Por Ricardo Brito
BRASÍLIA (Reuters) - A decisão sobre a utilização dos depoimentos de executivos da Odebrecht, a principal polêmica do julgamento da chapa Dilma-Temer e que poderá definir o peso da acusação, não chegou a ser analisada pelos ministros do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) no primeiro dia de apreciação do processo.
A sessão de abertura do julgamento, que transcorreu em clima tranquilo, contou com a manifestações dos advogados da ex-presidente Dilma Rousseff, do presidente Michel Temer, do PSDB, do Ministério Público Eleitoral e o início do voto do relator, ministro Herman Benjamin.
Nas quatro preliminares apreciadas, o relator teve o apoio unânime dos outros seis ministros do TSE. Essas preliminares analisaram questionamentos anteriores ao julgamento, como, por exemplo, se o processo perdeu o objeto em razão de Dilma ter sofrido processo de impeachment ou se o TSE pode cassar os mandatos de presidente da República e vice.
Contudo, uma quinta preliminar --a aceitação das delações da Odebrecht-- ficou para ser analisada pela corte apenas na quarta-feira, a partir das 9h, quando o julgamento será retomado.
Na saída da sessão desta terça-feira, um dos advogados de Temer, Gustavo Guedes, elogiou a intervenção do ministro Napoleão Nunes Maia que comentou o fato de o processo ter ouvido testemunhas que não foram requeridas pelas partes nem pelo Ministério Público Eleitoral.
Para Guedes, o relator do processo não deveria ter determinado, por conta própria, o depoimento de Marcelo Odebrecht nem de Cláudio Mello porque houve "vazamento ilegal" pela imprensa de declarações de ambos.
"Tenho muita confiança nessa preliminar", disse o defensor de Temer.
A análise dessa preliminar, segundo os advogados de defesa de Dilma e Temer, poderá mudar o panorama do processo. Se mantida, a acusação fica robusta. Do contrário, se enfraquece.
CORRUPÇÃO E CAUTELA
Na sessão de pouco mais de três horas, Herman Benjamin fez uma exposição em que criticou a corrupção nas campanhas e defendeu a importância de se fazer eleições com credibilidade.
"Enfraquecer a Justiça Eleitoral é condenar as eleições ao descrédito e, se desacreditadas, o que sobrará aos brasileiros?", questionou o ministro na introdução de seu voto.
"O que ainda nos livra de decidir na rua com armas e sangue é a esperança de que a cada dois anos um pouco, ou muito, poderá mudar pelo voto."
Durante sua introdução, Benjamin sofreu um aparte do presidente do TSE, ministro Gilmar Mendes, que defendeu cautela sobre eventuais cassações de mandatos.
"Temos que ser cuidadosos no que diz respeito a cassações", disse Mendes.
O presidente do TSE chegou a citar que a corte cassa mais mandatos de detentores de cargos eletivos do que na ditadura, no que foi rebatido por Benjamin. "Ditaduras cassam quem defende a democracia, o TSE cassa quem vai contra a democracia", disse o relator.
ARGUMENTOS
Antes de Benjamin iniciar a análise das preliminares, o vice-procurador-geral eleitoral, Nicolao Dino, afirmou que há "elementos robustos" de abuso de poder econômico na eleição que elegeu Dilma Rousseff à Presidência em 2014 e negou que fatos novos estranhos ao caso tenham sido inseridos no processo. Ele defendeu a cassação da chapa "como um todo".
"Há elementos robustos que evidenciam a prática de abuso de poder econômico e, portanto, a justificar, nos termos da legislação eleitoral, a cassação da chapa como um todo. E aqui, em caráter derradeiro, assinalo, que essa consequência decorre expressamente do que consta na Constituição, que prevê que a eleição do presidente importa a eleição do vice", disse Dino.
Primeiros a falar, os advogados do PSDB --partido responsável pelas ações contra a chapa e que teve o candidato derrotado por Dilma no segundo turno em 2014, o senador afastado Aécio Neves-- disseram que ficou comprovado no curso do processo que a petista se elegeu após ter cometido abuso de poder político e econômico.
"A campanha se construiu em cima de mentiras, não mentiras apenas fabricadas pelo marqueteiro", disse o advogado Flávio Costa, um dos defensores dos tucanos em sustentação oral. "A mentira venceu."
Já o advogado de Dilma, Flávio Caetano, chamou de mentirosos os delatores que depuseram, pedindo a exclusão de seus depoimentos no processo, e argumentou contra a divisão da chapa que tinha como vice o hoje presidente Michel Temer.
Para Caetano, o empreiteiro Marcelo Odebrecht e os marqueteiros João Santana e Mônica Moura mentiram sobre o uso de caixa 2 na campanha presidencial.
Na argumentação contra a divisão da chapa, o advogado foi contundente: "Aquilo que a Constituição uniu não cabe ao candidato a vice, ao bel-prazer, desunir."
Os advogados de Temer, por sua vez, insistiram no argumento de que não se pode alargar o objeto inicial das ações. Também questionaram a possibilidade de o TSE condenar o presidente apenas com base em delações premiadas que não foram contraditadas por outras testemunhas e elementos de prova.
"A colaboração premiada é importante para começar uma investigação, mas não para fazer uma condenação", afirmou o advogado Marcus Vinícius Furtado Coelho, defensor de Temer.