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Investing.com - O cenário atual da economia brasileira apresenta uma interessante dualidade para investidores estrangeiros, na avaliação de Adriana Dupita, vice economista-chefe da Bloomberg para mercados emergentes em conversa com o Investing.com. Enquanto o Brasil oferece um atrativo diferencial de juros para operações de carry trade, a volatilidade tanto do câmbio quanto da curva de juros tem afugentado potenciais investidores.
Além disso, a economia destaca que, embora o problema fiscal do país não seja novo, o atual cenário de juros amplifica suas complexidades. No lado fiscal, apesar de apontar que o governo realizou um ajuste fiscal, Dupita argumenta que o país precisa apresentar uma perspectiva clara de estabilização da dívida pública, mesmo que a médio prazo, para reconquistar a confiança do mercado e facilitar o trabalho do Banco Central.
Confira abaixo o segundo trecho da entrevista da economista com o Investing.com, realizada em 31 de janeiro. A primeira entrevista abordou a questão do Banco Central e a condução da política monetária, e você pode ler clicando aqui.
Investing.com: Sobre a política fiscal, o governo diz que está faltando apenas um pouco mais de esforço para reduzir o déficit primário e zerá-lo, mas ao mesmo tempo os críticos apontam que a dívida pública está aumentando, inclusive com o impacto do déficit nominal maior. O que o governo deve fazer para diminuir as incertezas com o fiscal?
Adriana Dupita: Em primeiro lugar, temos um problema fiscal, mas faz pelo menos 10 anos. Não é exatamente uma novidade.
Em segundo lugar, o problema fiscal piora quando a taxa de juros é mais alta. Não é motivo para não subir a taxa de juros, mas se a taxa de juros sobe em resposta a uma conjuntura que inclui a questão fiscal, é verdade também que a política fiscal precisa responder ao que acontece com a política monetária.
O mundo ideal é o governo subir a sua meta de resultado primário, ainda que marginalmente e sobre um horizonte mais distante de tempo. Uma dívida mais alta com um juro mais alto significa um primário mais alto, também mais esforço fiscal para poder estabilizar a dívida pública.
Este governo fez, no final das contas, um ajuste fiscal. Se olhar o número frio das estatísticas fiscais, o atual governo fez uma recomposição do déficit primário. Pode parecer que não, porque o final do governo Bolsonaro teve um superávit primário e um déficit nominal mais baixo, porém com pedalada de precatório e tinha uma compressão, em termos reais, de um monte de despesa pública que era absolutamente insustentável.
Isso não é uma questão só de preferência política, é uma questão prática mesmo. Uma parte da recomposição do déficit primário tem a ver, então, com o reconhecimento e pagamento dessas despesas de precatório e algum reajuste. Não é uma política de valorização do salário e do funcionalismo público, mas não colocar toda a conta nas costas do funcionalismo público e recompor alguns programas de governo, principalmente o programa do Bolsa Família, que acabou tendo um novo valor mínimo de R$ 600 por causa do debate eleitoral e estava nos planos dos dois candidatos do segundo turno.
Investing.com: Diante desse quadro, o ajuste fiscal foi suficiente?
AD: Não, porque é só ver que a dívida pública está subindo. O ideal é que tenha novos passos, o que acaba entrando em um outro debate: a cobrança do mercado para o governo cortar gastos.
O governo Lula não foi eleito para cortar gastos. A preferência dos eleitores do vitorioso não é uma redução do papel do Estado.
É óbvio que existe espaço para a racionalização de gastos. Ser eleito para não reduzir o papel do Estado não significa que você ganhou carta branca para aumentar o tamanho do Estado. E o fato é que as despesas públicas estão crescendo em termos reais a um ritmo muito elevado, mesmo que retire os pagamentos de precatórios, é um ritmo incompatível para cumprir o arcabouço fiscal que este próprio governo propôs.
Seria muito bem-vinda se viesse, por exemplo, alguma coisa como a desvinculação da Previdência e do Benefício de Prestação Continuada do salário mínimo. Não sei a viabilidade política e quanto estaria disposto o governo a caminhar nessa direção. A combinação entre o aumento da meta do resultado primário e a desvinculação do salário mínimo dos pagamentos da Previdência poderia deflagrar um aumento bastante positivo para os ativos brasileiros, facilitando o papel do Banco Central.
