Quando o primeiro relatório financeiro da gestão do Zé foi repassado aos acionistas, não havia quem conseguisse esconder o próprio contentamento. Nunca aquela empresa havia gerado tanto. E, assim, a empresa conheceu os melhores resultados de sua história.
É bem verdade que tais resultados não foram conseguidos sem esforço; em certas ocasiões, mesmo a contragosto, o Zé foi forçado a adiar alguns investimentos na modernização das fábricas ou no aprimoramento do seu processo de logística para não frustrar as justas expectativas dos acionistas. Tamanho era o sucesso que a empresa experimentava que o mercado logo quis saber o que havia mudado. A resposta era evidente: o novo executivo chefe era o Zé.
Não tardou que um headhunter fizesse ao Zé a oferta de um desafio profissional irrecusável: passar a administrar um outro grande grupo empresarial. A proposta de remuneração era tão vultosa que os próprios herdeiros entenderam que não havia como manter o Zé. Ademais, a empresa estava forte como nunca e um outro executivo mais barato poderia dar continuidade ao brilhante trabalho realizado pelo Zé.
A nova empresa era muito maior e maiores eram as oportunidades de melhoria e a visibilidade que o Zé adquiriu no mercado de trabalho de executivos. Ainda mais quando, supostamente por um problema referente à desatualização e obsolescência do seu parque fabril, sua antiga empresa perdeu competitividade e acabou tendo que pedir concordata. Enquanto a empresa antiga se deteriorava, a nova crescia a taxas inimagináveis. A conclusão já é nossa conhecida: o Zé era quem fazia a diferença.
Meu amigo Zé tornou-se um executivo dos mais famosos. De empresa em empresa, obtendo resultados e remunerações cada vez mais expressivos, acabou por se tornar um mito. Muitos viam nele um guru e queriam aprender as coisas que ele sabia. Ninguém podia mais sobreviver sem uma forte formação em negócios. As escolas de negócios se multiplicaram para ensinar a linguagem do Zé. Quase arrisco a dizer que se criou uma escola Zediana de administração em torno de suas práticas. Frases a ele atribuídas como: “fazer mais com menos”, “custos são como unhas: devemos cortar toda semana”, “agregar valor ao acionista” etc. Viraram bordões das rodas de negócios.
O Zé se aposentou com uma situação financeira confortável, mas isto não foi o fim. Passou a fazer palestras pelo mundo, explicando que seu sucesso era fruto de longas jornadas de trabalho e estudo. Escreveu um livro (acho que o título era: O Zé Pelo Zé). Seus ensinamentos encontraram diversos seguidores. Milhares de novos “Zés” surgiram e fizeram empresas crescer integrando mercados, reduzindo barreiras, dando maior fluidez aos recursos para que tivessem alocações mais eficientes etc.
A economia cresceu. Todos estavam satisfeitos quando uma crise começou. Por algum motivo, aqueles que haviam deixado de agregar valor pararam de consumir. Ou aconteceu algum tipo de desconfiança no futuro, ou qualquer uma dessas gripes que dizimam as formigas lunares. Alguém viu que os resultados não seriam bons, os acionistas iam ficar tristes, os bônus não chegariam no Natal. Mas era possível fraudar a Contabilidade.
“Isto é uma obra de ficção, qualquer semelhança com nomes, lugares, situações, práticas administrativas e resultados terá sido mera coincidência.”
*Professor do Coppead e do Instituto de Economia da UFRJ