Parecia que a série negativa do Ibovespa chegaria a termo nesta quarta-feira mesmo com a cautela que se impôs à tarde em Nova York, onde os principais índices de ações se firmaram em baixa e acentuaram perdas na sessão, em resposta a sinais hawkish sobre a política monetária dos Estados Unidos notados na ata da mais recente decisão do BC norte-americano sobre juros, divulgada às 15 horas (de Brasília). Depois das 16 horas, contudo, o Ibovespa não resistiu à piora do sentimento no exterior e devolveu os ganhos moderados vistos mais cedo, encadeando assim a 12ª perda diária, algo não visto desde 1970, de acordo com o AE Dados.
Abaixo dos 116 mil pontos, nas mínimas da sessão, o Ibovespa fechou em queda de 0,50%, aos 115.591,52 pontos, tendo chegado no piso do dia, no fim da tarde, aos 115.533,58 pontos, saindo de máxima na sessão a 117.337,65 e de abertura a 116.171,26 pontos. Na semana, o Ibovespa recua 2,10% e, no mês, cede 5,21%, limitando o avanço no ano a 5,34%. O giro financeiro desta quarta-feira foi a R$ 48,8 bilhões, fortalecido pelo vencimento de opções sobre o índice.
O fechamento abaixo dos 116 mil pontos, agora o menor nível de encerramento para o Ibovespa desde 7 de junho, então aos 115.488,16 pontos, abre caminho para o prolongamento da correção em curso, com o índice da B3 (BVMF:B3SA3) ainda sem o gosto de ganhos no mês após ter encerrado julho bem perto dos 122 mil pontos. A região dos 116 mil pontos era considerada uma referência de suporte importante que, uma vez rompida, poderia levar o Ibovespa ainda mais para baixo, em direção aos 110,5 mil pontos.
O documento do Federal Reserve destacou que os dirigentes da instituição consideram "fundamental" que a taxa de juros dos Estados Unidos permaneça em nível restritivo até a inflação retornar à meta de 2% ao ano, no médio prazo. Apesar do recado, e da reação vista nos preços do petróleo, em queda em torno de 2% na sessão, Petrobras (BVMF:PETR4) puxava então, pelo peso que possui no índice, recuperação parcial do Ibovespa nesta quarta-feira, com a ON ainda em alta de 2,95% e a PN, de 2,20%, no fechamento.
No dia seguinte ao anúncio, pela estatal, de aumento nos preços da gasolina e do diesel nas refinarias, válido a partir desta quarta-feira, o sinal negativo para WTI e Brent na sessão não deixou de ser benéfico para as ações da Petrobras, na medida em que contribui, também, para reduzir a defasagem entre os preços domésticos e as cotações internacionais da commodity. Mas Petrobras, sozinha, não fez o verão, e o Ibovespa iguala agora o feito do intervalo de 26 de maio a 11 de junho de 1970, há mais de 53 anos, quando também cedeu por 12 sessões seguidas.
Na ponta do Ibovespa nesta quarta-feira, destaque para IRB (BVMF:IRBR3) (+11,86%), Magazine Luiza (BVMF:MGLU3) (+7,22%) e Via (BVMF:VIIA3) (+5,92%), com Natura (BVMF:NTCO3) (-8,90%), Hapvida (BVMF:HAPV3) (-5,78%) e Alpargatas (BVMF:ALPA4) (-4,98%) no canto oposto. Entre os grandes bancos, BB ON (BVMF:BBAS3) foi a exceção positiva, em alta de 0,86% no fechamento, com perdas que chegaram a 1,46% (Bradesco (BVMF:BBDC4) ON) no fim do dia. Vale ON (BVMF:VALE3) também fechou em baixa, de 0,39%, com perdas no mês que se encaminham para 10% (até aqui, -9,48% em agosto, cedendo 4,43% na semana).
Até a piora no fim da tarde, a recuperação desta quarta vinha sendo "muito condicionada por preço dos ativos, especialmente no setor de commodities", mas a perspectiva à frente ainda é "nebulosa", com "muitos fatores de incerteza ainda no horizonte, externo como também doméstico", observa Gustavo Harada, líder da mesa de renda variável da Blackbird Investimentos.
"Além de toda incerteza em relação à economia chinesa, com efeito direto sobre as commodities, há ainda atenção ao fiscal no plano doméstico, com a expectativa para a votação do arcabouço, e também para a proposta de Orçamento de 2024. E, nos Estados Unidos, há também a questão dos juros e o efeito sobre a economia e as empresas, com um nível de endividamento que pode vir a ser um fator de preocupação, tendo em vista o atual nível de precificação dos ativos em Bolsa, ainda esticados", acrescenta Harada.
"A ata do Fed veio um pouco mais hawkish, na medida em que eles entendem que mais uma alta de juros pode ser ainda necessária. Por outro lado, mostra também que alguns dirigentes já tinham pensado em parar na última decisão, pelo efeito defasado da alta de juros sobre a economia. O que vai definir qual das pontas está certa são os dados, e haverá novas leituras de inflação ao consumidor, ao produtor e também sobre o mercado de trabalho até lá setembro, quando o Fed volta a deliberar sobre os juros. A ata de hoje ainda deixa em aberto os próximos passos do BC americano", diz Helena Veronese, economista-chefe da B.Side Investimentos.
"A ata trouxe muitos detalhes sobre o desenrolar do cenário econômico por lá, e os diretores do Fed estão vendo ainda riscos de alta na inflação, inclusive eles citam, no documento, a possibilidade de aperto adicional nos juros para garantir a convergência da inflação para a meta, o que representaria risco de queda adicional para a atividade econômica", diz Camila Abdelmalack, economista-chefe da Veedha Investimentos. "A primeira leitura do mercado foi de aperto adicional nos juros americanos. Mas depois, o mercado voltou a reduzir, um pouquinho, essa possibilidade. Vão continuar acompanhando inflação e dados sobre o mercado de trabalho", conclui a economista.