Por Marcela Ayres e Maria Carolina Marcello
BRASÍLIA (Reuters) - A comissão especial da reforma da Previdência concluiu nesta terça-feira a votação da proposta, que enfrentará nas próximas semanas a prova de fogo em dois turnos de votação no plenário da Câmara dos Deputados, onde precisará do apoio de três quintos dos deputados.
Na semana passada, a comissão já havia aprovado o texto-base da reforma da Previdência, com 23 votos favoráveis de um total de 37.
Embora não fosse necessário o quórum de três quintos de aprovação na comissão, o resultado conseguiu bater a meta mas mostrou que o governo não conta com uma margem de segurança para aprovar a matéria em plenário.
Os deputados aliados, no entanto, garantiram os votos necessários para barrar na comissão as modificações que o governo não queria ver no texto na votação dos destaques nesta terça.
O relator da PEC, Arthur Oliveira Maia (PPS-BA), aposta que o governo conseguirá mais votos do que os 308 exigidos e comemorou o texto produzido pela comissão como um “produto do debate”.
“Esse texto não é mais nem de longe um projeto do governo, pertence ao produto do debate”, disse, acrescentando que a proposta compatibiliza a necessidade fiscal com as demandas sociais da população, “combatendo privilégios e protegendo os mais pobres”.
“Os pontos centrais foram preservados até aqui e serão preservados”, disse a jornalistas após a conclusão da votação da proposta na comissão especial.
A oposição, no entanto, sustenta que a proposta não conta com o apoio popular e tem chances de ser derrotada no plenário.
“Eu aqui como líder da oposição na comissão, acho que a grande vitória desse período foi a gente entrar em um grande embate político de dados, de opinião, e na disputa de opinião pública a gente ter ganho essa batalha de comunicação”, disse a deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ).
Nem o relator nem o presidente da comissão, Carlos Marun (PMDB-MS), arriscaram uma data para a votação em plenário, argumentanto que a tarefa de pautar a PEC cabe ao presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ).
Na prática, será o Palácio do Planalto que vai definir o momento de votação e isso só vai ocorrer quando o governo tiver segurança de que a matéria terá os votos necessários para sua aprovação.
SEM SURPRESAS
A comissão aprovou nesta terça apenas uma mudança, já acertada entre os deputados. A emenda aprovada mantém a competência compartilhada entre a Justiça federal e estadual para julgar demandas contra o INSS sobre acidentes de trabalho.
De início, o governo queria concentrar os julgamentos na Justiça federal para ter maior controle sobre os procedimentos, buscando uniformizá-los. Mas em acordo para a votação da reforma na Comissão, a base aliada aceitou o destaque referente ao tema --proposto por PTB, PROS, PSL e PRP-- e que mantinha nas duas esferas a competência para tratar dos assuntos.
As outras sugestões de mudanças, inclusive a emenda do PSOL que pedia a realização de um referendo popular sobre a reforma, foram rejeitadas.
Encarada pelo governo como a mais importante medida a ser votada neste ano pelo Congresso, justamente por considerá-la essencial para colocar as contas públicas em ordem, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) teve sua votação interrompida na comissão na semana passada.
Deputados já analisavam emendas ao texto na última quarta-feira, mas a sessão da comissão teve de ser interrompida pela invasão de agentes penitenciários contrários às mudanças, numa cena de tensão que contou inclusive com o disparo de bombas de efeito moral dentro das dependências da Câmara.
NEGOCIAÇÃO FORÇADA
O texto aprovado pela comissão foi atenuado em relação à proposta original do governo, que se viu forçado a ceder em vários pontos para ampliar o apoio à reforma.
As regras aprovadas pela comissão estabelecem que as mulheres terão idade mínima de aposentadoria de 62 anos e os homens de 65 anos, sendo que para ambos a aposentadoria máxima poderá ser obtida com 40 anos de contribuição.
A reforma original enviada pelo Executivo previa idade mínima de 65 anos para homens e mulheres, além de 49 anos de contribuição para acesso à aposentadoria máxima.
As flexibilizações buscaram diminuir a resistência dos parlamentares ao texto, incluindo integrantes da base aliada, forçando o governo a promover uma mega operação para sua aprovação.
Com os crescentes sinais de que não teria os 308 votos necessários em plenário para conseguir aprovar a PEC, o governo recuou e aceitou negociar pontos antes anunciados como intocáveis.
Mais cedo o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), chegou a declarar que, comparado a outros países que já reformaram seus sistemas de Previdência, o Brasil tem promovido mudanças “suaves”, para serem sentidas em um prazo de 20 anos.
Mas o governo também endureceu sua estratégia. Depois que deputados governistas votaram contra a reforma trabalhista, houve exonerações de pessoas indicadas por esses parlamentares para cargos na máquina pública, numa tentativa de evitar que dissidências se repitam na votação da reforma da Previdência.
Ainda assim, o governo não deve ter vida fácil no plenário. Com as eleições de 2018 se aproximando, muitos parlamentares ainda sentem receio em perder capital político ao demonstrar apoio à uma proposta contestada pela maioria da população.
As invasões ao Congresso Nacional, por sua vez, também têm suscitado reações dos deputados. Na semana passada, agentes penitenciários entraram à força na comissão e provocaram a suspensão dos trabalhos, e no mês passado protesto de representantes de policiais resultou em quebra-quebra na principal entrada do prédio.
Nesta terça, a comissão trabalhou sob forte aparato de segurança, tanto nos corredores próximos ao plenário onde os destaques da reforma eram votados quanto nas diversas entradas que dão acesso ao Congresso. Do lado de fora, agentes penitenciários voltaram a protestar.