A segunda estimativa da Conab para a safra 2025 surpreendeu o mercado: mesmo em um ano de bienalidade negativa, a produção de café no Brasil deve alcançar 55,7 milhões de sacas, uma recuperação de 2,7% em relação ao ciclo anterior. Esse número representa a maior produção já registrada em anos de baixa bienalidade desde o início da série histórica da Conab.
A teoria tradicional indicaria que, diante de uma oferta maior, o preço recuaria. Mas o mercado reagiu ao contrário: as cotações do café arábica e robusta subiram nas bolsas de Nova York e Londres.
A pergunta inevitável é: por quê?
O preço não responde apenas à oferta – ele responde ao fluxo
Quando analisamos o fluxo do dinheiro (TRP), compreendemos que o comportamento do preço é formado muito mais pela atuação dos agentes financeiros do que pela simples equação entre oferta e demanda. E os números mostram isso claramente:
- Grandes Fundos de Investimentos voltaram às compras no mercado futuro de café há duas semanas.
- A posição líquida comprada (long) aumentou em ritmo acelerado, sinalizando confiança ou uma tese de proteção/inflacionamento.
O que está por trás desse movimento não é apenas o café – é a macrotendência de realocação de capital global, provocada por expectativas de estímulos econômicos nos EUA e por incertezas geopolíticas crescentes.
Mais café, mas menos estoque e mais dinheiro no sistema
Apesar do crescimento da produção, o estoque de passagem continua reduzido, após exportações recordes em 2024 (mais de 50,5 milhões de sacas). E mesmo com uma leve queda nos volumes exportados no primeiro trimestre de 2025, o faturamento disparou 68,9% no mesmo período – reflexo direto do aumento dos preços internacionais.
Ou seja, não falta café, mas também não há sobra. E com mais dinheiro circulando globalmente, ativos reais como o café voltam a ser vistos como reserva de valor e proteção contra inflação.
O mercado olha para além da lavoura.
O produtor observa o clima. O trader acompanha o USDA. Mas o investidor profissional analisa o S&P 500, o DAX e o Nikkei.
O café, como commodity, é hoje reflexo do sentimento de risco global. E os fundos que estão comprando agora o fazem com base em apostas muito mais amplas:
- O S&P 500 segue trabalhando em regiões de altas, principalmente depois que o presidente Donald Trump deu uma sossegada.
- O DAX alemão e o Nikkei japonês refletem tensões inflacionárias e mudanças fiscais.
- O Brasil, mesmo com safra maior, continua com estoques apertados e clima instável.
Esses elementos formam a base para o que chamamos de tendência estrutural de valorização, independentemente de variações pontuais na produção.
Café cutuca topo e desafia lógica simplista
Quem se baseia apenas em notícias sobre “clima e safra” pode se assustar: como é possível o café subir com safra recorde?
Mas quem entende de fluxo, sabe: o preço justifica tudo.
A tendência de alta está viva.
Os fundos estão posicionados.
O preço, por enquanto, continua reagindo mais ao sentimento macro do que ao volume de sacas.
Comerciante, prepare-se. A roleta continua girando.
Se por um lado o cenário é de otimismo, por outro é preciso cautela. O mesmo fluxo que empurra o preço para cima pode sair repentinamente.
Aprender a ler os sinais do mercado global – e não apenas da lavoura – será crucial para os próximos meses. O comportamento do investidor americano pode, em questão de semanas, transformar o otimismo atual em retração.
Mais do que um número, a produção estimada de 55,7 milhões de sacas em 2025 reforça a necessidade de compreender o café sob a ótica financeira. Safra não é mais o principal termômetro de preço. Fluxo e sentimento são.
Porque no mercado do café, o que justifica tudo é o preço.