Esta é a quarta análise da Série Especial: Juros neutros e próximos passos da política monetária do Copom
Na última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), ocorrida em 3 e 4 de agosto, o IPCA realizado em 12 meses (fechado em julho) estava em 8,99% e sua mediana prevista no Focus para 2022 era 3,81%, apesar de as metas de inflação para os anos-calendários de 2021 e de 2022 serem 3,75% e 3,5%, respectivamente.
Esse descolamento per se mostra a dificuldade para enquadrar a inflação no curto prazo e relativa desancoragem no médio prazo.
O referido descolamento evidencia também que a comunicação e a dosagem da política monetária não estão conseguindo êxito em levar as expectativas para o centro da meta de inflação. Outra forma de inferir a dificuldade de o Banco Central enquadrar as expectativas inflacionárias é analisar o descolamento entre a expectativa da taxa real de juros em 12 meses – calculada por meio do desconto da mediana do IPCA no Focus para os próximos 12 meses do SWAP pré-DI 360 – e a taxa real de juros de 12 meses realizada – SELIC acumulada em 12 meses descontada do IPCA realizado em 12 meses, conforme se observa no Gráfico 1.
Diante desses descolamentos, havia evidente necessidade de uma ação hawkish do BC na última reunião do Copom, induzindo a um fechamento das curvas expostas no Gráfico 1, tal qual ocorria até agosto de 2020, período em que foi iniciada a aludida desancoragem. Com isso, foi bastante apropriada a sinalização de o Copom promover um “ciclo de elevação da taxa de juros para patamar acima do neutro”. Com isso, o BC indicou que deseja conter a demanda para frear a inflação, pois a taxa de juros neutra é aquela que nem estimula nem desestimula a economia.
Atualmente, estima-se a taxa neutra de juros real entre 3% e 3,5%. Seu valor preciso dependerá da metodologia adotada, podendo ser maior ou menor, dependendo de como se estima o hiato da atividade e o comportamento dos instrumentos financeiros domésticos e globais, por exemplo.
Uma forma de calcular a taxa neutra de juros real é por meio do cálculo da função reação do Banco Central. Neste caso, a premissa é que essa taxa é definida como aquela consistente com inflação na meta e hiato da atividade zero, ou seja, o PIB realizado igual ao PIB potencial. Por conseguinte, com a normalização da política monetária e a sinalização de um ciclo contracionista, em que a taxa real de juros ficará acima de 3,5%, torna-se natural esperar uma diminuição do crescimento econômico previsto.
Estimamos um crescimento de 2,3% para o próximo ano, mesmo patamar previsto, no início deste ano, pela mediana de mercado para 2022. Entendemos que o crescimento de curto prazo no Brasil é muito influenciado pelos termos de troca e pelo desempenho do setor externo, os quais continuam apresentando bom desempenho e sinais de que assim permanecerão no próximo ano. Contudo, hoje essa estimativa tem viés para baixo, especificamente pela sinalização do ciclo contracionista de juros, assim como pelas incertezas hídrica e institucional que rondam a economia brasileira.