O processo de renovação de concessão de empresas de distribuição de energia elétrica, a depender de um projeto de lei que será apresentado na Câmara dos Deputados, pretende repassar 2 custos importantes para a empresas concessionárias:
1) o gasto com os descontos ou isenção do pagamento da tarifa por parte de consumidores de baixa renda (aqueles que consomem até 150 kw/h);
2) o valor necessário de investimentos para universalizar o sistema de distribuição conforme cronograma anual que será produzido pela Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica).
Hoje, esses 2 custos são bancados pela CDE (Conta de Desenvolvimento Energético), criada em abril de 2002. Os recursos da CDE são aportados “pelos agentes que comercializam energia para o consumidor, por meio de encargo tarifário a ser incluído nas tarifas dos sistemas de distribuição e transmissão, entre outras fontes”.
Ou seja, quem banca descontos nas contas de pessoas mais pobres e a universalização do sistema são todos os brasileiros consumidores cativos de energia.
O consumidor cativo é aquele ligado à distribuidora local. A maioria dos clientes de energia estão nesse grupo, que só pode comprar energia de uma determinada distribuidora. Já o consumidor livre pode escolher de quem vai receber a energia e negociar preços especiais. Além disso, fica dispensado de pagar na tarifa os encargos para a CDE.
Essas propostas estão em análise na subcomissão criada na Comissão de Minas e Energia da Câmara. O relator do projeto de lei é o deputado João Carlos Bacelar (PL-BA). Ele mostrou ao Poder360 um documento com 8 tópicos. Eis a íntegra (PDF – 25 kB). “São premissas que serão consideradas”, afirma.
O deputado Bacelar também diz que tem de ser vista com cautela a decisão do ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, de enviar ao TCU (Tribunal de Contas da União) um pedido para opinar sobre a renovação das concessões. A expectativa é que o governo entregue uma proposta com as diretrizes para a avaliação da Corte ainda nesta semana.
“O TCU é um órgão muito importante, mas sua função principal é a de assessoramento ao Poder Legislativo. Quem tem de fazer as leis, e também nesse caso das concessões, é o Congresso, não o TCU”, afirmou o deputado.
A Câmara quer mais protagonismo neste debate. Segundo Bacelar, o pedido da subcomissão é que o TCU aguarde o relatório da subcomissão e o projeto de lei que será fruto dos trabalhos do grupo, para só então avaliar as diretrizes.
Uma das premissas que serão consideradas para a lei estipula que “os contratos renovados deverão proibir” que as empresas distribuidoras, seus controladores, empresas coligadas ou associadas retirem de suas carteiras consumidores cativos (que pagam todos os encargos) para que se transformem em consumidores livres.
O que ocorre em muitos casos é que algumas distribuidoras incentivam alguns de seus clientes a se transformarem em consumidores livres, oferecendo desconto na tarifa. Isso hoje é legal e acontece sobretudo com grandes consumidores. Qual é o problema? O dinheiro que precisa ser arrecadado para compor a CDE fica maior para todos os demais consumidores cativos.
ÍNTEGRA DAS PREMISSAS
Eis a seguir o documento que será usado como premissas para deputado João Bacelar, na Comissão de Minas e Energia da Câmara, formular um projeto de lei sobre renovação de contratos de distribuidoras de energia:
“PAUTAS PARA RENOVAÇÃO DOS CONTRATOS DE DISTRIBUIÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA DAS CONCESSIONÁRIAS ESTADUAIS
“01. Os contratos renovados deverão proibir novas contratações por empresa ligada a distribuidora (descrever) para consumidores livres;
“02. A renovação das concessões implicará na obrigatoriedade da concessionária de recolocar para o mercado cativo, a energia contratada com o consumidor livre após o vencimento deste contrato, proibida sua renovação;
“03. A concessionária após a renovação do seu contrato de concessão não autorizará qualquer conexão ao seu sistema de distribuição de consumidor oriundo da geração distribuída, quando alcançar o montante de 10% (dez por cento) da sua carga mensal líquida;
“04. No caso do montante de novos consumidores que aderirem à geração distribuída, mantido o limite de 10% (dez por cento), deverão arcar com parcela correspondente aos mesmos encargos do sistema pagos pelo consumidor cativo;
“05. Os contratos de distribuição renovados terão a garantia da ANEEL, que a concessionária terá a garantia de manutenção de no mínimo 70% (setenta por cento) de sua carga líquida de distribuição. Os contratos vencendo com consumidores livres, que não cumpram este limite com as distribuidoras, não serão renovados, retornando essas energias para o mercado cativo;
“06. A renovação das concessões não será onerosa, entretanto os concessionários deverão assumir os custos de alguns encargos e subsídios do sistema como sejam:
“6.01. Montante do desconto ou isenção do pagamento da tarifa do consumidor de baixa renda, assim classificado com consumo de até 150 kw/h;
“6.02. Montante de investimentos necessários para universalização do sistema de distribuição conforme cronograma anual disponibilizado pela ANEEL.
“07. Os contratos deverão prever a isenção tanto de impostos federais como estaduais inclusive ICMS, no cálculo da tarifa ou se for o caso isenção de pagamento para o consumidor de baixa renda (Até 150 kw/h);
“08. Os novos contratos de distribuição de energia elétrica não poderão repassar ao consumidor cativo qualquer custo advindo das perdas de energia com gatos, furtos, etc. Entretanto comprovada da falta de operacionalidade do Estado em garantir segurança e acesso de prepostos da distribuidora, para correção de fatos anormais que venham a prejudicar a receita da concessionária, esta poderá compensar o custo de tais perdas, com o obrigatório pagamento de impostos estaduais e federais”.
O QUE ESTÁ EM JOGO
A partir de 2025, uma série de concessões de distribuição de energia chega ao final, a começar pelas empresas EDP (BVMF:ENBR3) Espírito Santo, Light (BVMF:LIGT3) e Enel (BIT:ENEI) Rio. Serão 20 distribuidoras afetadas até 2031, que atendem a mais de 55 milhões de consumidores (64% do mercado regulado nacional) e somam uma receita bruta anual superior a R$ 3 bilhões.
Essas companhias foram privatizadas na década de 1990, no governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e obtiveram contratos por 30 anos. O governo optou por não realizar a renovação automática dos contratos e analisar caso a caso. Agora, precisa definir as regras finais para o processo de renovação.