Atas do Fed Colocam em Dúvida a Confiança de Powell na Meta de Inflação de 2%

Publicado 24.05.2019, 08:00

O presidente do Federal Reserve, Jerome Powell, sem dúvida falou para a “multidão” na coletiva de imprensa que encerrou a reunião de política monetária neste mês, ao dizer que os formuladores da política acreditam que a inflação retornará para a meta de 2% do banco central com o tempo. Porém, vários aspectos das atas daquela reunião colocam em dúvida sua confiança de que a inflação atingirá a meta no curto prazo.

Houve pouca movimentação nos mercados, já que as atas da reunião do Comitê Federal de Mercado Aberto (FOMC, na sigla em inglês), divulgadas na quarta-feira após o atraso usual de três semanas, confirmaram os comentários de Powell. Entretanto, as atas também mostraram que “alguns” participantes expressaram sua preocupação com o fato de que “as expectativas de inflação de longo prazo podem estar abaixo de níveis consistentes com a meta de 2% do comitê ou ficar aquém desse patamar”. Os formuladores da política acreditam que as expectativas são um importante fator para determinar a inflação real.

Em suas perspectivas econômicas, o Fed afirmou que havia a expectativa de que a inflação básica, medida pelo índice de despesas de consumo pessoal, excetuando alimentos e energia, “subiria no curto prazo, mas ficaria abaixo de 2% no médio prazo”.

É difícil saber como Powell e muitos participantes associam isso à crença de que apenas fatores transitórios estão mantendo a inflação baixa. No mais, as atas seguem com a previsão da sua equipe de que a inflação dos preços de gasto com consumo pessoal ficará abaixo do núcleo em 2020 e 2021, em razão dos menores preços de energia – ou seja, bem abaixo da meta de 2%.

Mas será que esses três anos são realmente transitórios? Isso depois de vários anos de inflação abaixo de 2%, sempre por várias razões transitórias. “Diversos” participantes, na verdade, tinham algo a dizer sobre isso, de acordo com as atas. Eles comentaram:

"Se a inflação não mostrar sinais de reação nos próximos trimestres, há o risco de que as expectativas inflacionárias possam ficar ancoradas em níveis abaixo daqueles consistentes com o objetivo simétrico de 2% do comitê.”

Tal desdobramento poderia tornar mais difícil alcançar a meta de inflação de 2% de forma sustentável no longo prazo – e é por isso que os futuros dos fundos do Fed mostram uma probabilidade maior do que nunca de que o banco central norte-americano cortará as taxas de juros antes do fim deste ano, sem nem mesmo esperar para ver se a inflação continuará baixa nos próximos dois anos.

É verdade que as atas do FOMC afirmam que “alguns” participantes temiam que as pressões inflacionárias pudessem se intensificar rapidamente, exigindo uma ação firme se a economia se desenvolver como eles imaginavam. No entanto, “alguns outros participantes” acreditavam que a inflação fraca, juntamente com os ganhos salariais em linha com o crescimento da produtividade, pode indicar que a utilização de recursos não era tão alta quanto a mínima recorde na taxa de desemprego poderia supor.

Isso é um pouco mais do que os preços menores para o setor de vestuário e gestão de portfólio que Powell indicou como fatores transitórios responsáveis por manter a inflação básica reduzida. Apesar disso, de maneira geral, os formuladores da política do Fed estavam dispostos a aceitar esses dados anômalos como uma desculpa para praticar seu mantra da paciência.

James Bullard, diretor do Federal Reserve de St. Louis e integrante considerado de certa forma independente no FOMC, chegou a sugerir, na quarta-feira, que o Fed pode ter que cortar os juros mesmo com a economia indo bem, simplesmente para preservar sua credibilidade em relação à inflação.

Essa opção pode se tornar mais atraente se a inflação se recusar a reagir nos próximos meses, declarou Bullard, que é membro votante do painel neste ano. (O conselho de governadores do Fed é composto por membros votantes permanentes, incluindo o diretor do Fed de Nova York, enquanto os outros 11 chefes de bancos regionais se revezam nas posições de voto a cada dois ou três anos).

A referência à meta "simétrica” de 2% do Fed, que já se tornou rotineira, pouco contribuiu para aumentar essa credibilidade. A ideia é que o Fed toleraria uma taxa de inflação levemente acima de 2% por algum tempo, assim como tem feito com ela abaixo da meta.

A tática simétrica foi concebida originalmente para elevar um pouco as expectativas de inflação, mas 2% ainda continuam sendo um teto. É difícil imaginar que o Fed tolere uma inflação acima de 2% com a mesma paciência com que tem feito com ela abaixo desse patamar, portanto todo o exercício pouco contribuiu para aumentar a credibilidade. Justamente o contrário.

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