Por Marcela Ayres e Jamie McGeever
BRASÍLIA (Reuters) - O presidente do Banco Central, Ilan Goldfajn, afirmou nesta terça-feira que o BC vai sempre olhar no momento adequado se a política monetária está suficientemente estimulativa, e creditou o otimismo do mercado com o Brasil à agenda de reformas prometida pelo novo governo, a despeito de o cenário externo seguir desafiador.
Em entrevista à Reuters, Ilan voltou a dizer que o BC não indica trajetórias futuras para a taxa básica de juros para manter sua liberdade de atuação em função do cenário. Nesse sentido, reafirmou que a tônica é manter serenidade, cautela e perseverança.
"Estamos no que eu considero valores estimulativos (para a política monetária). Isso ajuda a economia. Agora, crescimento depende de vários componentes. Você estimula via política monetária, mas também às vezes o investimento depende de você ter um período em que a incerteza diminui, as reformas são implementadas e aí o investimento deslancha também."
Questionado se os juros básicos estariam num patamar suficientemente estimulativo, em meio ao quadro de forte capacidade ociosa e recuperação econômica sem vigor, ele respondeu: "Nesse momento nós consideramos (a política) estimulativa. O (quão) suficientemente vamos sempre olhar no momento adequado."
Reagindo às declarações, as taxas dos contratos futuros de juros caíram nesta tarde, segundo operadores.
"O Banco Central esclarece que a mensagem de política monetária não se alterou desde o último Copom. O BC continua priorizando a cautela, a perseverança e a serenidade", disse o BC à Reuters, via assessoria de imprensa, após a entrevista.
Ilan permanece no cargo até o Senado sabatinar e aprovar o nome de Roberto Campos Neto, indicado pelo presidente Jair Bolsonaro para substituí-lo. A expectativa é que o processo ocorra até março.
Ainda à frente da autoridade monetária, ele avaliou que o período atual é mais conturbado em termos de incertezas globais, com normalização monetária em economias avançadas, impasse em torno do Brexit e disputas comerciais em curso, com destaque para as travadas entre Estados Unidos e China.
Apesar desse pano de fundo e de o Brasil seguir com fortes desafios no campo fiscal, Ilan descartou haver otimismo excessivo dos mercados com o país.
"Os sinais emitidos pelo novo governo na economia são sinais encorajadores, tem se falado de reforma da Previdência, tem se falado de privatização, tem se falado de mais transparência", afirmou.
"Talvez eles (mercados) tenham uma visão -- que eu concordo -- que houve um avanço considerável de reformas nos últimos anos", completou Ilan, citando a nova legislação trabalhista, a adoção do teto de gastos e a criação da TLP, nova taxa de juros que baliza os empréstimos do BNDES com condições próximas às de mercado.
"São várias mudanças que eu diria que o investidor percebeu que o Brasil está caminhando para o lado certo. Então vem o governo e indica o caminho, diz que vai aprofundar as reformas, vai fazer aquelas reformas da Previdência que não foram passadas. Então eu acho que isso é o que gera, digamos assim, essa confiança", destacou Ilan.
"Agora o que nós vamos observar ao longo desse ano vai ser a implementação", ponderou.
MAIS CRÉDITO LIVRE
Após se reunir mais cedo com a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, nesta terça-feira, Ilan pontuou que a diretriz de diminuição do crédito direcionado na economia vale para todas as modalidades existentes, não apenas para o crédito agrícola.
Esse movimento, contudo, demanda tempo e não será resolvido no curtíssimo prazo, ressaltou o presidente do BC, apontando que o tema ainda depende de estudos.
Tanto a ministra da Agricultura, quanto o novo presidente do Banco do Brasil (SA:BBAS3), Rubem Novaes, já disseram que o foco do novo governo deve ser no impulso ao seguro agrícola. Novaes, inclusive, afirmou que a posição do atual time econômico é de menos subsídio aos juros agrícolas, e mais apoio ao seguro.
Sem se estender no assunto, Ilan apenas afirmou que o seguro agrícola é algo que "tem que melhorar no Brasil".
Sobre eventual redução dos compulsórios após o BC já ter tomado iniciativas nessa direção no último ano, Ilan indicou haver espaço para novas atuações, mas não imediatamente.
"Eu acho que compulsórios nós fizemos muito, ainda podemos fazer mais, mas não é algo que a gente anuncia antes e nem algo iminente", disse.
Ele também afirmou que o novo formato do Conselho Monetário Nacional (CMN), que terá sua primeira reunião do ano na próxima semana, não deve diminuir o peso do BC nas decisões tomadas.
Além do presidente do Banco Central, o CMN será agora composto pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, e pelo secretário especial de Fazenda, Waldery Rodrigues, que é seu subordinado direto. Antes, integravam o CMN os ministros da Fazenda, do Planejamento e o presidente do BC.
"As discussões acabavam sempre indo na linha de achar um consenso, então vamos continuar tentando achar um consenso", disse Ilan.
"Se estivéssemos em outros momentos da economia brasileira, talvez momentos mais conflituosos em que um estava andando para cá, outro estava andando para lá, eu acho que podia fazer diferença. Mas no momento eu não vejo isso não."