Quem assumir a Presidência em 2023 terá de enfrentar um problema que tem preocupado o setor de infraestrutura, relativo aos processos de devolução de projetos que foram leiloados, mas não deram certo. Desde que a regulamentação do tema foi editada, em 2019, nenhuma relicitação saiu do papel. Seis concessionárias de rodovias e três de aeroportos já apresentaram pedidos ao Executivo.
A maioria das concessionárias, em especial as de rodovias e do aeroporto de São Gonçalo do Amarante (RN), tem pressa em devolver os empreendimentos. Como o instrumento da relicitação é novo, várias dúvidas foram atrasando os processos nos últimos anos. A principal é o momento em que as empresas recebem a indenização por investimentos não amortizados para entregar o ativo.
A linha de Lula. A equipe do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), primeiro colocado nas pesquisas de intenção de voto, avalia que será necessário dar uma resposta rápida a esses processos dentro de um plano "emergencial" de infraestrutura, pensado já para os primeiros meses de um eventual governo. Na equipe do programa de infraestrutura de Lula, há uma percepção de que a demora nas relicitações cria um desgaste frente à população com as concessões, já que os usuários continuam a pagar tarifas, sem perceber aprimoramentos no empreendimento.
Ex-ministra do Planejamento no governo de Dilma Rousseff (PT) e integrante da campanha do petista, Miriam Belchior afirmou ao Estadão/Broadcast que as revisões de contratos de concessão "paradas" serão analisadas com prioridade, como parte do plano de intensificar investimentos em obras públicas. Miriam não descarta a possibilidade de a equipe analisar eventual repactuação desses negócios. Mas a análise será feita caso a caso. "Se for vantajoso, vamos repactuar; se não for, vamos relicitar, não tem jeito. Só dá para saber analisando cada contrato", afirmou a ex-ministra.
A avaliação é de que há urgência para resolver o imbróglio e destravar os investimentos nas rodovias e nos aeroportos, já que o processo de relicitação desobriga o concessionário a fazer esse tipo de desembolso. A saída pela repactuação poderá ser analisada se não houver problemas tarifários ou legais, pontuou Belchior. "Vamos olhar para ver o que é melhor, para ter investimentos mais rápidos, (poderia analisar repactuar) desde que não tenha problema tarifário, desde que siga a lei, até porque para repactuar tem de seguir vários critérios", disse.
Bolsonaro. Como mostrou o Estadão/Broadcast, diante do ritmo lento o Ministério da Infraestrutura avalia ajustar regras do mecanismo ainda neste ano. Para o governo Bolsonaro, o pagamento deve ser dividido em duas fases. Na primeira, a concessionária é paga pelo valor chamado de incontroverso, ou seja, em torno do qual há acordo entre as partes. Ao receber o montante, deixaria a concessão. O valor controverso, sobre o qual não há consenso, vai para arbitragem.
O modelo gerou um receio entre as concessionárias de rodovias e incomodou especialmente a administradora do aeroporto de Viracopos (SP), que tem interesse em ficar no terminal e afirma que só sairá quando receber toda a indenização. A disputa sobre o formato de pagamento ganhou um terceiro personagem ao chegar ao Tribunal de Contas da União (TCU). A relicitação do aeroporto de São Gonçalo está na Corte há mais de um ano, sem que o ministro-relator, Aroldo Cedraz, leve o caso a plenário, o que abriria a possibilidade de o governo fazer o primeiro leilão dos ativos devolvidos.
O enrosco no TCU já está no radar da equipe de Lula, que diz planejar, caso o petista seja eleito, uma interação forte com a Corte para desatar o problema. O governo Bolsonaro também tem reforçado a interlocução e os pedidos no Tribunal para que o caso de São Gonçalo seja destravado. A força-tarefa envolve a governadora do Rio Grande do Norte, Fátima Bezerra, que é do PT, parlamentares do Estado e a concessionária, a Inframerica, que acumula prejuízos e tem urgência em sair do aeroporto.
O ministro da Infraestrutura, Marcelo Sampaio, também tem defendido aprimorar as regras de relicitação ainda neste ano. Para ele, algumas questões podem ser resolvidas na regulamentação. Ele não descarta editar medida provisória para alterar a lei, de 2017, que prevê devolução amigável.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.