Publicado originalmente em inglês em 23/03/2021
O presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, salvou o Federal Reserve dos EUA ao defenestrar o chefe do seu banco central, sem colocar um paraquedas na moeda do país.
A lira turca afundou nos mercados de câmbio internacional depois que os investidores correram para os treasuries americanos, elevando seus preços e pressionando para baixo os rendimentos.
O rendimento (yield) da nota de referência de 10 anos do Tesouro americano ultrapassou 1,7% no fim da semana passada, depois que o presidente do Fed, Jerome Powell, reiterou a nova posição do banco central de tolerar a inflação. A instituição disse ainda que daria isenção temporária para que bancos não considerassem ativos sem risco, como os treasuries, no cálculo da expiração do capital para absorção de perdas. A partir de 31 de março, os bancos mais uma vez precisarão de capital para cobrir a posse de treasuries.
Na segunda-feira, o rendimento de 10 anos ficou brevemente abaixo de 1,69% para logo voltar a 1,7%, com os investidores considerando que o dólar era uma aposta mais segura do que a lira turca. Erdogan não é economista, mas governante autocrático que faz o que lhe der na telha. E ele não estava contente com a política de juros altos aplicada por Naci Agbal, presidente do banco central retirado do cargo.
Ex-ministro da fazenda, Agbal acreditava que era necessário continuar subindo juros para não acentuar a desvalorização da lira. Tudo indica que ele estava certo.
O rendimento do título de 30 anos do tesouro americano, que havia superado 2,5% na semana passada, recuou abaixo de 2,4%.
Nesta semana, diversos membros do Comitê Federal de Mercado Aberto se pronunciarão, mas, se mantiverem a linha do Fed de tolerar a inflação para impulsionar o mercado de trabalho, provavelmente não vão inspirar confiança nos investidores de títulos públicos. É melhor ficar de olho na lira turca.
Analistas esperam que os yields continuem subindo nos EUA, com possibilidade concreta de ultrapassar 2% na nota de 10 anos.
O tesouro americano continuará sua grande política de endividamento nesta semana, com o leilão de US$ 62 bilhões em notas de sete anos na quinta-feira, após um desafortunado leilão em 25 de fevereiro, quando a fraca demanda de notas de sete anos disparou uma onda de vendas.
O Banco Central Europeu, fiel à sua palavra, elevou suas compras de títulos em cerca de 50% na semana passada, adquirindo cerca de 21 bilhões de euros em papéis governamentais e corporativos no âmbito do seu programa emergencial de compras.
Não é que os investidores precisassem de mais incentivo para recorrer à segurança dos títulos governamentais com a débâcle da campanha de vacinação na União Europeia e os novos lockdowns obscurecendo a perspectiva de recuperação econômica no bloco.
O choque turco também afetou os mercados europeus. O rendimento do bund alemão de 10 anos caiu cerca de 3 pontos-base para -0,322, antes de se recuperar para -0,310, enquanto o yield de 10 anos do título italiano encerrou em queda de quase 1 ponto-base.
A demanda por títulos soberanos é tão alta que até mesmo a Grécia conseguiu vender 2,5 bilhões de euros em títulos de 30 anos na semana passada, com um rendimento abaixo de 2%. A emissão atraiu mais de 26 bilhões de euros em ofertas de compra, seguindo o padrão de alta procura por títulos da zona.
Países maiores, como Espanha e Itália, que ainda têm yields positivos, estão atraindo mais de 100 bilhões de euros em ofertas iniciais de compra para novas emissões, graças ao programa emergencial do BCE. Analistas cogitam uma inflação nos livros de pedidos, argumentando que não mais refletem de forma precisa a real demanda.