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Por que Diabos Você Usa O Desvio-Padrão Como Medida Primária de Risco?

Publicado 28.05.2021, 06:20
Atualizado 11.10.2023, 23:02

Olá, Pessoal. Você consegue responder a pergunta acima? Ou você para e reflete que jamais pensou a respeito e simplesmente usa o desvio-padrão porque “todo mundo usa”? Esse artigo, então, é para você.

Eu preciso iniciar falando da média e da sua relação com o valor esperado de uma variável aleatória (como por exemplo o retorno de uma ação no dia seguinte). Matematicamente, a média e o valor esperado são calculados da mesma forma. Entretanto, falamos em média quando nos referimos a algo que já aconteceu, enquanto falamos em valor esperado ao nos referirmos a uma variável aleatória que virá a acontecer. Por exemplo, falamos que a média de gols do Gabigol é de 0,77 gols por jogo pelo Flamengo porque ele, no passado, marcou 85 gols num total de 110 jogos e 85 divididos por 110 dá 0,77. Mas, no contexto de investimentos, falamos que o retorno esperado daquela ação é de 15% ao ano nos referindo à sua expectativa futura de rentabilidade.

E o que a média tem de valor esperado? Para explicar isso, considerarei o lançamento de um dado. Trata-se de um evento aleatório, pois há incerteza e aleatoriedade quanto ao resultado. Temos seis resultados possíveis, todos com a mesma chance: 1, 2, 3, 4, 5 e 6. A média é calculada somando-se esses seis resultados possíveis e dividindo por seis: 21 / 6 = 3,5. O que realmente significa dizer que o valor esperado ao se lançar um dado é 3,5?

Obviamente, ninguém espera que o resultado será 3,5 porque simplesmente esse resultado não é possível. A resposta e o que dá relevância ao valor esperado nascem da lei dos grandes números. Essa lei diz que ao se repetir um determinado evento aleatório por muitas e muitas vezes, a média de resultados passados tende para o tal valor esperado. Em outras palavras, quanto mais vezes você lançar um dado, ao calcular a média dos resultados, esse valor mais se aproximará de 3,5: pode ter certeza. Pronto, agora os conceitos de média e valor esperado passam a estar ligados de forma bastante objetiva.

Apliquemos o conceito em Finanças: quando falamos que o retorno mensal esperado de uma ação é 1%, queremos dizer que se obtivermos os retornos daquela ação por diversos meses, a média dos resultados tenderá a 1%. Observe que não significa dizer que esperamos que o retorno dessa ação no próximo mês seja 1% assim como JAMAIS esperamos que o próximo resultado do dado será 3,5. No caso do dado, 3,5 é um resultado impossível. Já no caso da ação, eu diria que 1% é um resultado bastante improvável, concorda? Isso porque há MUITO mais chances de um retorno diferente de 1% se realizar do que um retorno precisamente igual a 1%. E é exatamente neste momento que entra o conceito de risco!

O conceito de risco está intimamente ligado ao conceito de incerteza. Não existe risco se não houver incerteza. Diga-se que o conceito de risco (que é abstrato) pode ser definido, matematicamente (ou seja, concretamente), de muitas formas diferentes, a depender do seu objetivo. Por exemplo, podemos falar de drawdown, expected shortfall ou de VAR (não o do futebol, mas o que significa “Value at Risk”). Mas, a medida primária de risco utilizada no mercado é, indubitavelmente, o desvio-padrão.

Antes de tudo, deixo claro que não tenho absolutamente nada contra o desvio-padrão. Ele é uma belíssima medida estatística de incerteza e tem diversas aplicações interessantíssimas, tal como na construção de intervalos de confiança e em testes de hipóteses. Mesmo em Finanças, o desvio-padrão tem aplicações interessantes e não me furtarei a dar uma delas no contexto do nosso exemplo da ação de retorno médio mensal igual a 1%: imaginemos que esse retorno mensal tenha distribuição normal. Então, podemos concluir que o retorno dessa ação no próximo mês ficará distante de no máximo um desvio-padrão do valor esperado de 1% com 68,3% de probabilidade. Posso também concluir que o desvio do retorno realizado em relação a 1% não será maior que dois desvios-padrão com 95,5% de probabilidades. Note que essas informações são relevantes e dizem respeito ao risco do investimento, mas estão centradas na premissa da distribuição ser normal.

