Por Roberto Samora
SÃO PAULO (Reuters) - Registros de variedades de soja transgênica nos Estados Unidos que ainda não foram aprovadas para plantio ou consumo no Brasil podem atrapalhar ou mesmo impedir importação de grãos geneticamente modificados, em um momento em que brasileiros avaliam compras do produto norte-americano para preencher alguma lacuna no mercado, segundo autoridades e especialistas.
O Brasil, maior exportador global de soja, pode ser levado a importar a oleaginosa dos EUA após realizar embarques recordes para a China, com o país asiático evitando o grão norte-americano depois da imposição de tarifa de 25 por cento por Pequim em guerra comercial com Washington.
Atípicas importações de soja dos EUA pelo Brasil poderiam ocorrer por conta dos preços baixos do produto norte-americano, em relação ao que se paga na América do Sul, onde as cotações estão sustentadas pela demanda chinesa e também em função da entressafra na região.
Compradores estão pagando prêmios de 2,70 dólares por bushel pela soja no Brasil na comparação com o contrato novembro de Chicago, cotado em torno de 8,60 dólares, perto de mínimas em dez anos, com o desenvolvimento de uma colheita recorde nos EUA e a questão da China.
Essa diferença mais do que compensaria custos logísticos, entre outros, para trazer a oleaginosa norte-americana ao país, não fossem as incertezas sobre transgênicos.
"O risco de uma importação dos EUA (por transgênicos não autorizados) existe, e a maneira de prevenir isso seria identificar quais ainda não foram aprovados e solicitar o registro no Brasil", disse um especialista fitossanitário do Ministério da Agricultura, que preferiu não ser identificado.
Essa autoridade disse que um levantamento preliminar do ministério apontou que os EUA possuem 20 tipos aprovados de soja transgênica, com diversas características, de tolerância a herbicidas a resistência a insetos, ao passo que o Brasil realizou aprovações de 16 variedades, considerando produtos com genes combinados ou simples.
Como exemplo de cultivo de transgênico não aprovado no Brasil está uma soja projetada para ter maior acúmulo de ácido oleico, aprovada em 2009 nos EUA, embora a autoridade brasileira já tenha liberado a variedade para consumo humano e animal, segundo dados do Centro de Informações sobre Biotecnologia (CIB).
Há também uma soja aprovada nos EUA tolerante a herbicidas à base de ácido diclorofenoxiacético (2,4-D), ao glifosato e ao glufosinato de amônio que ainda não tem autorização para consumo animal e humano no Brasil, embora já tenha sido liberada para plantio, segundo o CIB, uma organização não governamental.
A partir disso, surge a incerteza para se realizar a importação de soja dos EUA, uma vez que é complicado segregar o produto aprovado daquele não aprovado no Brasil.
"Os fatores que estamos sempre falando, sobre entraves na importação, são justamente sanitários. Esta questão dos transgênicos... Por que a gente não fez? Porque não está claro realmente, o mercado brasileiro não tem clareza para fazer essa importação", disse uma fonte de corretora com atuação no Paraná, na condição de anonimato.
As importações brasileiras de soja neste ano teriam potencial para atingir cerca de 1 milhão de toneladas, nos cálculos da originadora de grãos Agribrasil, com o país possivelmente exportando um recorde de aproximadamente 80 milhões de toneladas em 2018. Anteriormente, a Anec, associação que representa exportadores, já havia comentado sobre tal possibilidade.
CAMINHOS
Uma alternativa para importar o produto dos EUA, segundo a autoridade do ministério, que atua na Secretaria de Defesa Agropecuária, seria solicitar uma aprovação especial para importar os grãos não aprovados no Brasil.
Em 2016, em meio à escassez de milho no país após uma quebra de safra, a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), responsável por aprovações de transgênicos, liberou três variedades do cereal dos EUA para produção de ração no Brasil, atendendo a pedidos de produtores de aves e suínos.
No caso de alguma importação dos EUA, a indústria de soja do Brasil poderia fazer pedido de aprovação semelhante à CTNBio, garantindo que o grão não vá para o meio ambiente, sendo processado, disse o gerente de economia da associação do setor Abiove, Daniel Amaral, observando que a entidade prevê importações de 300 mil toneladas em 2018, versus 250 mil em 2017.
Para o CEO da Agribrasil, Frederico Humberg, as importações dos EUA ainda não aconteceram mais em função das fracas margens de esmagamento, pelo alto preço da soja, do que devido a preocupações com transgênicos.
Segundo a Abiove, o brasileiro poderia importar a soja sem impostos de importação, desde que utilizando um "drawback" para exportar o farelo.
(Por Roberto Samora)