Depois de uma manhã de volatilidade, o dólar à vista se firmou em baixa ao longo da tarde e encerrou a sessão desta segunda-feira, 27, em queda de 0,35%, cotado a R$ 5,2344. Sem indicadores domésticos de peso, o mercado trabalhou ao sabor do comportamento da moeda norte-americana no exterior, de fluxos pontuais (financeiros e comerciais) e de ajustes de posições no mercado futuro, em semana marcada pela definição da última Ptax de junho.
Na máxima, na primeira hora de negócios, o dólar varou o teto de R$ 5,25 e correu até R$ 5,2756. Com sucessivas mínimas no início da tarde, desceu até R$ 5,2027.
Segundo operadores, a retomada do apetite por ativos ligados a commodities com sinais de reabertura da economia chinesa após surto recente de covid-19 acabou se sobrepondo ao aumento da percepção de risco fiscal doméstico, em grande parte já incorporado aos preços dos ativos. O minério de ferro subiu 4,17% no porto chinês de Qingdao e o Banco do Povo da China (PBoC), na sigla em inglês) prometeu seguir com política monetária frouxa para apoiar a economia.
Além disso, comenta-se que a perda de fôlego da moeda norte-americana frente a pares fortes abriu espaço para uma realização de lucros e desmonte de posições defensivas. O dólar vem de quatro semanas seguidas de alta ante o real - período em que saltou do patamar de R$ 4,80 para mais de R$ 5,20 - e marca valorização superior a 10% no mês.
"Existe muito receio com a desaceleração da economia global. Esse sinal positivo da China melhora o ambiente para commodities e acaba se refletindo na taxa de câmbio", afirma o diretor de produtos câmbio da Venice Investimentos, André Rolha. "O real foi muito castigado pela questão do risco fiscal com o pacote de bondades do governo. Os ataques à Petrobras (SA:PETR4) também machucaram bastante o sentimento do investidor."
A novela na troca de comando da Petrobras teve mais um capítulo nesta segunda à tarde com a aprovação, pelo Conselho de Administração da empresa, do nome de Caio Mario de Andrade, egresso da equipe econômica do ministro Paulo Guedes, para a presidência. No campo fiscal, o relator da PEC dos Combustíveis, senador Fernando Bezerra (MDB), adiou a apresentação de seu parecer para a terça-feira, 28, às 11 horas.
Apelidado de "pacote do desespero" nos bastidores, a PEC traz ampliação do Auxílio Brasil (de R$ 400 para R$ 600), aumento do vale gás e voucher de R$ 1 mil para caminhoneiros - medidas com impacto fiscal estimado em R$ 34,8 bilhões fora do teto de gastos.
Estados como São Paulo e Goiás anunciaram redução do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) sobre combustíveis, na esteira da sanção pelo presidente Bolsonaro, na sexta-feira, de lei que estabelece teto para a cobrança do imposto estadual sobre combustíveis, energia elétrica, comunicações e transporte. A redução tributária tem mão dupla: traz alívio na inflação deste ano, mas pode comprometer a arrecadação de Estados e, por tabela, as contas públicas.
Para o diretor da Venice, a chamada questão fiscal deve continuar a permear os negócios no mercado de câmbio e pode exacerbar a volatilidade à medida que as eleições presidenciais se aproximem. Ele trabalha com uma faixa ampla para oscilação do dólar nas próximas semanas (entre R$ 4,95 e R$ 5,25), dado o grau de incertezas aqui e no exterior. "Não acredito que os ativos estejam precificando 100% o período eleitoral, mas acho que o real pode vir para R$ 5 no curto prazo. Temos os fundamentos das commodities e a taxa de juros pode subir mais e se aproximar de 14%, o que estimula o carry trade", diz.
No exterior, o índice DXY - que mede o desempenho do dólar frente a uma cesta de seis divisas fortes - trabalhou em queda, abaixo dos 104,000 pontos, sobretudo em razão de perdas frente ao euro. Mesmo assim, segue no maior patamar em 20 anos. O dólar apresentou desempenho misto na comparação com divisas emergentes e de países exportadores de commodities, subindo frente a pares do real como peso mexicano e o rand sul-africano.
O Citi avalia, em relatório, que o quadro global está se tornando cada vez mais desafiador para a moeda brasileira. Por ora, os preços "ainda elevados" impedem uma depreciação mais significativa da taxa de câmbio. Contudo, alerta o Citi, quanto mais os países desenvolvidos avançarem no aperto monetário, "menos amigável" fica o ambiente para o real. "Perspectivas de preços de commodities mais baixos à frente podem exacerbar esse impacto. Adicionalmente, as incertezas ligadas à política fiscal podem aumentar à medida nos aproximamos da eleição presidencial", afirma o Citi que trabalha com taxa de cambio de R$ 5,25 no fim do ano.