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Economia mundial: A retomada chinesa pode pressionar a inflação global?

Publicado 24.03.2023, 18:45
© Reuters.
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Por Jessica Bahia Melo

Investing.com - A flexibilização da política covid-zero na China aponta para perspectivas mais positivas para a retomada econômica do gigante asiático. A meta do governo do país – ainda considerada modesta – é de um crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de 5% em 2023, após um período de atividade aquém do padrão chinês.

Em meio à preocupação global em relação às pressões de preços, resultando em políticas monetárias contracionistas, economistas estão atentos se um incremento na inflação da China pode ocorrer diante da reabertura, impulsionando preços de commodities, mas também os indicadores que os Bancos Centrais trabalharam tanto para conter.

O que explica a recuperação chinesa?

Após o mundo afrouxar as medidas restritivas contra a propagação da Covid-19, a China manteve pulso firme por quase três anos, para evitar um colapso no sistema de saúde. No entanto, pagou o preço com o crescimento – o PIB do ano passado foi de 3%, bem abaixo da meta do governo chinês, de 5,5%. Esse foi o segundo pior resultado em quase 50 anos.

Com uma série de protestos, em dezembro, o país anunciou a flexibilização da política covid zero, que incluía lockdowns, testes em massa e bloqueios sanitários. A recuperação da economia da China está mais relacionada à demanda doméstica e principalmente ao setor de serviços, focada internamente, considerando que esses setores que ficaram reprimidos durante a rígida política, conforme aponta Sophie Altermatt, economista do banco suíço Julius Baer. O setor imobiliário segue frágil e não deve se recuperar de forma tão célere em 2023, com maior normalização.

Helena Veronese, economista-chefe da B.Side Investimentos, acredita que a China foi um exemplo muito claro de bolha no setor imobiliário, que estourou com a pandemia. “Em um primeiro momento, o governo chinês disse que não iria socorrer o setor, mas na virada do ano, isso acabou mudando e agora o governo e o Banco Central tem fornecido mais liquidez e mais ajuda ao setor. É um setor ainda sensível, mas a recuperação chinesa deve ocorrer nesse mercado e via consumo interno, com a população que estava trancada durante três anos e agora volta a consumir”.

A China promoveu estímulos monetários, com corte de compulsório, auxílio para setor de infraestrutura, e colhe os efeitos, com resultados vistos no Ano Novo chinês, por exemplo. Com poupança acumulada, os chineses retomam o consumo e as viagens nos próximos meses, segundo os economistas. Nos dois primeiros meses deste ano, a economia chinesa apresentou alta no varejo, produção industrial e em investimentos em ativos fixos.

Os drivers são claros, mas  os desafios continuam, especialmente no setor imobiliário e diante dos impactos da diminuição de liquidez e da demanda global, com perspectivas de uma economia mundial menos pujante como efeito das altas nos juros para conter a inflação, que incomoda mais desde o início da invasão da Rússia à Ucrânia.

Crescimento pode impulsionar commodities?

Uma China que cresce menos tende a consumir menos produtos básicos, como minério de ferro e soja, mas os economistas divergem sobre os impactos que a reabertura pode ter nessas commodities.

Como a reabertura já ocorreu no ano passado, a alta do minério de ferro foi verificada nos últimos meses e a cotação do cobre pode ser impulsionada também. Arthur Mota, economista do banco BTG Pactual (BVMF:BPAC11), acredita que o minério de ferro não deve subir muito mais, mas deve continuar em um patamar elevado, o que é positivo para o mercado brasileiro, principalmente para a mineradora Vale (BVMF:VALE3). O petróleo, no entanto, pode passar por uma valorização, aliado a fatores como demanda dos Estados Unidos aquecida e restrição de oferta da Opep, mas ainda longe do patamar próximo de US$ 100 o barril verificado quando a guerra da Ucrânia estourou.

Veronese aponta que commodities metálicas tendem a se beneficiar, como o minério de ferro, além de outras agrícolas mais relacionadas ao consumo da população, como carnes, soja e trigo.

Por outro lado, como Sophie Altermatt espera que a recuperação seja proporcionada pelo consumo das famílias e serviços, a economista do Julius Baer não enxerga que a retomada seja um catalisador para commodities. “O que nós vimos no último ano é que a manufatura se comportou bem. Então as fábricas continuaram a produção, mesmo com os lockdowns”, pondera, afirmando que não haveria um grande propulsor neste momento.

Inflação pode “contagiar” outros países?

Os bancos centrais incorporam a reabertura da China como vetor de inflação altista nos seus balanços de riscos, segundo o economista do BTG, mas Mota acredita que a pressão não é muito significativa. “O principal vetor seria, de fato, energia, petróleo. Minério de ferro é irrelevante quando se trata de inflação”. Mesmo assim, os efeitos secundários para energia neste ano continuam sendo deflacionários diante do patamar elevado de comparação do ano passado. Mota avalia que, em termos de inflação nos dias de hoje, a cesta de commodities não é a maior fonte de preocupação, mas inflação de serviços e ligada ao mercado de trabalho, mais resiliente.

Veronese afirma que há chances de que a inflação da China seja repassada para o mercado global, mas pondera que as condições financeiras são muito distintas de quando os países reabriram suas economias após a crise da covid, com políticas monetárias frouxas.

Agora, a realidade é outra, com juros altos. A demanda mundial vem desaquecendo diante das políticas monetárias contracionistas, apontam todos os economistas consultados.

Sophie Altermatt não espera um grande aumento da pressão inflacionária com a reabertura da China. Se a demanda se recuperar melhor, haveria algum aumento do indicador de preços, mas o banco não enxerga que ele possa exceder a meta governamental.

A economista do banco suíço completa que a maior parte do auxílio do governo tem sido dado a empresas, e não para as famílias, e por isso a demanda não seria estimulada. Por isso, espera uma recuperação do consumo moderada. Além disso, completa que problemas em cadeias produtivas passam por processo de normalização com o fim dos lockdowns, com menos restrições, o que pode ajudar a amenizar a inflação, por outro lado, porque “a oferta pode se normalizar globalmente”.

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