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Preço spot de energia deve ficar baixo em 2023; La Niña e PIB são incógnitas

Publicado 06.09.2022, 15:50
Atualizado 06.09.2022, 15:56
© Reuters. Vista de Itaipu

Por Letícia Fucuchima

SÃO PAULO (Reuters) - Os preços da energia elétrica no mercado brasileiro de curto prazo devem se situar em patamares baixos em 2023, segundo previsões de comercializadoras e especialistas do setor elétrico, que enxergam por ora um período úmido com chuvas próximas da normalidade, reservatórios em níveis confortáveis e baixo crescimento da carga por questões econômicas.

Os agentes também destacam que três ajustes nos modelos computacionais que calculam o Preço de Liquidação das Diferenças (PLD) --referência do mercado spot de energia-- podem ter impacto relevante no comportamento das cotações a depender das condições hidrológicas, que afetam a geração das usinas hidrelétricas, principal fonte da matriz brasileira.

Após um período de severa escassez de chuvas entre 2020 e 2021, o pior dos últimos 90 anos, que levantou preocupações com racionamento de energia, o Brasil vive uma situação bem mais confortável em 2022, com reservatórios das hidrelétricas atingindo os melhores níveis dos últimos dez anos.

Por ora, a expectativa no setor elétrico é de que o próximo período úmido não atrase, trazendo nos últimos meses deste ano chuvas perto da média histórica para as principais bacias hidrográficas.

"Os reservatórios estão muito cheios, em níveis que não víamos desde 2012... Acreditamos que outubro e novembro vão ser cruciais para ditar os preços de 2023. Se chover perto da média, aí é preço baixo em todo o ano", afirmou Gustavo Ayala, CEO da comercializadora Bolt Energy.

Pelas previsões da Bolt, no primeiro trimestre de 2023 o PLD pode atingir seu piso, que hoje é de 55,70 reais por megawatt-hora (MWh) e que será atualizado para o ano que vem.

Já se houver frustração das chuvas, o preço pode chegar a até 169 reais por MWh no período, estimou a Bolt, versus patamar mínimo atual de 55,70 reais/MWh, embora o país esteja na etapa final do chamado período seco no centro-sul.

A Electra Energy traça um cenário semelhante, com boas perspectivas para o próximo período úmido. Segundo a comercializadora, 2023 deverá começar com um nível de armazenamento acima dos 40% no Sistema Interligado Nacional (SIN), muito superior ao dos últimos anos.

"Tudo isso aponta uma tendência de preços baixos em 2023, semelhante à verificada neste ano. O cenário mais provável é que o PLD médio fique na faixa de 100 reais por MWh no ano", disse Gabriel de Oliveira, gerente de inteligência de mercado da Electra.

Nas condições atuais, a Comerc Energia também prevê um ano de preços "comportados", podendo repetir a tendência de PLD no piso verificada em praticamente todos os meses de 2022 até agora, disse Pedro Paulo Kurbhi, vice-presidente de Trading.

"Se tivermos novembro e dezembro péssimos em chuvas, isso pode se reverter. Mas o que temos hoje, de indicadores metereológicos, modelos de formação de preços e reservatórios, nossa visão é de preços muito baixos", afirmou Kurbhi.

As melhores condições dos lagos das hidrelétricas também indicam a manutenção do acionamento da bandeira tarifária verde, que isenta consumidores do mercado regulado, atendido por distribuidoras, de cobrança adicional na conta de luz. A bandeira tarifária tem se mantido verde desde abril, quando o governo deu fim à bandeira "escassez hídrica", criada durante a crise de 2021.

La Niña e ajustes no PLD

Já a estatal paranaense Copel (BVMF:CPLE6), que detém uma das maiores comercializadoras de energia do país, prefere não comentar projeções mais assertivas para os preços, por entender que o cenário ainda está carregado de incertezas.

Fillipe Soares, diretor-geral da Copel Mercado Livre (NASDAQ:MELI), destaca a incógnita sobre o cenário hidrológico, com a possibilidade de ocorrência de La Niña. O fenômeno climático, que tende a provocar seca no Sul e maiores afluências no Norte e Nordeste, poderia impor viés altista sobre os preços de 2023.

Do lado da demanda por energia, Soares ressalta incertezas relacionadas à carga, intimamente atrelada ao crescimento do PIB. "Hoje, o que está formando preço é um PIB de 1% [para 2023], e isso pode ter boas variações, inclusive para cima... Esse é um ponto de interrogação."

A partir de 2023, os modelos que formam o PLD terão ajustes em três frentes, com potencial de produzir efeitos distintos sobre a tendência de preços.

Um dos ajustes envolve o parâmetro de aversão a risco, chamado de CVar. O modelo passará a operar mais avesso a risco --isto é, dará maior peso a cenários de hidrologia ruim, como o de 2021, fazendo com o que os preços de curto prazo respondam mais rápido.

Segundo André de Oliveira, diretor da Ampere Consultoria, a ideia desse ajuste é acabar com o despacho de termelétricas fora da ordem de mérito. Esse despacho ocorre sob autorização do operador ONS para assegurar a garantia energética, independente do que indicam os modelos de operação, e geram encargos adicionais aos consumidores de energia.

"Se acontecer uma situação que ainda exija, esse despacho poderá ser acionado. Mas esse mecanismo foi calibrado para poder zerar essa situação... O preço se tornará caro por mais tempo, mas não absurdamente caro por pouco tempo, igual chegamos a ter", explicou Oliveira.

Ele aponta que a mudança na aversão a risco tem viés altista sobre os preços, assim como o ajuste na metodologia para geração de cenários de vazões.

Já outra mudança prevista para 2023 atuará no sentido contrário, impondo viés de baixa sobre os preços. Trata-se da inclusão, nos modelos do PLD, de dados sobre a micro e minigeração distribuída de energia elétrica.

Kurbhi, da Comerc, observa que o crescimento acelerado da geração distribuída, principalmente solar, passou a ser relevante para o setor elétrico e tenderá a ter impacto importante sobre a carga no futuro.

Kurbhi aponta que a "GD" tende a reduzir os preços, já que se considera maior entrada de oferta de energia nos modelos.

© Reuters. Vista de Itaipu

"Com preços na casa de 300 reais, você pode ter impacto de 80 a 100 reais, trazendo os preços para 200 reais. Quando os preços são baixos, na casa de 80, o impacto fica em torno de 20 reais", aponta.

A Ampere Consultoria calcula em seu cenário de referência que a "GD" deve causar uma diminuição de aproximadamente 60 reais por MWh no preço médio previsto para o primeiro trimestre de 2023.

 

(Por Letícia Fucuchima)

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