior destaque nos mercados globais de câmbio nesta sessão, já marcada por rali em várias divisas de risco.
Analistas comentaram que o câmbio reagiu a um movimento de "compra de Brasil", que fez o Ibovespa superar os 115 mil pontos durante a sessão e os juros longos caírem quase 10 pontos-base.
"O Brasil ainda está barato em dólar", disse Rafael Ribeiro, analista da Clear. "Isso com certeza foi um dos pontos para o investidor estrangeiro olhar para o nosso mercado. E quando você tem uma sinalização positiva no avanço da agenda de reformas isso se reflete em aumento de fluxo para a bolsa, o que impacta o dólar", completou.
Notícias de que o líder do governo no Senado, Fernando Bezerra, afirmou que o projeto de reforma tributária pode ser votado já na próxima semana soaram como música para os ouvidos de investidores, os quais entendem que esse seria mais um passo na direção de ortodoxia fiscal, o que afastaria movimentos para flexibilizar ou furar o teto de gastos.
Do ponto de vista de liquidez, a indicação clara de que o BC dará suporte à liquidez no fim do ano também nocauteou o dólar. O BC vendeu nesta quinta 800 milhões de dólares em contratos novos de swap cambial tradicional --ou seja, fez injeção líquida de moeda no mercado. Mantido o atual ritmo, a autarquia caminha para despejar 9,602 bilhões de dólares em swaps a mais do que o lote a vencer em janeiro.
Esse montante ainda está abaixo dos cerca de 16 bilhões de dólares em compras líquidas de moeda que devem ocorrer na passagem do ano, relacionadas ao desmonte de operações de overhedge --proteção cambial adotada por bancos e que deixou de ser interessante neste ano por questões tributárias.
"Em razão da recente apreciação da moeda (do real), havia dúvidas se o BC iria atuar dessa forma (com venda líquida de swaps)", comentou Sergio Goldenstein, consultor independente e estrategista na Omninvest Independent Insights e ex-chefe do Departamento de Operações de Mercado Aberto do Banco Central.
O tom considerado "hawkish" (favorável a alta de juros) pelo Comitê de Política Monetária (Copom) do BC na véspera foi mais um gatilho para as vendas de dólares, uma vez que a indicação de retirada "em breve" da promessa de não subir juros foi considerada uma surpresa, na avaliação do Citi. A queda dos juros a sucessivas mínimas recordes nos anos mais recentes é citada por analistas como um dos fatores de pressão sobre o câmbio.
O ambiente externo de fraqueza do dólar jogou a pá de cal na moeda nesta sessão. O índice da moeda norte-americana caía 0,35% no fim da tarde, com fortes ganhos em pares do real como peso chileno, peso colombiano, rublo russo e dólar australiano --todos sensíveis aos preços das commodities, a exemplo da divisa brasileira.
O índice ThomsonReuters/CRB de matérias-primas saltava 1,6% nesta quinta, para picos desde março.
O Credit Suisse (SIX:CSGN), conhecido no mercado por calls mais conservadores, ainda se diz relutante em montar posições estruturais a favor do real, mas afirma que o cenário está mais colorido para o real.
O banco avalia que expectativas de um carry (taxa de retorno) mais alto e percepção de real ainda subvalorizado e de ativos brasileiros ainda com baixa presença nas carteiras --com um quadro externo "firmemente construtivo"-- sugerem que o movimento atual de baixa do dólar ante o real pode ter espaço para se estender.
"Agora veríamos potencial para o dólar ser negociado em níveis tão baixos quanto 5,00 reais no curto prazo, ponto em que pensamos que o posicionamento para uma volta tática em direção à área de 5,30-5,35 se tornará atraente novamente."