Por Lisandra Paraguassu e Eduardo Simões
BRASÍLIA/SÃO PAULO (Reuters) - O ex-presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha foi preso preventivamente nesta quarta-feira pela Polícia Federal em Brasília por determinação do juiz Sérgio Moro, da 13ª Vara Federal de Curitiba, que concentra as ações da operação Lava Jato em primeiro instância, informaram a PF e o Ministério Público Federal.
A decisão de Moro atendeu a pedido dos procuradores da força-tarefa da Lava Jato, que afirmaram que Cunha representava risco às investigações caso permanecesse em liberdade.
"Os procuradores sustentaram que a liberdade do ex-parlamentar representava risco à instrução do processo, à ordem pública, como também a possibilidade concreta de fuga em virtude da disponibilidade de recursos ocultos no exterior, além da dupla nacionalidade", informou o MPF em comunicado, lembrando que Cunha tem as cidadanias brasileira e italiana.
O ex-parlamentar foi preso no âmbito de uma ação penal repassada a Moro pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em que Cunha é acusado de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e evasão de divisas em fatos relacionados à aquisição de um campo exploratório de petróleo em Benin, na África, pela Petrobras (SA:PETR4), no ano de 2011. A propina paga ao ex-deputado teria sido depositada em uma conta secreta de Cunha na Suíça.
A residência de Cunha no Rio de Janeiro, segundo um fonte da PF. O ex-deputado embarcou para Curitiba pouco antes das 16h.
Cunha foi citado por delatores da Lava Jato e teve o mandato parlamentar cassado pela Câmara em setembro. Antes disso, havia sido afastado em maio pelo STF da presidência da Câmara, cargo ao qual renunciou em julho.
Figura polêmica na cena política nacional nos últimos anos, quando foi líder da bancada do PMDB na Câmara e articulou a formação do grupo de parlamentares conhecido como "centrão", ainda antes de se eleger presidente da Casa, Cunha é conhecido por contra-atacar sempre que tem seu nome envolvido em irregularidades.
"Hoje é o começo do fim do governo Michel Temer. Um homem como Eduardo Cunha acostumado aos melhores vinhos, acostumado a visitar os melhores hotéis do mundo, acostumado a comer os melhores pratos, acostumado com os melhores sabores da vida, eu duvido este Eduardo Cunha aguentar essa prisão em Curitiba e não fazer delação premiada", disse o vice-líder da minoria na Câmara, deputado Sílvio Costa (PTdoB-PE).
"Eu sei que muitos parlamentares aqui a partir de hoje, eles vão aumentar o consumo de Lexotan. Mas também eu sei que lá no Palácio do Planalto, a essa altura, a quantidade de pedido a domicílio nas farmácias pedindo calmante é enorme", acrescentou.
No Palácio do Planalto, a ordem, segundo fontes ouvidas pela Reuters, é de não comentar a prisão de Cunha e manter distância do ex-deputado. Embora a avaliação dentro do governo seja a de que Cunha não tem munição para abalar o presidente, acredita-se que ele pode complicar outros peemedebistas e o governo como um todo.
Cunha usou as redes sociais para criticar a decisão de Moro, que classificou de "absurda", e disse que seus advogados " tomarão as medidas cabíveis".
RÉU EM DOIS PROCESSOS
Responsável por deflagrar o processo que culminou com o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, Cunha culpou o governo do presidente Michel Temer pela perda de seu mandato logo após sua cassação e, dias depois de ser cassado, fez acusações de irregularidades contra o secretário do Programa de Parceria de Investimentos, Moreira Franco, um dos nomes mais próximos a Temer no governo.
Membro da base de Temer na Câmara, o líder do DEM na Casa, Pauderney Avelino (AM), disse não saber avaliar qual o impacto da prisão de Cunha, embora tenha feito a avaliação de que a detenção do ex-deputado abre caminho para que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva também seja preso na Lava Jato.
"O ex-deputado Eduardo Cunha é do PMDB, agora o que eu sei é que ele tinha vários apoios em vários partidos. Não saberia dizer qual o impacto dentro do próprio PMDB", disse Pauderney.
"O pessoal do PT dizia que, para prender Lula, teriam antes que prender o Eduardo Cunha. Se for na tese do PT, o caminho está aberto. As portas de Curitiba estão abertas também para o Lula."
Cunha, que foi deputado pelo PMDB do Rio de Janeiro, tem afirmado que não fará um acordo de delação premiada pois alega inocência e diz não ter o que delatar. Ele, no entanto, disse que escreverá um livro sobre o impeachment de Dilma no qual relatará conversas que teve com personagens políticos sobre o assunto.
Ele respondia a duas ações penais ligadas à Lava Jato no STF, mas as ações acabaram sendo repassadas a instâncias inferiores quando ele teve o mandato cassado e perdeu a prerrogativa de foro junto ao Supremo.
Uma delas, em que Cunha é acusado de receber pelo menos 5 milhões de dólares de um delator da Lava Jato em propina por um contrato de navios-sonda da Petrobras, foi repassada para o Tribunal Regional Federal da 2ª Região, sediado no Rio de Janeiro.
Isso porque a atual prefeita de Rio Bonito (RJ), a ex-deputada federal Solange Almeida, é ré no mesmo processo e, como prefeita, ela tem prerrogativa de foro junto ao TRF da 2ª Região.
A outra ação penal, que envolve a suposta propina relacionado aos campos de petróleo na África e o depósito dos recursos em contas na Suíça, que resultou em sua prisão nesta quarta, foi repassada a Moro.
Cunha nega ser o dono dessas contas, mas documentos dos Ministérios Públicos do Brasil e da Suíça apontaram Cunha e familiares como proprietários de contas bancárias no país europeu.
O ex-parlamentar teve o mandato cassado acusado de mentir em depoimento à CPI da Petrobras em 2015 quando questionado se tinha contas bancárias no exterior.
(Reportagem adicional de Maria Carolina Marcello e Anthony Boadle, em Brasília, e Rodrigo Viga Gaier, no Rio de Janeiro)