Efeito dominó: diminuição dos riscos bateu no câmbio, reduziu pressão sobre inflação e abriu espaço para queda dos juros (Flickr/Bro. Jeffrey Pioquinto)
SÃO PAULO – A possibilidade da presidente Dilma Rousseff deixar o governo gerou um efeito dominó nas expectativas para a economia, tanto para este ano quanto para o próximo. Os agentes econômicos viram se abrir o caminho para um governo que pudesse aprovar medidas para arrumar as contas públicas e promover reformas para estabilizar a economia.
A menor percepção sobre o risco futuro do país bateu primeiro no câmbio. O dólar mais barato reduziu as pressões sobre a inflação, que abriu espaço para um corte nas taxas de juros mais à frente. A única variável sobre a qual as expectativas ainda não mostraram melhora é a atividade, que deve ser a última a reagir.
“Temos um governo paralisado, que não consegue atacar o principal problema da economia, que é o fiscal”, afirma Daniel Weeks, economista-chefe da Garde Asset Management. “Quando aumentou a probabilidade de troca [de governo], o mercado incorporou a perspectiva de uma melhora no fiscal.”
A projeção dos economistas consultados pelo Banco Central no Boletim Focus para o câmbio no fim deste ano, por exemplo, caiu de R$ 4,25 para R$ 3,70 desde a instalação da comissão especial do impeachment na Câmara até agora. Para o fim de 2017, a expectativa caiu de R$ 4,34 para R$ 3,90 no mesmo período (confira nas tabelas abaixo).
O agora presidente afastado da Câmara, Eduardo Cunha, aceitou o pedido de impeachment de Dilma no dia 2 de dezembro, mas foi apenas com o começo efetivo do andamento do processo dentro da Câmara, em março, que o mercado começou a apostar de fato no afastamento da presidente. Tanto que neste mês o Ibovespa subiu 17%, no que ficou conhecido como o rali do impeachment na Bolsa.
Projeções para 2016 | ||||
Dólar | IPCA | Selic | PIB | |
Instalação da comissão na Câmara | R$ 4,25 | 7,46% | 14,25% | -3,54% |
Atual | R$ 3,70 | 7,00% | 13,00% | -3,86% |
Fonte: Boletim Focus - mediana |
“Com certeza a questão política teve peso preponderante nessa melhoria [das expectativas]”, afirma Luis Otávio de Souza Leal, economista-chefe do Banco ABC (SA:ABCB4) Brasil. Para ele, porém, essa melhoria pouco tem a ver com o perfil de Michel Temer, mas com o apoio político que ele pode aglutinar.
“O mercado não via Dilma tocar uma agenda de reformas. Com o Temer há a esperança de que isso aconteça. O Focus é o melhor exemplo disso porque é a transformação do círculo vicioso para um círculo virtuoso”, afirma Leal.
Um bom termômetro da percepção de risco sobre o país é medido pelo preço do CDS (Credit Default Swap), uma espécie de seguro contra calote do Brasil. O preço do CDS brasileiro de cinco anos caiu 32% no acumulado deste ano. A maior parte da queda ocorreu justamente do início do andamento do processo na Câmara para cá.
Sinais
O economista-chefe da Garde avalia que as expectativas econômicas devem continuar melhorando, o que será refletido no Boletim Focus. “Depois que o impeachment sair, os economistas vão rever o cenário e calcular qual o câmbio, qual a inflação”, afirma.
Um ponto em que os economistas são unânimes é da importância dos sinais que o governo de Temer vai emitir ao mercado. “A discussão para de ser o impeachment e passa a ser qual a composição do novo governo e qual são efetivamente as chances de passar no Congresso medidas para recuperar a sustentabilidade fiscal”, diz o economista.
Projeções para 2017 | ||||
Dólar | IPCA | Selic | PIB | |
Instalação da comissão na Câmara | R$ 4,34 | 6,00% | 12,50% | 0,50% |
Atual | R$ 3,90 | 5,62% | 11,75% | 0,50% |
Fonte: Boletim Focus - mediada |
Temer terá que corresponder às expectativas criadas sobre ele, sob pena de toda a melhora das projeções serem devolvidas.
“Se não tiver algum tipo de combustível que alimente esse círculo virtuoso ele vai acabar perdendo fôlego. O governo Temer precisa começar já mandando propostas de mudanças estruturais na economia brasileira para que esse otimismo continue. Se ele perder votações já no início, as expectativas de indicadores voltam para o nível do período Dilma”, avalia o economista-chefe do ABC Brasil.
E Temer terá pouco tempo para fazer isso, uma vez que o segundo semestre tem uma agenda apertada entre o recesso parlamentar em julho, as Olimpíadas em agosto e eleições municipais em outubro.
“Temer terá pouco tempo, então terá que concentrar seu tempo e capital político em poucas medidas e sinalizar um Congresso propício para passa-las”, diz Weeks.