Pouco comentado, mas representando um risco consistente ao país, o cambial por seus números e concentração vem se agravando na medida em que se constata que “o lençol que dispomos é curto” no caso de agravamento de recuo acentuado de fluxos de recursos externos para o país e em contraposição se eleve a propensão à saída efetiva , tendência que poderia ser fortemente influenciada pela eventual perda de grau de investimento.
As reservas cambiais do país parecem ter perdido a característica protetora ante o crescimento expressivo do passivo cambial do país.
Em matérias recentes divulgadas pelo jornal Valor Econômico, de autoria do economista e consultor Silvio Figer, e pelo jornal Folha de São Paulo compilada pela jornalista Érica Fraga, o tema foi muito bem abordado.
Silvio Figer afirma:
“Para um país que não emite um meio de pagamento internacional, como é o caso do Brasil, o parâmetro de avaliação do risco é o volume de suas reservas cambiais – as nossas, em US$ 375,0 Bi são consideradas nosso ponto forte. Mas por que critério? Por representar 19 meses de nossas importações? Isto seria um critério para uma economia que gera saldos positivos em seu balanço em conta-corrente. Mas que defesa isto representa para uma economia que, há sete anos ininterruptos, gera déficit em conta-corrente em escala crescente, dos US$ 28,0 Bi de 2008 aos atuais US$ 90,0 Bi? Isto indica que as reservas deveriam ser defesa suficiente para, além das importações, o fluxo de capitais que, registrado no balanço de capitais, cobre o déficit do balanço em conta-corrente, sustentando a economia brasileira.
E do balanço de capitais destacam-se, do ponto de vista do risco cambial, duas contas do passivo cambial, por serem exigíveis de imediato: 1- Investimento estrangeiro (IE) em renda fixa US$ 287,3 Bi e 2 IE em ações US$ 259,2 Bi. Total US$ 546,5 Bi. A este valor adicione-se o risco de US$ 207,0 Bi de empréstimos intercompanhia (o triplo de dezembro de 2008), que sendo exigíveis por uma mera decisão da matriz estrangeira, leva o risco cambial imediato para US$ 753,5 Bi ou o dobro das nossas reservas.
Resta a considerar nossa divida externa bruta (DEB), que, excluídos os empréstimos intercompanhia (já considerados acima) soma US$ 333,0 Bi (set 2014). A DEB, sendo administrada por rolagem, e não por pagamento, carrega um risco clássico: uns poucos vencimentos não rolados – seja por rebaixamento do grau de crédito do Brasil, seja por aperto de liquidez nos mercados internacionais – pode criar um ciclo vicioso de resgates. E dentro da DEB, encontra-se a delicada rubrica bancos, que além de contabilizar o expressivo valor de US$ 146,0 Bi (40% das reservas), também chama a atenção por seu ritmo de crescimento: dobrou em apenas seis anos.
Então, somando-se o risco cambial imediato ao risco cambial de rolagem temos US$ 1,1 Tri ou o triplo das reservas – uma alavancagem temerária. Não fosse isto suficiente temos ainda as operações de swaps cambiais de US$ 100,0 Bi, adotadas pelo BC para evitar um desvalorização aguda, pela flutuação do câmbio, ou a queima de reservas. E ai a conta arredonda em US$ 1,2 Tri”
Na matéria de Érica Fraga o destaque tem foco direto na divida externa privada que dobrou entre o terceiro trimestre de 2009 e o mesmo período de 2014 atingindo US$ 208,0 Bi, maior valor da série do BC, iniciada em 1989. E destaca a pressão que vencimentos da ordem de US$ 102,5 Bi a serem pagas este ano, com quase 90% desses vencimentos sendo do setor privado poderão colocar sobre o preço do dólar neste ano.
De nossa parte temos enfatizado que o setor externo poderá acarretar grande desconforto ao governo e comprometer algumas metas como as inflacionárias e exigência de maior aumento da SELIC no primeiro momento, e promover grande dificuldade de gestão do problema do câmbio pelo BC.
Quanto mais se elevam as perspectivas que possam sugerir que o país não alcançará a meta de superávit fiscal de 1,2% acentuando o risco de perda do grau de investimento ou mesmo ocorra evidência de que haverá problemas de natureza política para apoio as medidas adotadas pela nova equipe gestora da economia, com o crescimento das incertezas crescerá a demanda por proteção (hedge).
Como é observável na abordagem mais ampla do economista Silvio Figer e mais restrita da jornalista Érica Fraga, os números do risco cambial é dantesco, tornando o volume de contratos de “swaps cambiais” na condição de irrisório, mas deixando uma evidência inconteste:
NÃO HÁ COMO O BC INTERROMPER A ROLAGEM DO ATUAL ESTOQUE DE CONTRATOS DE SWAPS CAMBIAIS QUE TEM NO MERCADO E PROVAVELMENTE SERÁ PRESSIONADO A AUMENTÁ-LO, O QUE TRARÁ DESCONFORTO A AUTORIDADE MONETÁRIA.
Eventual interrupção teria que ser trocada por outra alternativa de proteção, caso contrário o preço da moeda americana, que já está repercutindo o fato da oferta de contratos de swaps cambiais estar menor do que a demanda, sofrerá fortíssima apreciação.
O “corner” é que o risco cambial está acentuado e o país não tem condições de aumentar suas reservas cambiais, muito pelo contrário, corre sério risco de redução gradual, até porque os bancos num cenário de aumento forte de demanda no mercado à vista não terão condições de ancorar toda a liquidez com crescentes saldos de posições vendidas.
Portanto, é imperativo que o governo procure desenvolver uma nova estratégia de proteção à variação cambial, para que a deterioração não atinja o câmbio de forma contundente.
O governo tem com o que se preocupar no câmbio e muito!