A semana passada terminou com as ações da Vale (SA:VALE3) fechando em queda de 5,9% na sexta-feira. Parte desse movimento foi gerado por um mal estar geral ocasionado por uma fala do Presidente Bolsonaro, que trouxe à tona aqueles receios sobre a situação fiscal do país. Uma outra parte significativa foi gerada pela forte queda de 8,1% do minério de ferro.
É sobre esse ponto que quero iniciar meu texto.
O que ocasionou esse movimento foi uma notícia de que o governo chinês está intensificando o controle sobre a produção de aço no país. A China havia estipulado que a produção de 1 bilhão de toneladas seria um teto para a produção do setor. No entanto, até o final de junho, a produção já havia atingido 560 milhões de toneladas.
Dessa forma, dado que o país assumiu compromissos para a redução da emissão de carbono, e o setor de siderurgia responde por 15% do total de emissões do país, há um claro movimento para reduzir os níveis de produção para os próximos meses. E sabemos que quando o governo chinês resolve agir, a coisa acontece.
Além disso, haverá uma queda natural ocasionada pela redução das medidas de estímulo adotadas durante a pandemia e um arrefecimento da atividade do setor de construção civil no país durante o verão. De qualquer maneira, o cenário é de redução da produção.
E onde entra as ações da Vale nessa história?
A diminuição da atividade do setor de siderurgia da China levará a uma natural queda nos preços do minério de ferro. Com o minério de ferro caindo, a rentabilidade da Vale é questionada.
Nesse ponto entram aspectos maníaco-depressivos do mercado que precisamos discutir.
1. Minério de ferro a US$ 200 não é um patamar usual
Como nos últimos meses temos o visto o minério negociando acima de US$ 130, assumimos que a coisa sempre foi assim. E a realidade está longe de ser essa. A última vez em que a commodity negociou próxima desses patamares de US$ 200 foi em meados de 2011.
E por um acaso as ações da Vale não deram lucro nesse meio tempo?
Deram, e muito!
Se os preços do minério recuarem para US$ 120, por exemplo, o que seria uma queda de mais de 30% em relação aos patamares atuais (US$ 180), a Vale seguirá sendo muito rentável e gerando lucros historicamente altos.
O P/L atual da Vale está na faixa de 6x. Se os lucros caírem pela metade, o índice iria para 12x, o que ainda é um patamar saudável para a empresa.
2. O compromisso ambiental da China é benéfico para a Vale
Isso mesmo. Restrições à produção de aço, em função da poluição gerada por essa indústria, não prejudicam as ações da Vale. O minério de ferro produzido pela empresa possui um teor de ferro muito acima da média do mercado.
Minérios mais puros geram menos poluição na produção do aço. Dessa forma, com restrições cada vez maiores às emissões de carbono, o produto da Vale tende a ser beneficiado, gerando prêmios de preços mais expressivos.
3. Nem tudo são ciclos
Eu não sou louco de colocar em xeque a importância dos ciclos de mercados para os investimentos. No entanto, o processo de investimento não se resume somente à ciclos.
Muito tem sido falado sobre os ciclos de commodities. Realmente é um ponto importante e ajuda a chamar a atenção dos investidores. Mas antes de qualquer coisa, o que nos interessa é o desempenho das empresas.
Durante muito tempo adotei a estratégia top-down como base para a minha análise. Nessa linha, começamos as avaliações identificando primeiro os setores “vencedores” para depois selecionar as empresas que podem se destacar.
Hoje tenho seguido mais a lógica botton-up, em que essencialmente procuramos identificar boas empresas a preços atrativos, assumindo que em algum momento o mercado identificará eventuais distorções e o preço se ajustará.
Uma lógica não elimina a outra e temos grandes gestores de recursos, com excelentes resultados, que adotam um dos dois caminhos. São linhas diferentes e cabe a cada um verificar qual funciona melhor para a sua estratégia de investimentos.
Mas voltando a Vale, hoje ela se posiciona bem tanto sob uma ótima de um setor que está performando bem, como também no caso de uma empresa que está barata independente de um aspecto macro.
Não estou dizendo que o macro não influencia, mas como mencionei antes, mesmo com preços de minério mais baixos, a Vale segue barata. E isso não deixa de ser uma “segurança” para o investidor.
Acompanharmos o noticiário e estarmos atualizados é muito importante para os investimentos. Mas a minha intenção aqui foi ilustrar que a Vale não passou a ser ruim, ou um mal investimento, porque o preço do minério caiu na sexta. Elenquei aspectos da mineradora, mas o raciocínio pode ser aplicado à outras empresas e segmentos. O importante é termos claro ao longo do tempo é o desempenho da empresa que influenciará no preço da ação, e não o contrário.
Um abraço