Investing.com: Em linhas gerais, não entrando em detalhes de quais medidas deveriam ser adotadas, é necessária uma sinalização de que o crescimento do endividamento público seja menor, que não fique crescendo até 2028, 2029.
AD: Exato! A definição do que é uma dívida insustentável é uma dívida que não para de crescer. No curto prazo, está tudo bem ter uma perspectiva de alta da dívida em relação ao PIB.
Para falar a verdade, todos os países estão se endividando mais. São poucas as economias, normalmente emergentes, as que estão conseguindo reduzir endividamento.
Agora, diferente dos Estados Unidos, o Brasil não emite dólar. A nossa dívida é em real, mas nem todo mundo vai querer receber uma quantidade infinita de reais. Por isso, é preciso sinalizar que vai estabilizar. Ainda que não seja em 2025, 26, 27 ou mesmo 28, como diz o secretário do Tesouro, mas em algum momento é preciso sinalizar que a dívida vai parar de crescer.
Quando olhamos as projeções do mercado, as nossas, não tem perspectiva de estabilização até meados da década seguinte, é essa reversão que as medidas precisam atingir.
Investing.com: O carry trade hoje está favorável ao Brasil com o diferencial de juros comparado à taxa de juros praticada nos EUA, o que pode trazer fluxo de dólares ao país. O fiscal, porém, pode afugentar, por causa das incertezas. Como o investidor estrangeiro avalia essa relação para a sua decisão de investimentos no Brasil?
AD: A impressão que eu tive em relação ao ano passado de conversar com investidores é que o estrangeiro olha ao mesmo tempo para o Brasil e para o prêmio, ao potencial que ele tem de ganho. O investidor estrangeiro não vê apenas a taxa de câmbio, ele avalia a somatória do diferencial de juros com o potencial de valorização do câmbio no futuro. É o raciocínio básico de carry trade.
Só que não é bem assim que funciona, porque, mesmo que se tenha uma moeda que tem muito potencial de valorização, há muita incerteza em torno desse potencial de valorização e muita volatilidade no câmbio, o que acaba afugentando o investidor. E, no ano passado, não foi só a volatilidade de câmbio que afugentou o investidor, foi também a volatilidade da curva de juros. Se você olhar como é que se comportou a curva de juros nos diferentes momentos do tempo, ela tinha um formato e um nível antes de maio, depois passou para outro no meio do ano, aí depois mudou de novo, sobe de novo no final do ano, e isso machuca muito o investidor quando ele entra, principalmente quando é um investidor de prazo mais curto.
O que a gente observou no final do ano passado é que tinha uma onda de pessimismo dos locais, mas as oportunidades de ganho não estavam sendo arbitradas pela entrada de investidores estrangeiros, porque eles estavam sendo afugentados. Menos pela percepção de incertezas de política econômica, e mais pela volatilidade dos preços dos ativos. Então, o que poderia trazer esse investidor de volta?
Dá a impressão de que já está havendo algum retorno desse investidor, mas precisa de um pouco menos de volatilidade, menos notícias com incertezas e emoções.
Porque, de fato, quando se compara o carry trade do Brasil com o de outros países, se vai apenas pelo diferencial de juros, é um diferencial de juros muito mais atraente do que na maioria dos outros países. Se ajustar isso pelo potencial de valorização da moeda, o quanto que ela está desalinhada em relação aos fundamentos, isso adiciona outra camada de interesse. Mas, se se pondera isso pela volatilidade da moeda, o interesse pode desaparecer rapidamente.
Essa é uma das perguntas que precisamos fazer. De um lado, não dá para esperar que o fluxo de notícias global não vá gerar volatilidade pós-Trump. Mas, o governo pode gerar mais notícias boas e menos ruídos, o que pode acontecer.
E o Banco Central fazer uma gestão inteligente do mercado de câmbio, sem gerar novidades que adiciona mais volatilidade. Isso dialoga com a questão da intervenção, de não exagerá-la, usar um instrumento que é mais adequado em cada momento. Não gerar ruído, por exemplo, de parecer que o Banco Central está tentando evitar uma alta de juros vendendo dólar para o mercado.