RIO DE JANEIRO (Reuters) -O presidente Luiz Inácio Lula da Silva admitiu nesta quinta-feira que o acordo Mercosul-União Europeia não será fechado agora, apesar de ter tentado até o último minuto, e lamentou que seu esforço não tenha dado certo.
Na abertura da cúpula dos chefes de Estado do Mercosul, o presidente citou a posição da Argentina -- que, nos últimos dias, se recusou a fechar o acordo -- e também as declarações do presidente francês, Emmanuel Macron, que disse no fim de semana ser contrário a assinatura, como principais razões.
"Vocês sabem, porque alguma coisa saiu na imprensa, do esforço que nós fizemos para tentar concluir esse acordo na minha presidência. Eu conversei com quase todos os presidentes da União Europeia, eu conversei com os negociadores da União Europeia, tentando mostrar a necessidade de a gente fazer esse acordo... Fiz um apelo para o Macron deixar de ser tão protecionista... Mas, de qualquer forma, não deu certo", reconheceu Lula.
Nas últimas semanas, os negociadores brasileiros e europeus avaliavam que seria possível fechar o acordo e assiná-lo durante a cúpula do Mercosul. O presidente da UE, Pedro Sánchez, da Espanha, e Ursula von der Leyen, presidente da Comissão Europeia, haviam sido convidados para o Rio de Janeiro, para a assinatura.
No entanto, na semana passada, o governo argentino de Alberto Fernández, que deixa o cargo em três dias, informou ao bloco que não teria condições de assinar o acordo nos atuais termos. Ao mesmo tempo, a França também endureceu o discurso e Macron declarou publicamente que era contrário, e as negociações terminaram suspensas.
Em sua fala na abertura da cúpula, Lula exortou o presidente do Paraguai, Santiago Peña, que assume a presidência do bloco, a continuar as negociações, mas criticou a posição dos europeus e o acordo que havia sido fechado em 2019, durante o governo Bolsonaro, e terminou não sendo ratificado pela maioria dos países.
"Nós herdamos uma versão desse acordo do governo passado que vocês conhecem. A versão era inaceitável, porque nos tratava como se nós fôssemos seres inferiores, eu diria até que nos tratava como país colonizado ainda", disse Lula.
"Eu acho que foi feito algum avanço... Eu acho que o texto que temos agora é mais equilibrado do que o que estava no outro governo, mas mesmo assim eu acho que é insuficiente. As resistências da Europa são muito grandes, eu estranho a falta de flexibilidade deles", continuou.
O acordo fechado pelo governo Bolsonaro em 2019 terminou por não sair do papel. No início deste ano, em uma "side letter", uma carta diplomática fora do texto principal do acordo, os europeus fizeram uma séria de exigências ambientais que irritaram o governo brasileiro. Originalmente dirigido ao governo Bolsonaro, o texto acabou chegando já no governo Lula,
Além disso, o governo brasileiro quis retirar as compras governamentais do acordo, que Bolsonaro havia cedido aos europeus, o que terminou por reabrir as discussões.
As negociações vinham avançando com celeridade, de acordo com negociadores brasileiros ouvidos pela Reuters, e a expectativa era que uma última reunião presencial esta semana encerrasse os últimos detalhes. No entanto, o encontro foi suspenso depois de a Argentina avisar que não iria assinar nada agora.
A expectativa é que as conversas sejam retomadas depois que o novo governo argentino assumir, no próximo domingo.
Em um comunidade conjunto divulgado no início da tarde, Mercosul e UE afirmaram que irão continuar negociando com a “ambição de concluir o acordo”, reforçando o interesse de ambos os lados.
De acordo com o texto, foram feitos “avanços consideráveis nos últimos meses”.
“Com base nos avanços efetuados até a presente data nas negociações, ambas as partes esperam alcançar rapidamente um acordo que corresponda à natureza estratégica dos laços que as vinculam e à contribuição crucial que podem oferecer para enfrentar os desafios globais em áreas como o desenvolvimento sustentável, a redução das desigualdades e o multilateralismo”, diz o texto.
Após o encerramento da cúpula, o chanceler brasileiro, Mauro Vieira, disse que o acordo pode ser resolvido até fevereiro de 2024.
"Há uma janela de oportunidade para se concluir o acordo UE-Mercosul até meados de fevereiro", disse Vieira a jornalistas. "Até lá vamos saber se é possível concluir ou não o acordo em sua parte comercial... Estamos trabalhando para aprovar".
(Reportagem de Lisandra Paraguassu, em Brasília, e Rodrigo Viga Gaier, no Rio de JaneiroEdição de Alexandre Caverni e Pedro Fonseca)