MAS ENTÃO QUAL É O PROBLEMA DO DESVIO-PADRÃO ENQUANTO MEDIDA DE RISCO?

O grande problema do desvio-padrão em Finanças e Investimentos é que ele é utilizado e interpretado equivocadamente por grande parte do mercado. Voltemos ao ponto onde paramos para falar de risco, com os exemplos do dado e da ação com valor esperado de retorno mensal igual a 1%. Vimos que o valor esperado pode ser impossível, como no caso do dado, ou improvável, como no caso da ação. E, então, a pergunta que naturalmente fazemos é:

JÁ QUE DEVEMOS ESPERAR POR UM DESVIO EM RELAÇÃO AO VALOR ESPERADO, QUAL O VALOR ESPERADO DESSE DESVIO?

Em outras palavras, se o evento aleatório se repetir por diversas vezes, em média, sob qual distância estaremos do valor esperado para essa variável aleatória? Essa é a pergunta que o investidor realmente tem em mente quando muitas vezes olha o desvio-padrão de um investimento. E, naturalmente, tal pergunta dá origem a uma medida de risco. E essa medida NÃO é o desvio-padrão. De acordo com a lei dos grandes números, essa medida de risco é o desvio médio absoluto! Veja o quadro abaixo.

Pare e pense: ao jogar um dado, qual medida de incerteza faz mais sentido para os nossos objetivos? Claramente, o desvio médio absoluto. Primeiramente, e de forma até intuitiva, ele representa melhor a incerteza ao lançar um dado: 1,5 é a média dentre os três possíveis desvios que podem ocorrer com a mesma chance: 0,5; 1,5 e 2,5. E, segundo, porque pela lei dos grandes números, ao lançar o dado por diversas vezes, o desvio médio tenderá realmente para 1,5. O ponto que ressalto aqui é que, mentalmente, as pessoas acham que o desvio-padrão possui as propriedades do desvio absoluto médio e isso não é verdade.

No caso da distribuição normal, o desvio-padrão superestima o desvio absoluto médio em 25% (o que não é pouco). Em distribuições tais como observadas com retornos de ações por exemplo, esse erro pode ser ainda maior. Se você ainda não se convenceu, vamos a outro exemplo extremo, mas útil para eu mostrar claramente o que quero dizer. Suponha uma variável aleatória que pode assumir qualquer valor dentre {0, 0, 0, 0, 0, 0, 0, 0, 0, 10}, ou seja, nove zeros e um dez. Seu valor esperado é 10 dividido por 10, ou seja, um. Os desvios absolutos possíveis em relação a esse valor esperado são {1, 1, 1, 1, 1, 1, 1, 1, 1, 9}, de forma que, em média, o resultado se desviará do valor esperado em 1,8 (18 dividido por 10). O desvio-padrão dessa distribuição é igual a 3, uma superestimação de 67%. Nesse mesmo exemplo, se tivermos 100 resultados possíveis, sendo 99 zeros e o valor 100, o desvio absoluto médio é praticamente 2, enquanto o desvio-padrão é muito próximo de 10 (note que 10 é a raiz quadrada de 100). Se tivermos mil resultados possíveis, sendo 999 zeros e o valor 1.000, teremos o desvio absoluto médio ainda igual a 2, com o desvio-padrão aumentando para 31,6 (que, não por acaso, é a raiz quadrada de 1.000).

Caso você pare para analisar essa distribuição de (10^n – 1) zeros e o valor 10^n, verá que a média é sempre igual a um e o desvio absoluto médio rapidamente chega a 2 com n a partir de 2 e permanecerá igual a 2 simplesmente porque a média dos desvios tenderá realmente para 2. Caso você use o desvio-padrão, notará que esse não possui limite e tenderá a infinito, de acordo com a raiz quadrada de 10 elevado a n, o que claramente é uma distorção.

