Em junho de 1940 a Europa chegou à beira do abismo. O regime nazista tinha conquistado praticamente todos os principais países europeus, com exceção da Grã-Bretanha. A Alemanha tinha acabado de conquistar a França, que no caso, caiu de joelhos em apenas 40 dias. Na Inglaterra, Winston Churchill e RAF (Royal Air Force) lideraram a resistência ao nazismo-fascismo e foram primordiais para a virada da guerra. Naquele tempo, o povo europeu se viu no seu pior momento histórico em séculos. Esse foi o momento mais aflitivo dos últimos tempos para eles, que a partir dali lideraram uma grande virada na guerra.
Hoje, o momento europeu não é tão grave como junho de 1940, mas não deixa de ser desafiador. A guerra da Rússia com a Ucrânia veio como um furacão, gerando problemas, pobreza e custos energéticos ao povo europeu. Vale lembrar que, por dois anos, o mundo viveu uma pandemia e o Velho Mundo sofreu muito. Com uma população idosa, alguns países foram acometidos fortemente pela COVID-19.
Esses dois eventos por si só já seriam muito importantes para qualquer continente, junto ao grave problema da dívida soberana europeia. Em 2008, o Financial Times criou um termo em inglês, os PIIGS, que seriam os países: Portugal; Irlanda; Itália; Grécia e Espanha (Spain em inglês, por isso do “S” ao final), além da alusão ao animal suíno, esse grupo foi jocosamente acusado de ser problemático, ter leis brandas em relação ao sistema fiscal e, consequentemente, serem rotulados de irresponsáveis fiscalmente. Nesse mesmo período tivemos a eclosão da crise do subprime, quando todos os mercados sofreram uma grande desvalorização e o mundo entrou em grave recessão.
O que era ruim, ficou pior! Com o agravamento da crise global, esses países tiveram uma perda de receita, precisaram socorrer setores de suas economias e geraram um aumento significativo de seu déficit público. Os temores de uma grave crise europeia se intensificaram em 2011. A Grécia era pivô central de uma negociação junto a União Europeia e Bruxelas exigia garantias para salvá-la. Exigia um ajuste fiscal e, em contrapartida, obteria novas linhas de financiamento. Depois de um imbróglio longo, foram acertados os compromissos de ajustes na previdência grega, nas despesas do governo e em outras áreas e, assim, foi apagado um incêndio grego.
De 2011 para cá, o que se viu na Europa foi um agravamento dessa situação, que já era preocupante. Mesmo antes da COVID-19, o endividamento público de países não parava de inflar e atingir níveis ainda mais preocupantes. Em 2018, a dívida pública comparada ao PIB desses países atingiu altos números: Grécia 180% do PIB; Itália 132% do PIB; Portugal 128% do PIB; Bélgica 105% do PIB e Espanha 100% do PIB. Hoje, após COVID-19 e guerra na Ucrânia/Rússia, esses dados estão bem piores. Grécia já passa de 200% do PIB e Itália mais de 150%, por exemplo. Essa tendência deve continuar e esse quadro deve se agravar, se nada for feito. A crise energética vai requerer subsídios à população e isso deve ser mais um fator contra. Analistas mais céticos já falam até em repactuação da dívida pública de alguns países, que seria uma espécie de calote organizado.
Tudo isso tem algumas implicações. Podemos ver outros países do bloco se rebelando contra os países gastões. Novas saídas de outros países do bloco europeu não são descartadas, como fez a Grã-Bretanha em 2016. Uma nova crise no sistema financeiro europeu também não, bancos podem sofrer com a recessão e algum socorro pelo banco central europeu pode ser preciso. O primeiro sinal de problema já apareceu, veio do conhecido banco suíço, Credit Suisse (SIX:CSGN). A desvalorização do euro corrobora com essa tese e se realmente o ECB (Banco Central Europeu) subir os juros acima de 3% ao ano, pode ser o estopim para o agravamento desses problemas.
O mundo financeiro olha para o Velho Mundo com desconfiança, não pode ser descartado um problema maior oriundo de lá e o seu contágio com o mercado no geral. O pequeno investidor deve ter cuidado com as suas posições expostas em euro, fundos europeus e ações europeias. A Europa tem um longo caminho pela frente, que passa pela modernização de sua matriz energética, mudanças de leis no sentido de produtividade, diminuição do estado de bem-estar social e, principalmente, um grande ajuste nas contas públicas.