Conforme anunciei em meu artigo anterior, darei continuidade ao tema sobre as diferentes óticas quanto aos indicadores financeiros.
Liquidez
Outro tipo de indicadores para analisarmos são os de liquidez. Contudo, para uma discussão mais produtiva, vamos retornar à nossa visão de geração de valor. Do ponto de vista das fontes de recursos, a empresa gerará mais valor quão menor for o seu custo de financiamento. Do ponto de vista da aplicação dos recursos, maior será o valor gerado quão maior for a taxa de retorno obtida. Como os ativos estão ordenados no Balanço pelo critério de liquidez (da maior para a menor) e que a liquidez afeta o risco do investimento, então o ativo circulante, por apresentar os ativos de maior liquidez contém aqueles de menor retorno. Aceita esta ideia, a conclusão natural é de que a empresa não investe em ativos circulantes como uma liberalidade, mas sim por uma necessidade.
Quando consideramos apenas os ativos operacionais (aqueles decorrentes da operação natural da empresa), a empresa somente investe neles quando isto aumenta a sua rentabilidade. Em outros termos, a regra é sempre procurar gerar o máximo de resultado utilizando o mínimo de ativos – fazer mais com menos. Então, cabe entender o que gera, para qualquer empresa, a necessidade de investir recursos em seu ativo circulante, dado que, possivelmente, são eles os que apresentam o menor retorno?
Para isto, vamos analisar uma empresa bastante simples, que possua em seu ativo circulante apenas as três contas principais: disponibilidades, contas a receber de clientes e estoques de mercadorias. Vejamos a finalidade de cada uma dessas contas.
Dinheiro parado não rende e isto é fato. Então, uma empresa deve procurar ter disponível o menor nível possível de recursos financeiros. Aliás, esta é a função da gestão de tesouraria: manter o caixa da empresa tão baixo quanto o possível. Do ponto de vista da rentabilidade das operações, o ideal é ter em caixa apenas o necessário para honrar seus compromissos que vencem naquele dia, descontando-se deles os recebimentos esperados para aquele mesmo dia. Então, quão maior o caixa da empresa pior, se considerarmos apenas a rentabilidade.
Um parêntese: não, a gestão de tesouraria não é simples. Na verdade, existe um bom número de ferramentas sofisticadas de análise e previsão probabilística que cuidam disso, mas não cabe a sua discussão neste texto.
Assim, a liquidez imediata (Disponibilidades/Passivo Circulante) ótima para qualquer empresa é zero, correto? Não. Embora isto seja verdade em boa parte das situações, em certos casos, a empresa apresentar disponibilidades maiores que aquelas necessárias aos seus fluxos operacionais pode afetar o risco percebido pelos seus financiadores e, uma eventual redução do seu custo de financiamento, pode mais do que compensar o efeito na sua rentabilidade de carregar este excesso de liquidez.
Sobre as contas a receber sabemos que seu montante depende do volume de vendas que a empresa e do prazo que seus clientes levam para pagar. Assim, uma empresa que venda apenas à vista, apresentará zero no saldo de contas a receber. Sabemos que o objetivo de qualquer empresa em dar crédito para seus clientes é aumentar as vendas.
Empresas que não possuem capacidade ociosa e, por isso, não têm como aumentar suas vendas, não dão prazos aos seus clientes. O ganho que uma empresa tem decorrente da concessão de crédito aos seus clientes é função da margem das vendas que ela consegue gerar ao conceder o crédito. Concluindo: quão maior a margem da empresa, mais propensa ela estará a aumentar o prazo que concede aos seus clientes.
Estoques seguem lógica similar. Seu tamanho depende do seu volume de vendas e do prazo médio que os itens ficam estocados. Sua existência decorre das incertezas tanto dos fornecedores (oferta) quanto dos clientes (demanda). Caso se tivesse certeza de que nenhuma venda seria perdida, a empresa trabalharia sem estoques.
Mais uma vez o raciocínio da margem se repete: quão maior for a margem com que a empresa trabalha, maior será a sua propensão a manter estoques para reduzir a probabilidade de perder vendas.
Por sua vez, o tamanho do passivo circulante depende das oportunidades de financiamento e seu impacto no custo médio de financiamento da empresa, como sinalizamos na primeira parte deste texto.
Do que foi apresentado até aqui, fica fácil concluir que, a liquidez corrente depende muito mais da estratégia competitiva que de qualquer outra coisa. Então, sua análise é muito mais complexa do que se costuma apregoar. Indo além: dizer que apresentar liquidez corrente maior (ou menor) é melhor (ou pior) não faz muito sentido.
Ainda podemos fechar o entendimento dos indicadores de liquidez pela análise dos ciclos operacional e de caixa da empresa. Isso veremos na última parte desta série, no próximo artigo. Até lá!
*Professor do COPPEAD/UFRJ e Diretor do Parque Tecnológico da UFRJ