(Reuters) - O Ministério Público Federal (MPF) informou nesta quinta-feira que denunciou à Justiça 22 pessoas e 4 empresas, sendo 21 pessoas por homicídio qualificado com dolo eventual, pelo rompimento da barragem de rejeitos da mineradora Samarco, em novembro do ano passado.
Considerado o maior desastre ambiental da história do Brasil, o rompimento da barragem em Mariana (MG) deixou 19 mortos, centenas de desabrigados e poluiu o rio Doce, que percorre diversas cidades até atingir o litoral capixaba.
Para o procurador da República José Adércio Sampaio, havia sinais de que a barragem corria riscos há alguns anos, o que ficou mais claro em 2014, e Samarco e suas proprietárias, a Vale (SA:VALE5) com a anglo-australiana BHP Billiton, não tomaram medidas satisfatórias para evitar o acidente.
Ao contrário, segundo o procurador, os executivos denunciados apoiaram um processo de aumento da produção na região, que teria colaborado com o rompimento da barragem de Fundão, mesmo sabendo do problema. Em sua avaliação, a empresa buscava lucro em meio aos baixos preços globais do minério.
"O que nós tivemos foi o sequestro de uma política mais responsável de segurança da barragem por uma busca incessante por lucro", afirmou Sampaio, ao participar de uma coletiva de imprensa sobre a denúncia, em Belo Horizonte.
As ações preferenciais (PN) da Vale fecharam com alta de 4,43 por cento. Mais cedo nesta quinta-feira, a mineradora publicou um aumento da produção acima das expectativas dos analistas de mercado.
O MPF afirmou ainda que as investigações do caso identificaram documento interno da Samarco que previa, em caso de rompimento da barragem, a possibilidade de provocar até 20 mortes, dano ambiental e paralisação das atividades da empresa por até dois anos.
O documento ajudou a embasar a denúncia de homicídio qualificado com dolo eventual, quando se assume o risco de cometer o crime, disse o MPF.
Dentre os denunciados estão o ex-presidente da Samarco, Ricardo Vescovi, o diretor de Operações e Infraestrutura da empresa, Kleber Luiz Terra, além de três gerentes operacionais da mineradora.
Também foram denunciados 11 integrantes do Conselho da Samarco, incluindo representantes da Vale, como o diretor de ferrosos Peter Poppinga, e representantes da BHP Billiton.
Executivos também foram acusados pelos crimes de inundação, desabamento e lesões corporais graves, todos com dolo eventual. Além disso, foram denunciadas por crime ambiental.
Caso as denúncias sejam aceitas pela Justiça, os acusados podem ir a júri popular e ser condenados a até 54 anos de prisão, além do pagamento de multa, de reparação dos danos ao meio ambiente e daqueles causados às vítimas da tragédia, segundo explicou o MPF.
As três mineradoras vão responder por nove tipos de crimes contra o meio ambiente, que envolvem crimes contra a fauna, a flora, crime de poluição, contra o ordenamento urbano e patrimônio cultural.
A Vale e a Samarco ainda foram acusadas de três crimes contra a administração ambiental.
A empresa de engenharia VogBR e o engenheiro sênior da empresa, Samuel Santana Paes Loures, estão sendo acusados por apresentação de laudo ambiental falso. Loures não está entre os acusados de homicídio, assim como as quatro empresas.
O MPF informou que pediu a reparação dos danos causados às vítimas e informou que o valor deverá ser apurado durante a instrução processual e arbitrado pela Justiça.
As empresas chegaram a fechar um acordo com a União e Estados de Minas Gerais e Espírito Santo, cuja homologação foi cancelada pela Justiça, que manteve uma ação que cobra 20,2 bilhões de reais das empresas para reparações e compensações.
Vale, BHP e Samarco rejeitaram a denúncia.
"A Samarco refuta a denúncia do Ministério Público Federal, que desconsiderou as defesas e depoimentos apresentados ao longo das investigações iniciadas logo após o rompimento da barragem de Fundão e que comprovam que a empresa não tinha qualquer conhecimento prévio de riscos à sua estrutura", afirmou a companhia em uma nota enviada por e-mail.
A denúncia acontece em um momento em que a Samarco tenta voltar a operar. A empresa teve que interromper suas atividades após o desastre, por não ter mais onde depositar os rejeitos. Nesta semana, um diretor da Vale disse acreditar no retorno das operações da Samarco até meados de 2017.
A Vale e a BHP Billiton também afirmaram que adotarão as medidas cabíveis perante o Poder Judiciário para comprovar sua inocência e de seus executivos e empregados.
A Vale declarou que "repudia veementemente a denúncia apresentada" e afirmou que o MPF optou "por desprezar as inúmeras provas apresentadas... os depoimentos prestados em quase um ano de investigação, que evidenciaram a inexistência de qualquer conhecimento prévio de riscos reais à barragem de Fundão pela Vale por seus executivos e empregados".
A empresa declarou que "acredita, serenamente, que a verdade e a sensatez irão prevalecer, fazendo-se a devida Justiça".
A BHP Billiton Brasil disse que rejeita integralmente as acusações contra a companhia e os indivíduos citados. "Nós iremos rebater as acusações contra a empresa, e apoiar amplamente a defesa de cada um dos indivíduos afetados", afirmou.
(Por Marta Nogueira, no Rio de Janeiro)