Ressalto que não estou dizendo que o desvio-padrão não faz sentido. Faz sim, pois além das aplicações que citei acima, ele serve para mostrar caudas gordas em distribuições probabilísticas. Quanto maior a distância do desvio-padrão para o desvio absoluto médio, mais gordas são as caudas, o que indica eventos extremos com mais chances. Isso é também importante para o investidor. Mas não responde àquilo que realmente o investidor deseja saber. Não responde à pergunta primária que o investidor tem em mente. E o que mais me chama a atenção é que investidores mais sofisticados olham o desvio-padrão como expectativa de desvio e a curtose como indicativo de caudas gordas. Na realidade, o desvio absoluto médio deveria ser a medida primária de risco (pois é a expectativa de desvio da média) e o desvio-padrão deveria ser a medida primária de caudas gordas. Note que a curtose não deixa de ser muitíssimo semelhante ao desvio-padrão, só que em vez de ser utilizado o quadrado, utiliza-se a quarta potência. Em resumo, o desvio-padrão não deixa de ser um indicador de incerteza, mas não deveria ser a medida primária de risco e sim a medida primária para eventos extremos (em paralelo com as outras medidas citadas: drawdown, expcted shortfall e VaR).

Por diversas vezes, já perguntei a profissionais do setor o que representaria o desvio-padrão, obtendo muitas respostas que caem sempre na interpretação de que ele representa o erro médio em relação à média, o que não é verdade. Para medir o que realmente queremos, o desvio médio é a resposta certa!

Podemos ir um pouco além e falar em desvio médio à direita e à esquerda da média ou de qualquer outro benchmark de retorno para separar o risco bom (de ganhos acima do benchmark) do risco ruim (de perdas). O risco verdadeiramente ruim é o segundo, ao passo que amamos e até pagamos pelo primeiro! A separação do risco bom do ruim aliada à utilização do desvio médio absoluto como medida de risco deu origem ao Índice Campani, métrica de análise de performance de fundos e investimentos em geral que eu desenvolvi. Para saber mais, leia aqui.

Hoje o artigo ficou um pouco longo, mas ele foi importante para dividir com vocês tudo o que queria. Espero que o conhecimento os ajude a investir cada vez melhor. E a obter melhores retornos, com análises mais adequadas.

Deixo o convite para me seguir nas redes sociais: @carlosheitorcampani.

 

* Carlos Heitor Campani é PhD em Finanças, Professor Pesquisador do Coppead/UFRJ e especialista em investimentos, previdência e finanças pessoais, corporativas e públicas. Ele pode ser encontrado em www.carlosheitorcampani.com e nas redes sociais: @carlosheitorcampani. Esta coluna sai a cada duas semanas, sempre na sexta-feira.

