Por Jessica Bahia Melo
Investing.com - O segundo semestre "promete", segundo descreve Gustavo Franco, conhecido como um dos “pais” do Plano Real, na Carta de Estratégias, divulgada ao mercado pela Rio Bravo. A proximidade do pleito, elevando a temperatura eleitoral, tornou o cenário econômico mais difícil em junho, aliada às estratégias contracionistas dos bancos centrais visando controlar a inflação, incluindo do Federal Reserve (Fed), a autoridade monetária dos EUA.
O Fed elevou a taxa de juros em 75 bps, a maior alteração desde 1994, para a faixa de 1,5%-1,75%. “É a providência lógica diante da maior inflação em quarenta anos, 8,6% no acumulado de 12 meses até maio. Desde julho de 1994 – ou seja, nos últimos 28 anos em que o Brasil teve taxas de inflação civilizadas, comparáveis, portanto, com as que se observam em países normais –, não houve outra ocasião em que a inflação americana (8,6%) tenha ficado tão próxima da nossa (11,7% pelo IPCA) no acumulado de 12 meses”, compara Franco.
A situação fica pior tendo em vista que os patamares da inflação brasileira não estão baixos, considerando o período após 1994, com a implantação do real. Em 2022, a meta para inflação do Conselho Monetário Nacional (CMN) é de 3,5%, com intervalo de tolerância de 1,5%. “A meta está praticamente perdida, e isso será consumado no IPCA de junho prestes a sair”, acredita o economista. Dessa forma, cabe ao Banco Central escrever outra carta aberta com as razões para o descumprimento dos limites - a segunda em dois anos e a sexta vez desde a criação do Regime de Metas de Inflação no Brasil no ano de 1999.
Dessa vez, no entanto, Franco não acredita haver a percepção de que o BCB não tenha feito a sua parte. “Não houve desestabilização de expectativas, ou desancoragem, como se fala no sofisticado idioma com que o BCB se comunica com o mercado. Considerando a temperatura dos sentimentos eleitorais, é um enorme progresso que o BCB tenha conseguido manter-se fiel à sua missão”, pondera.
Inflação, eleições e juros
Segundo o economista, o retorno de uma inflação elevada em um contexto de eleição polarizada traz um teste à ideia de uma autoridade monetária independente, o que não tem sido uma tarefa fácil. O presidente do BCB, Roberto Campos Neto, fica à frente da instituição monetária em mandato até 31 de dezembro de 2024, após a aprovação de uma emenda constitucional que trouxe autonomia para atuação.
Para completar, em meio à elevação nas taxas de juros, o Brasil passa por escândalos políticos no primeiro escalão do governo, com o ex-ministro da Educação, Milton Ribeiro, e o agora ex-presidente da Caixa Econômica Federal, Pedro Guimarães.
Nesse cenário conturbado, entra em pauta a Proposta de Emenda a Constituição (PEC) que, na teoria, traria uma resposta aos choques inflacionários, porque o governo possui dificuldade em contornar a regra de paridade de preços internacionais praticada pela estatal brasileira de petróleo Petrobras (BVMF:PETR4).
Mas, após as mudanças previstas no Senado, a versão final ficou conhecida pelo “pacote de bondades” às vésperas das eleições, com custo superior a R$ 40 bilhões - com criação e ampliação de benefícios, incluindo Auxílio Brasil, vale gás e novos programas para caminhoneiros e taxistas. Franco afirma que a PEC é mais estímulo fiscal no ano eleitoral e que vai reforçar uma tendência de recuperação da economia.
“No plano conceitual, o desconforto com a medida decorre tanto da banalização da ideia de emergência, ou de calamidade, quanto da prática de se fazer políticas econômicas através de Emendas Constitucionais. Note-se que não há que se falar em inconstitucionalidades ou ilegalidades, em se tratando de medidas estabelecidas por PECs”. Para Franco, o problema é a falta de limite. “Uma maioria parlamentar pode impor sua vontade inclusive contra as leis que estabelecem os ditos pesos e contrapesos da democracia, como a Lei Eleitoral e a de Responsabilidade Fiscal”, conclui.