Por Rafaella Barros
(Reuters) - Representantes do setor de combustíveis têm dúvidas quanto à manutenção da isenção dos impostos federais sobre os produtos em 2023, e veem com incerteza ainda maior a redução do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), sob análise do Supremo Tribunal Federal (STF).
Um eventual fim da isenção de PIS/Cofins sobre os combustíveis tem o potencial de elevar os preços a partir de 1º de janeiro --a legislação atual prevê o benefício só até 31 de dezembro.
Sem uma nova lei, portanto, poderia haver impacto na inflação e no bolso dos brasileiros, trazendo uma primeira preocupação para o presidente eleito, seja ele Luiz Inácio Lula da Silva ou Jair Bolsonaro.
Embora o orçamento da União considere uma renúncia fiscal de mais de 50 bilhões de reais com a prorrogação da isenção da Cide e PIS/Cofins em 2023, no caso desses últimos tributos a nova isenção precisa ser aprovada pelo Congresso Nacional. Já a lei que estabeleceu um teto para o ICMS é considerada inconstitucional por Estados e discutida na Suprema Corte.
Há dúvidas se o Congresso Nacional analisará o tema após a eleição de domingo, independentemente do resultado, segundo representantes do setor. Isso teria de ser feito a tempo dos efeitos da lei terem início a partir de 1º de janeiro.
"A lei estabelece a isenção até dezembro de 2022. É com isso que a gente está contando. Até que se tenha uma certeza que vai ser estendido", disse Valéria Lima, diretora de downstream do Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP).
A incerteza, além de atrapalhar o planejamento das distribuidoras, dificulta também previsões sobre o volume de etanol que poderá ser produzido na safra de 2023.
A destinação de cana para a produção do combustível ou açúcar será maior ou menor dependendo da configuração tributária e do impacto na competitividade da gasolina, segundo especialistas. Se os tributos federais voltarem, em tese uma maior produção de etanol seria favorecida.
Outro representante do setor, que preferiu falar sob anonimato, também disse não acreditar na extensão da isenção dos impostos federais, já que as renúncias fiscais são gigantescas.
"Se tiver mudança de governo, inclusive, tudo vai ter que ser revisado. O tamanho da abertura (no orçamento, em 2022) que foi dado, para não recolhimento do tributo, foi para efeito momentâneo para a situação do petróleo, que estava nas alturas", disse a fonte do setor.
O Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) de 2023, já enviado para o Congresso Nacional, prevê uma renúncia fiscal total de 52,9 bilhões de reais pela União para manter a Cide e o PIS/Cofins zerados durante todo o ano, considerando-se gasolina, etanol, GNV e diesel, além de GLP e querosene de aviação.
Só a desoneração da gasolina, etanol e o GNV responderá por 34,3 bilhões de reais a menos no orçamento. O Ministério da Economia disse à Reuters que essa previsão está mantida.
Desde o final de junho, os tributos federais sobre a gasolina e o PIS/Cofins do etanol hidratado estão zerados, representando um alívio de 0,69 real e 0,24 real por litro nas bombas, respectivamente, segundo dados da Federação Nacional do Comércio de Combustíveis e Lubrificantes (Fecombustíveis).
Para o diesel, essa isenção já estava em vigor desde março, reduzindo os preços para os consumidores em 0,33 real/litro, em função da aprovação da Lei Complementar 192.
Juntamente com o teto do ICMS, a isenção de PIS/Cofins colaborou para o país reduzir a inflação, tendo registrado deflações em julho, agosto e setembro no IPCA.
O presidente da Fecombustíveis, James Thorp, no entanto, diz acreditar que a medida sobre a isenção do PIS/Cofins será mantida por deputados e senadores por beneficiar a população.
"E isso não só incrementa a venda dos postos como também impacta diretamente a possibilidade de menor capital de giro empregado (pelos postos)", disse Thorp.
Disputa no STF
Por outro lado, há um consenso entre os representantes do setor de que as medidas que levaram à redução do ICMS na bomba são um caso mais complexo.
"Para o setor, a lei 192 foi um avanço muito importante. Mas continua incerto e isso é um problema. Essa incerteza com o ICMS é maior porque significa uma mudança tributária", disse Valéria Lima.
Segundo dados da Fecombustíveis, a média do ICMS por litro de gasolina saiu de 1,75 real em junho, antes da mudança, para 0,89 real por litro este mês, enquanto no etanol o imposto caiu de 1,26 real para 0,68 real.
Para o advogado tributarista e presidente do Comitê de Transação Tributária da Associação Brasileira da Advocacia Tributária (ABAT) Eduardo Natal, a lei que mudou o ICMS é tão polêmica que não há como prever qual será a decisão do STF.
"Agora, os Estados, sem dúvida, têm competência constitucional para legislar sobre o ICMS. E também penso que definir o teto não estaria na competência da União. Mas é um tema que vai gerar ainda muito debate", disse Natal, referindo-se à Lei Complementar 194, sancionada em junho, que fixou o teto de 17% ou 18% para o ICMS sobre combustíveis.
No caso do ICMS, a Lei Complementar 192, de março, substituiu a cobrança em forma de percentual sobre o preço final do combustível para uma alíquota única e uniforme (sem diferenciação entre os Estados), cobrada por litro, assim como já ocorre com os impostos federais.
No entanto, como a lei foi contestada pelos Estados, hoje o imposto estadual corresponde à cobrança sobre uma média móvel de preços dos últimos cinco anos, após uma decisão liminar de junho do ministro do STF André Mendonça.
Peritos convocados pelo ministro do STF Gilmar Mendes atestaram —por unanimidade— que a unificação e a redução do ICMS sobre combustíveis proposta por Jair Bolsonaro (PL) e aprovada pelo Congresso são inconstitucionais, segundo informou o jornal Folha de S.Paulo. Procurado, o STF não comentou o assunto.
(Por Rafaella Barros)