Geopolítica das criptomoedas: Novos ativos são disputa no século XXI

Publicado 14.05.2025, 13:30

Historicamente, o controle da emissão monetária esteve no centro da soberania estatal. Dado que as políticas monetárias são, via Teoria Moderna (NASDAQ:MRNA) Monetária (MMT na sigla em  inglês), uma das maiores vias de intervenção política. 

No entanto, com a ascensão do Bitcoin e a expansão dos criptoativos, um novo eixo de  poder está emergindo, baseado não apenas em território, mas em protocolos, redes  distribuídas e normas criptográficas.  

Soberania monetária em xeque

As criptomoedas descentralizadas desafiam diretamente o monopólio estatal da política  monetária.  

O Bitcoin, por exemplo, não está vinculado a nenhum banco central e opera segundo um  código imutável, cujos parâmetros (como o halving e o supply máximo) não podem ser  manipulados por nenhum agente econômico isolado.  

Para países que, historicamente, utilizaram a desvalorização cambial como instrumento de  ajuste macroeconômico, esse modelo representa um antagonismo estrutural à sua  soberania.

Estados com moedas frágeis ou regimes autoritários tendem a restringir mais fortemente o  uso de criptomoedas, não apenas por receios fiscais, mas por considerações de poder.  

Em contraste, democracias liberais e economias tecnologicamente avançadas apresentam  maior abertura institucional ao uso de criptoativos; especialmente quando percebem  nesses ativos uma possível vantagem estratégica frente a rivais políticos e econômicos. 

EUA x China

Os Estados Unidos lideram, até o momento, a infraestrutura crítica do ecossistema cripto:  empresas como Coinbase (NASDAQ:COIN), Circle e Chainalysis, além de centros de liquidez e custódia,  estão fortemente concentrados no território norte-americano.  

Isso garante aos EUA influência indireta sobre fluxos globais de criptoativos, além de  permitir o monitoramento de transações via parcerias com plataformas para conhecer o  consumidor (KYC) e processos anti-lavagem de dinheiro (AML). 

Além disso, Trump vem considerando a criação de uma “reserva estratégica de Bitcoin”, nos  moldes das reservas de ouro e petróleo, para usar BTC como escudo contra riscos  geopolíticos — uma tendência que se espelha na adoção oficial pelo governo de El Salvador.  

Na outra ponta, a China segue uma estratégia que visa não coibir o seu poder de intervenção  econômica. Por lá, foi proibida a mineração de Bitcoin (2021) e banidas corretoras de  criptoativos locais para manter firme o controle monetário, enquanto acelera a adoção do  yuan digital (e-CNY), sua moeda digital de banco central (CBDC). 

Ao posicionar sua CBDC como instrumento de pagamentos programáveis e rastreáveis, a  China almeja desafiar a supremacia do dólar em acordos internacionais, sobretudo com  países do Sul Global. 

Brasil

No caso do Brasil, o foco atual está no Drex, a moeda digital de banco central (CBDC)  desenvolvida pelo Banco Central como uma versão eletrônica do real. A implementação do  Drex está em fase de testes controlados com instituições financeiras e empresas, dentro de  um sandbox regulatório. 

Seu principal objetivo, em teoria, é aumentar a eficiência do sistema financeiro (reduzindo  custos, aumentando a velocidade de liquidação e aumentando o controle do BCB) , ao  mesmo tempo em que mantém a estabilidade e a soberania monetária. 

Cabe salientar que há um receio de que a aceitação de uma CBDC em larga escala possa  afetar a demanda por moedas privadas e stablecoins, deslocando parte do mercado de  criptoativos. 

Paralelamente ao desenvolvimento do Drex, o governo e os órgãos reguladores brasileiros  estão finalizando novas regras de compliance e regulamentações contra lavagem de  dinheiro no setor de cripto. 

Criptomoedas como ferramentas de resistência estatal

Países sob sanções econômicas, como Irã, Rússia e Venezuela, têm buscado formas  alternativas de transacionar valor em escala internacional; muitas vezes utilizando  criptomoedas como forma de escapar do sistema bancário tradicional.  

O Bitcoin torna-se, assim, um instrumento de política externa e uma forma de bypass  financeiro diante do cerco ocidental baseado em SWIFT, OFAC e reservas em dólar; o que é  comandado pelos Estados Unidos, de forma geral. 

Embora as blockchains públicas ofereçam pseudonimato, o rastreamento por análise  forense digital é possível e crescente, o que é feito por empresas como a Chainalysis. 

Ainda assim, stablecoins como USDT e USDC vêm sendo utilizadas em mercados paralelos  em diversos países em crise, inclusive com maior adoção prática do que suas próprias  moedas nacionais. 

Mineração e Energia

A mineração de criptomoedas, especialmente no caso do Bitcoin, é um tema geopolítico à  parte. O consumo energético da rede, muitas vezes criticado, revela, na verdade, uma  realocação de poder econômico para regiões com excedente energético ou energia barata  (como o Cazaquistão, a Rússia ou certos estados norte-americanos). 

O mapa da mineração global é dinâmico e responde tanto a incentivos econômicos quanto  a mudanças regulatórias abruptas. 

A saída da China em 2021 demonstrou como uma política coordenada pode desestabilizar  um setor inteiro, mas também como a natureza aberta e distribuída do Bitcoin o torna  resiliente a esse tipo de intervenção. 

Regulação e Compliance

A geopolítica das criptomoedas não se dá apenas no campo da tecnologia, mas também no  domínio da normatividade internacional. Órgãos como o GAFI (FATF) impõem diretrizes de  combate à lavagem de dinheiro que afetam diretamente a forma como criptoativos são  regulamentados em todo o mundo.  

Nesse cenário, os países buscam estabelecer padrões regulatórios próprios que equilibrem  inovação, segurança jurídica e competitividade global. 

Os Estados Unidos, por exemplo, oscilam entre proteger sua liderança em inovação e impor  um controle fiscal estrito. Já a União Europeia aposta em estruturas abrangentes como o  MiCA para estabelecer um padrão regulatório unificado. O Brasil, por sua vez, avança em  uma abordagem pragmática, com a inclusão dos Provedor de Serviços de Ativos Virtuais (VASPs, na sigla em inglês) no sistema regulado pelo Banco Central. 

Considerações finais 

A ascensão dos criptoativos redefine o conceito clássico de soberania monetária,  deslocando parte do poder do Estado para ecossistemas descentralizados alicerçados em  código e criptografia. Essa nova dinâmica coloca nações, principalmente as de moedas  frágeis e regimes autoritários, em posição de alerta.

As principais potências econômicas, EUA e China, elaboram estratégias opostas da tutela  estrita ao dólar digital e à reserva estratégica de Bitcoin até a implementação em larga  escala de moedas digitais de bancos centrais.  

Já o Brasil, focado na implantação do Drex e no aperfeiçoamento regulatório, avança de  forma cambaleante.  

Dito isso, a utilização, principalmente de Bitcoin (BTC) e stablecoins (e.g. USDT e USDC),  está em nível crescente e sem sinais de desaceleração.  

Então, o impacto será cada vez maior na capacidade interventícia dos governos. Cabendo a  eles entenderem e aprenderem a lidar ou ver seu poder ruir no sistema geopolítico com a  adição do novo ponto estrutural que é os criptoativos.

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