Últimos comentários

Ótimo texto. Não te conhecia, mas gostei dos seus artigos. Vou ler (quase) todos.
O desvio padrão não seria a raiz da variância? e a variância a média dos desvios AO QUADRADO? Assim, o desvio padrão dessa amostra de 100 resultados seria próximo de 1 e não de 10 como foi falado no artigo.
Carlos, muito bom o texto.  Realmente não é algo fácil de assimilar, mas você deixou isso bem claro no seu texto.   O mercado financeiro nada é fácil, principalmente se tratando de operações de renda variável, suas observações são importantíssimas e com certeza, não será num artigo que iremos compreender melhor todas essas nuances que envolvem a estatística e outras matérias correlatas, mas é certo que os mais interessados, irão buscar estudar melhor para tentar compreender melhor tudo que escreveu.   Obrigado por esse "pontapé" inicial, somos eternos "leigos", sempre buscando aprender, grande abs.
Fabio, muito obrigado pelas palavras. Sua análise foi bastante precisa e rigorosa. Concordo e tenho essa mesma compreensão.
O desvio padrão é usado em vez do absoluto médio por uma propriedade matemática esquecida: o valor absoluto não possui detivada em todos os pontos e a função quadratica possui. Assim é mais fácil otimizar funções quadraticas que funções módulo. Antes da programação linear só era possível otimizar desvios se fosse o padrão. Com o absoluto médio não dava. Hoje não faz mais sentido, mas o hábito ficou. Bom, outra coisa é que as distribuições nunca são normais.
Perfeito meu amigo. Você deu a razão matemática, que eu também conhecia. Muito obrigado por este adendo importantíssimo.
Atenção !! >>>> Neste site você não pode prevenir os desavisados pois isso causa censura e tu pode ser bloqueado !
Um monte de abobrinha que deixa os "experts",  extasiados !! O Cassinão não tem fiscalização para idiotices então tu pode jogar à vontade e pode ganhar um pouco ou perder muito !! E isso ocorre com a maioria que fica fazendo muito cálculo e não considera a manipulação dos grupos dominantes e dos eventos causados por notícias manipulativas e indutivas além dos robots que alavancam essas manipulações quando programados para tal ação nas operações !!!   rsrsrsrsrsrsrs
Excellent ‼️ ‼️ ‼️Há muito tempo deixei de lado o DP para utilizar o DM como referência em set points for dos meus EA justamente porque o DP gera uma expectativa falsa que só ocorre em situações extremas de elevada volatilidade enquanto o DM reflete com muito maior acertividade e nível de confiança as oscilações do mercado 🛒 não apenas reduzindo os riscos como também aumentando os ganhos 🤑 🤑 🤑
Excelente texto!
Não parece correto pensando numa distribuição gaussiana das probabilidades.
Distribuição gaussiana normal simétrica é utópico em finanças
Distribuição gaussiana não funciona, ou pelo menos é não-confiável no mercado financeiro.
Olá meu amigo, obrigado por participar e comentar. Se você me permitir, tenho dois pontos discordantes: 1) O que escrevi no artigo é correto independentemente da distribuição. O valor esperado do desvio absoluto não é o desvio-padrão em nenhuma distribuição (mesmo na gaussiana). O que ocorre é que na gaussiana, entendemos melhor o que o desvio-padrão nos entrega (intervalos de confiança, por exemplo), e isso eu também incluí no artigo. 2) Como os amigos já colocaram, em última instância, os retornos do mercado financeiro não seguem a curva de Gauss. Forte abraço.
Muito técnico. O investidor leigo ou iniciante fica boiando.
Muito didático! No início o autor já alerta que o tema não é para iniciantes.Para os mais experientes ele se fez entender muito bem!
não compreendi foi a expressão "investidor leigo"
Olá Natalicio, eu sempre procuro escrever de forma didática. Mas realmente este texto é mais difícil e, mesmo assim, ele ficou bem longo. Minha sugestão para você é seguir lendo e aprendendo: com o tempo você passará a entender textos mais complexos. Esse é o caminho. Forte e respeitoso abraço.
artigo interessante, conteúdo minimamente explicado, parabéns Carlos!
artigo interessante, conteúdo minimamente explicado, parabéns Carlos!
não é pedagogico em seu artigo e mto confuso a interpetracao e raciocinio
não é pedagogico em seu artigo e mto confuso a interpetracao e raciocinio
excelente artigo, já cheguei a usar o DP como métrica de investimento e abandonei, porque os fatores psicológicos acabam afetando fortemente as ações, bem como a manipulação por meios digitais supervisionados. Então a matemática é derrotada pós fundamentos não exatos e que dividem as sardinhas dos tubarões, onde o tempo é o senhor supremo da verdade...
Cada um usa o que melhor lhe atende…
Concordo! E usa aquilo que melhor atende a seus objetivos. Para isso, é fundamental saber as propriedades matemáticas das métricas para não usar uma "banana achando que é maçã", entende? Como disse no artigo, o desvio-padrão tem sua importância também. Obrigado por comentar por aqui meu amigo.
Muito bom!!!
Muito bom!!!
Excelente. Realmente é um erro muito comum que devemos nos atentar, muito boa leitura!
Artigo maravilhoso. Em estatistica, o mais importante é saber usar a ferranenta correta.
Maravilha de artigo, vou implementar nas minhas análises de acompanhamento de carteira! Obrigado Campani.
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