Por Paula Arend Laier
SÃO PAULO (Reuters) - O Ibovespa desabou mais de 3% nesta quarta-feira, maior queda em cerca de dois anos, com o pessimismo persistente sobre o cenário fiscal no Brasil somando-se à reação negativa em Wall Street da sinalização do Federal Reserve de que diminuirá o ritmo de corte na taxa de juros dos Estados Unidos.
Índice de referência do mercado acionário brasileiro, o Ibovespa caiu 3,15%, a 120.771,88 pontos, maior queda percentual desde 10 de novembro de 2022 considerando fechamento. No dia, marcou 124.698,50 pontos na máxima e 120.457,48 no pior momento, mínima intradia desde junho.
O analista Harrison Gonçalves, sócio da CMS Invest, afirmou que a perda dos 123 mil pontos é um sinal baixista pois é o rompimento de um fundo duplo nessa região. “O alvo agora será os 120 mil pontos onde existe uma zona de suporte importante”, afirmou.
O volume financeiro atingiu 83 bilhões de reais, em pregão marcado pelo vencimento de opções sobre o Ibovespa e do contrato futuro do índice.
De acordo com o analista educacional Vitor Agnello, da CM Capital, os ativos brasileiros continuam minados pela apreensão com o rumo das contas públicas, com agentes acompanhando a tramitação de medidas de cortes de gastos no Congresso Nacional, fundamentais para demonstrar algum controle fiscal no país.
A Câmara dos Deputados aprovou na véspera o texto-base do projeto de lei que impõe travas para o crescimento de despesas com pessoal e incentivos tributários se houver déficit primário, além de permitir o uso de superávit de quatro fundos para pagar a dívida pública de 2025 a 2030, parte do pacote fiscal.
Uma das preocupações é se haverá tempo para a votação no Senado. O presidente da Casa, senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), disse que a última sessão do Congresso antes do recesso parlamentar está marcada para a quinta-feira, mas já afirmou que não descarta a possibilidade de fazer sessões extras.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que a votação do pacote fiscal do governo no Senado depende apenas da chegada do texto após a votação na Câmara dos Deputados.
Investidores também temem desidratação nas medidas apresentadas. Nesse sentido, também pesou reportagem do Valor Econômico de que líderes partidários da Câmara fecharam acordo para rejeitar endurecimento das regras do Benefício de Prestação Continuada (BPC).
Em uma publicação no Linkedin, Guilherme Ferreira, presidente institucional na JiveMauá, afirmou que "não é preciso um doutorado em macroeconomia para entender o mercado - talvez seja mais útil um curso de psicologia das massas".
De acordo com ele, há um pânico generalizado de que o governo perdeu a credibilidade e como consequência uma corrida em direção à saída de emergência, ou seja, uma fuga para o dólar.
"Quando isso acontece, o país precisa de um choque de credibilidade, algo que altere de maneira significativa a percepção do mercado quanto à trajetória do país... Ou o governo se compromete com uma trajetória fiscal responsável e com uma gestão prudente da coisa pública, ou continuaremos afundando nesse redemoinho de desconfiança."
Em paralelo, nos Estados Unidos, as bolsas fecharam com quedas expressivas e os rendimentos dos títulos do Tesouro avançaram após o Fed cortar os juros em 0,25 ponto percentual, como esperado, mas apontar ritmo mais lento para novas reduções, não descartando uma pausa nos cortes a partir de janeiro.
De acordo com o diretor de risco da Ciano Investimentos, Plínio Zanini, o efeito benigno a princípio do alívio monetário nos EUA acaba sendo contrabalançado pela revisão na perspectiva de novos cortes pelo BC norte-americano, além das incertezas fiscais do Brasil.
DESTAQUES
- CVC (BVMF:CVCB3) BRASIL ON despencou 17,11%, sem trégua na valorização do dólar ante o real e no avanço das taxas futuras de juros, movimento que tem penalizado papéis sensíveis à economia doméstica ou com níveis elevados de endividamento - ou os dois. MAGAZINE LUIZA ON (BVMF:MGLU3) caiu 10,04%. O índice do setor de consumo fechou com declínio de 4,33%.
- AZUL PN (BVMF:AZUL4) desabou 11,58%, tendo ainda como pano de fundo relatório do UBS BB cortando o preço-alvo da ação de 8,50 para 5 reais e reiterando recomendação "neutra". A Azul também anunciou o lançamento de ofertas de troca de dívida que fazem parte de um amplo plano de reestruturação financeira da companhia aérea.
- VALE ON (BVMF:VALE3) fechou negociada em baixa de 2,32%, pressionando também o Ibovespa, na esteira da queda dos futuros do minério de ferro na China, onde o contrato mais negociado na Bolsa de Mercadorias de Dalian encerrou as negociações do dia com queda de 2,63%, a 778,5 iuans (106,86 dólares) a tonelada, o nível mais baixo desde 27 de novembro.
- PETROBRAS PN (BVMF:PETR4) caiu 2,58%, relevando a alta do petróleo no exterior, onde o barril de Brent subiu 0,27%.
- BRADESCO PN (BVMF:BBDC4) recuou 4,17%, em dia de fortes perdas dos bancos do Ibovespa, com SANTANDER BRASIL UNIT (BVMF:SANB11) cedendo 4,27%, ITAÚ UNIBANCO PN (BVMF:ITUB4) perdendo 2,85% e BANCO DO BRASIL ON (BVMF:BBAS3) perdendo 2,78%, entre os grandes de varejo. BTG PACTUAL (BVMF:BPAC11) UNIT encerrou em baixa de 5,48%.
- AUTOMOB ON afundou 30%, em meio a ajustes após forte valorização desde a estreia na segunda-feira. A Automob nasceu da fusão da Vamos Concessionárias - cindida da Vamos Locação (BVMF:VAMO3) - com a Automob, ambas sob o controle da Simpar (BVMF:SIMH3). Após ser listada a 0,17 real, a ação chegou a 0,91 real na máxima na véspera.