Publicado originalmente em inglês em 24/05/2021
Os formuladores da política monetária do Federal Reserve abriram o jogo.
A ata da reunião de abril do Comitê Federal de Mercado Aberto (Fomc), divulgada na semana passada, tinha o seguinte a dizer:
“Vários participantes sugeriram que, se a economia continuasse progredindo rapidamente em direção aos objetivos do comitê, poderia ser adequado, em algum momento das próximas reuniões, começar a discutir um plano de ajuste no ritmo de compras de ativos”.
Não só eles estão falando sobre um aperto monetário, como querem divulgar isso ao público:
“Vários participantes destacaram a importância de o comitê comentar claramente sua avaliação sobre o progresso dos seus objetivos de longo prazo, devendo fazê-lo com bastante antecedência em relação ao momento que julgar conveniente uma mudança no ritmo de compras de ativos”.
Os investidores perceberam isso.
O Dow Jones Industrial afundou mais de 580 pontos na quarta-feira, antes mesmo do anúncio, dado que as preocupações cada vez maiores com a inflação provocaram uma liquidação no bitcoin e outros ativos de risco. As perdas no Dow recuaram para cerca de 164 pontos ao final do pregão. O que chamou a atenção, no entanto, foi a disparada do rendimento da nota de 10 anos do tesouro americano, que quase atingiu 1,7%, antes de corrigir.
Complacência perigosa?
O alerta velado expresso na ata foi que ainda levaria algum tempo para que a economia progredisse de maneira substancial em direção aos objetivos do Fed de máximo emprego e preços estáveis, mas sinalizou que o Fed não ignora totalmente a evidência crescente de que a inflação, transitória ou não, é uma realidade.
Quando foram divulgados os dados do IPC de abril, na quarta-feira, Larry Summers, ex-secretário do Tesouro, disse que os preços estavam subindo mais rápido do que o esperado.
Summers, que já foi cogitado para a presidência do Fed, subiu o tom das críticas ao banco central americano na semana passada. Em um evento promovido pelo Fed de Atlanta, ele acusou a instituição de criar uma “complacência perigosa” nos mercados financeiros e subestimar os riscos de inflação e instabilidade financeira com sua política de juros baixos.
O economista de Harvard já teceu outras críticas sobre o plano de resgate americano de US$1,9 trilhão aprovado em março, classificando-o como “política econômica menos responsável que já vimos nos últimos 40 anos”. As previsões de Summers nem sempre se mostraram corretas no passado, mas seus alertas continuam gerando preocupação.
Raphael Bostic, presidente do Fed de Atlanta, contemporizou dizendo, em uma entrevista na semana passada, que está aberto a “qualquer cenário”. Ele afirmou:
“Estou prestando atenção. Como estamos vivendo momentos sem precedentes, quero estar o mais preparado possível para o que vier a acontecer no futuro”.
Robert Kaplan, do Fed de Dallas, continuou pedindo que o Fed reduzisse suas compras de títulos “com a maior brevidade possível”. Ele mais uma vez recorreu à metáfora de que talvez seja hora de "tirar o pé do acelerador" para evitar "apertar demais o freio" lá na frente.
Patrick Harker, chefe do Fed da Filadélfia, ecoou essas preocupações sobre o estímulo monetário. Ele disse que reduzir as compras de ativos seria “o primeiro passo” no aperto gradual da política monetária.
A próxima reunião do Fomc será em 15-16 de junho, seguida de uma reunião no fim de julho e do simpósio de Jackson Hole no fim de agosto. A expectativa dos investidores é que o presidente do Fed, Jerome Powell, não se pronuncie sobre qualquer retirada de estímulo até o simpósio de agosto, mas a pressão cada vez maior pode forçá-lo a fazer isso antes.
Se o Fed conseguir aguardar até agosto para fazer o anúncio, tudo indica que o processo começará no início de 2022. Mas como já dizia o poeta escocês Robert Burns, os melhores planos de homens e ratos costumam dar errado.