O açúcar em NY fechou a semana cotado a 10.40 centavos de dólar por libra-peso, uma queda de 10 pontos em relação à semana anterior, ou aproximadamente US$ 2.20 por tonelada. Em reais, o açúcar fechou com R$ 20 por tonelada melhor do que a semana passada. Nada muito substancial.
Os fundos não-indexados aumentaram suas posições vendidas em 19,500 contratos e agora, pelo menos até a última terça-feira, data do relatório produzido pelo CFTC, somam 40,500 contratos vendidos, ou aproximadamente 2 milhões de toneladas de açúcar equivalentes. É apenas mais uma notícia negativa a ser digerida pelo mercado.
Dessa cumbuca indigesta faz parte o petróleo, que na sexta-feira atingiu o preço mais baixo desde novembro de 2001, chegando a negociar a 17.33 dólares por barril. Ou seja, o tão esperado acordo, prematuramente festejado por Trump, para que os produtores da OPEP+ reduzissem a oferta diária em 10 milhões de barris, não surtiu o efeito esperado.
Além do desmoronamento nos preços do petróleo, ampliado pela pandemia do coronavirus, o mercado terá que se defrontar com o consumo de combustível despencando nos Estados Unidos e a produção de etanol de milho encolhendo no exato momento em que as cotações do contrato de milho em Chicago atingem o preço mais baixo dos últimos treze anos.
O milho no Brasil, cujo mercado tem dinâmica distinta, faz o preço interno resistir o bastante para tornar inviável, no médio prazo, novos investimentos ou projetos de fabricação de etanol de milho aqui. Ou seja, aquele adicional de 2.5 bilhões de litros de etanol de milho, que o mercado esperava para este ano, está comprometido em pelo menos 600 milhões de litros.
No mesmo recipiente dessa receita para desastre, ainda fazem parte a perspectiva sombria de um encolhimento sem precedentes da economia global que pode reviver a grande depressão de 1929. No momento que escrevo este texto parece que o isolamento social no Brasil pode durar até o início de maio, o que leva a um total de 51 dias paralisados no ano. Os analistas preveem uma queda de 5.5% do PIB. Como isso vai refletir no setor sucroenergético?
A primeira estimativa da Archer para a safra 2020/2021 no Centro-Sul aponta uma produção de 596 milhões de toneladas de cana divididas entre 35.8 milhões de toneladas de açúcar e 26.2 bilhões de litros de etanol. Esse volume de cana é 2.25% acima da safra 19/20 que, segundo o último relatório da UNICA, alcançou 582,9 milhões de toneladas de cana.
Vamos produzir 7.3 milhões de toneladas de açúcar a mais do que o ano passado. Evidentemente que boa parte desse açúcar não está hedgeado e não necessariamente encontrará comprador lá fora em toda sua medida. Tudo indica que o estoque de passagem do açúcar no final desse ano será elevado comparativamente aos anos anteriores.
Queda no consumo de alimentos industrializados e bebidas, menor atividade no comércio mundial e a propensão dos consumidores finais de absorverem preliminarmente o estoque que possuem antes de originarem novas compras, devem jogar o preço do açúcar no mercado interno para baixo.
Alertamos que o volume estimado de produção de açúcar para este ano pode sofrer alterações dependendo da evolução da crise atual. Podemos ver um aumento na produção de açúcar ainda maior do que o número citado acima em detrimento ao etanol, que remunera menos, bem como, uma redução no total de cana a ser moída por algumas unidades produtoras, que podem não conseguir moer o que estava anteriormente previsto por problemas financeiros.
Para mudar esse quadro tenebroso e acinzentado para cores mais alegres, só com muito otimismo. O que vemos é que quanto mais a situação piorar no curto prazo, mas a disponibilidade de produto estará comprometida adiante. A indústria de xisto está em enormes dificuldades nos EUA após o colapso no preço do petróleo. Várias plataformas estão sendo fechadas por inviabilidade econômica. Isso deve representar o equivalente a dois milhões de barris por dia.
Depois que o tsunami global passar e a vida voltar ao seu curso normal, o que sobrou no nosso setor é uma indústria que não expandiu o que precisava, não investiu porque não sobrou caixa, não renovou porque a incerteza aumentou e terá enorme dificuldade de atender à demanda nos próximos 4 anos já antevendo que muitos participantes do mercado estarão alijados por insuficiência financeira. O coronavirus vai matar muita gente, metaforicamente falando.
Talvez no segundo semestre o mercado de etanol respire um pouco mais aliviado. Estimamos que a produção de anidro deve diminuir em cerca de 9% em relação à safra 19/20, chegando a 9 bilhões de litros. O hidratado deve responder a uma produção total de 17,172 bilhões de litros enxugando mais de 25% do volume produzido do ano passado. Vai fazer muito sentido, para as usinas que tem caixa e tancagem, armazenar o etanol para o ultimo trimestre do ano.
O setor espera que o governo consiga aprovar uma linha de crédito para a estocagem de etanol. Com isso, as usinas podem postergar a entrada do produto no mercado, aliviando a pressão de início de safra e antecipando recursos para atender as necessidades imediatas de caixa.
Ainda teremos muitos dias densos pela frente para saber a real dimensão da crise que nos desafia. Ninguém pode dizer com segurança a extensão de todos esses problemas que estamos vivendo. O mercado agoniza nas incertezas e a volatilidade reflete a insegurança de seus agentes. A ordem é ter calma e não agir por impulso. Fazer conta ajuda muito. Lembro-me da frase de um executivo do mercado, muito pertinente para o atual momento, “ninguém precisa ter pressa para fazer um mau negócio”.