Ibovespa fecha em queda pressionado por Petrobras, mas sobe em semana marcada por resultados corporativos
Por Luciano Costa e Leonardo Goy e Rodrigo Viga Gaier
SÃO PAULO/BRASÍLIA (Reuters) - Sem alternativas para sanear as finanças da Eletrobras (SA:ELET3), o Ministério de Minas e Energia anunciou nesta segunda-feira que vai propor a venda do controle da estatal de energia elétrica, cuja fatia total do governo é avaliada em cerca de 12 bilhões de reais, considerando participações diretas e indiretas da União.
A fatia que será colocada à venda não foi revelada, mas a desestatização usará modelo semelhante ao adotado em empresas como Vale (SA:VALE5) e Embraer (SA:EMBR3), em que o governo mantém direito a veto em decisões estratégicas da empresa.
"O valor de mercado da parte do governo foi calculado em 12 bilhões. Mas com o controle vai também poder arrecadar até mais do que isso. Ela pode valer mais", disse uma fonte graduada do governo, referindo-se ao prêmio geralmente pago pelo controle.
O movimento ocorre após problemas decorrentes de ineficiências acumuladas nos últimos 15 anos, que impactaram a sociedade em cerca de 250 bilhões de reais, disse o ministério.
De 2012 a 2015, a Eletrobras somou mais de 30 bilhões em prejuízos, após uma renovação de contratos com tarifas mais baixas em meio a um pacote de medidas do governo Dilma Rousseff para baixar as contas de luz no país.
"Apesar de todo o esforço que vem sendo desenvolvido pela atual gestão, as dívidas e ônus do passado se avolumaram e exigem uma mudança de rota para não comprometer o futuro da empresa", afirmou o ministério.
Entre os planos de reduções de custos que vêm sendo implementados, estão programas de demissão voluntária. A companhia pode obter economias anuais de 1,5 bilhão de reais com esses desligamentos, disse na semana passada o presidente da empresa, Wilson Ferreira Jr., que assumiu o cargo há pouco mais de um ano com objetivo de melhorar a saúde financeira da empresa e evitar que ela atue como um órgão de governo
A dívida líquida da empresa no fim de junho era de 23,4 bilhões de reais.
Caso o plano seja concretizado, Michel Temer conseguirá o que Fernando Henrique Cardoso, cujo governo privatizou a Vale, não conseguiu. O ex-presidente disse recentemente que encontrou muita resistência e não conseguiu privatizar a companhia nos anos 90--apenas uma subsidiaria foi vendida, a Gerasul.
Criada após proposta do presidente Getúlio Vargas em 1954, a Eletrobras demorou anos a sair do papel, mas depois teve papel importante no desenvolvimento do sistema elétrico do país.
A estatal também teve sempre grande influência política, com quadros nomeados por diversos partidos, especialmente pelo PMDB.
Pela proposta, a Eletrobras migraria do Nível 1 para o segmento de mais alto nível de governança da B3, o Novo Mercado.
"A saída está em buscar recursos no mercado de capitais atraindo novos investidores e novos sócios. O governo permanecerá como acionista, recebendo dividendos ao longo do tempo", acrescentou o ministério no documento.
AJUSTE FISCAL
O secretário-executivo do Ministério de Minas e Energia, Paulo Pedrosa, disse à Reuters que o objetivo da venda do controle é ajudar o ajuste fiscal no Brasil, em momento em que o governo tem dificuldades para fechar suas contas, e que o processo de venda não deve ser algo demorado.
"Esse tipo de processo... é bem mais rápido, porque a valorização é o mercado que dá... nesse processo a União pode também receber por direitos de concessões, e é uma maneira de contribuir com o ajuste fiscal, mas não de uma maneira negativa ao desenvolvimento do setor elétrico", disse Pedrosa.
Ele evitou prever quanto pode ser arrecadado com o negócio ou em quanto tempo a venda poderia ser concluída.
"Isso será apresentado ao Programa de Parceria de Investimentos (PPI)", complementou.
A proposta de venda do controle da Eletrobras deve ser incluída na pauta da reunião da próxima quarta-feira do órgão de governo que cuida de desestatizações, disse uma fonte do governo que acompanha o assunto.
As ações da Eletrobras subiram na bolsa paulista nesta segunda-feira, num dia em que o Ibovespa teve leve baixa de 0,12 por cento. A ação ON subiu 3,35 por cento, enquanto a PNB avançou 2,65 por cento.
"A nova Eletrobras segue um modelo de êxito adotado em diversos países, como Portugal, França e Itália, que transformaram suas estatais de energia elétrica em grandes corporações que atuam no mundo inteiro e mantêm sua identidade nacional", disse o ministério.
DIFICULDADES?
Para o ex-diretor da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) Afonso Henriques, a decisão é correta, mas previu que o governo enfrentará dificuldades políticas em sua implementação.
"Há muitos interesses políticos, regionais inclusive, dentro da estatal. Acho que haverá uma briga, disputa contra esses interesses, contra o uso político do grupo", disse.
Para o consultor, do ponto de vista econômico e do abastecimento de energia, a eventual venda do controle da holding não traria grandes consequências.
Outros especialistas se surpreenderam com a decisão.
"Ninguém acreditava nisso, é realmente uma surpresa", disse o especialista em energia do Pinheiro Neto Advogados José Roberto Oliva Junior, que atua em fusões e aquisições.
O governo fará na terça-feira pela manhã uma conferência de imprensa para explicar o processo.
(Com reportagem adicional de Roberto Samora e Aluisio Alves)