Com o comércio fechado e a população preocupada com o contágio do novo coronavírus no primeiro semestre do ano passado, as editoras e meios de comunicação tiveram de acelerar projetos de conteúdo digital para amenizar os prejuízos. Naquele momento, o temor de contaminação por meio de objetos fez uma série de leitores suspender o recebimento de jornal e deixar de comprar livros impressos pela internet.
Nesse cenário, parte da população aderiu às novas ferramentas disponíveis no mercado, sendo o e-book uma delas. Em alguns casos, a participação do livro digital nas receitas das editoras praticamente dobrou no ano passado, em comparação a 2019. A fatia ainda é pequena diante das vendas do livro em papel, mas o movimento foi importante para o setor.
"No começo da pandemia, havia um medo de receber livros em casa e isso provocou uma migração imediata até junho e julho", diz o diretor da Globo Livros, Mauro Palermo, que participou ontem do evento MobiEditorial, realizado pela Mobile Time, de forma online. Segundo ele, a partir do segundo semestre a população se acalmou e o movimento diminuiu um pouco. Mas o importante é que houve uma retenção. A participação dos e-books na editora subiu de algo em torno de 6%, em 2019, para 11%, no ano passado.
O mesmo ocorreu na Companhia de Letras, segundo a gerente de projetos digitais da empresa, Marina Pastore. Ela conta que o e-book foi o canal para viabilizar o lançamento de títulos que tiveram de ser adiados no impresso. Com isso, a participação dos livros digitais nas receitas subiu de 6% para 10% no primeiro semestre. Segundo a executiva, esse porcentual caiu um pouco no fim do ano por causa da alta no livro de papel.
A mudança no comportamento da população também foi verificada nos jornais. A diretora de produtos digitais do Estadão, Luciana Cardoso, conta que houve um pico de audiência entre abril e maio do ano passado e a suspensão de entrega do jornal impresso durante alguns meses. "Mas o mais interessante é que não saímos do pico. Normalmente, janeiro e fevereiro são meses mais calmos, mas conseguimos manter a taxa de crescimento elevada."
Novos negócios
Na avaliação da vice-presidente do grupo editorial Record, Roberta Machado, o avanço do e-book e a maior atenção para o audiobook têm ganhado aliados como as empresas que apostam em novos modelos de distribuição e comercialização, como a Skeelo. "Essas plataformas ganham um público enorme por democratizar a leitura", afirma a executiva, destacando que é preciso dar força a algumas iniciativas para ampliar o público leitor.
Criada em maio de 2019, a Skeelo - uma das maiores plataformas de e-books do País - viu seu número de assinantes subir de 3 milhões para 34 milhões. A empresa já distribuiu 290 milhões de livros digitais e entregou gratuitamente outros 15 milhões. Com isso, a companhia faturou em 2020 cerca de R$ 30 milhões - valor que deve chegar a R$ 100 milhões neste ano. "O País tem poucos leitores. Por isso, primeiro é preciso investir na formação de novos leitores, gerar hábito de consumo e, a partir daí, definir formas de entregar o conteúdo para ele", diz o presidente da Skeelo, Rodrigo Meinberg.
Nesse sentido, a plataforma Árvore também tem feito trabalho relevante para fomentar a leitura no médio e longo prazos. A edtech, que conta com 30 mil livros, foi beneficiada pelas aulas remota. "A gente vinha crescendo duas vezes no ano. Em 2021, crescemos cinco vezes", afirma o cofundador e presidente da plataforma Árvore, João Leal.
Na avaliação dele, a resistência das editoras com esses modelos vem se reduzindo, sobretudo após a pandemia. Hoje, diz o executivo, elas estão mais dispostas a testar formatos novos cada vez mais. A opinião é corroborada pelo diretor da Bookwire no Brasil, Marcelo Gioia. "Vivemos esse momento de resistência e construímos pontes para que as editoras viessem a entender o mercado digital."
Nova visão
Em 2017, 500 editoras não tinham nenhum conteúdo digital. No ano passado, esse retrato já era diferente. O diretor de desenvolvimento de negócios da Verisoft, Renato Marcondes, conta que em 2021 recebeu quase cem contatos de editoras querendo colocar seus conteúdos na plataforma. "Vemos que a resistência diminui conforme são criados novos modelos de comercialização. O livro físico nunca vai deixar de ser atraente, mas agora existe a interação com o digital. É uma leitura complementar que agrada a nova geração de leitores." Para ele, quem não olhar para o produto digital vai perder espaço no mercado. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.