PENSANDO…
Warren Buffet sempre diz que o trabalho dele é pensar e fazer coisas (tomar decisões) que façam sentido. Esse talvez seja o trabalho mais difícil, não é mesmo? Parar e pensar, ler, analisar, tentar entender o que se passa e tomar uma decisão. Bom, essa sempre foi a intenção com essa tônica: parar e pensar uma vez por semana. Eis aqui o resultado do exercício dessa semana.
ONDE ESTAMOS
Cerca de um mês atrás, no dia 20 de abril, eu escrevi aqui que havíamos chegado a um ponto de dúvida importante – link para aquela Tônica.
- O comprado pensava: “Ponho no bolso os lucros da recuperação dos mercados desde a mínima de 23 de abril?"
- O vendido pensava: "Será que a crise acabou mesmo? Será que o pior do corona passou?"
- Quem estava fora pensava: "Será que entro agora para não perder a festa, ou vem “chumbo” aí na frente?"
O gráfico abaixo pontua aquele momento, o “Moro Day”, e a performance da nossa bolsa comparada ao mercado norte-americano, que dita o rumo do mundo. E, por incrível que pareça, em pontos, tanto nos EUA quanto no Brasil estamos na mesma!
E diria que em termos de percepção e sentimento de mercado também estamos presos às dúvidas!
O pior do corona no mundo parece ter ficado para trás. No Brasil confesso que não sei dizer. Parece que também, mas não posso afirmar! Economias começam a reabrir e enfrentar os desafios da reabertura e da adaptação. Os números ainda são horríveis e ainda flertamos com a possibilidade de novas ondas do vírus. A dicotomia entre China e EUA foi reacendida trazendo receio sobre o crescimento futuro.
Pra adicionar um “tempero brasileiro” nesse caldeirão, inventamos uma crise para chamar de nossa, conforme comentei na tônica do dia 27 de abril. De lá para cá, a política tem reinado. A charge do Bovespa da Zoeira resume bem o que tem sido essa safra de balanços:
E assim estamos. Como diz a música do Noel Gallangher’s:
The voices in your head get so loud
And your problems are the size of a cow
Onde estamos? A meu ver, envoltos em dúvidas…
DÓLAR…
Me parece óbvio que o ajuste que sofremos por toda a bagunça política criada se deu essencialmente no câmbio. A bolsa não foi bem, é verdade - caiu mais do que o mercado norte-americano e outros mercados, mas nada se compara ao dólar, com o real sendo a pior moeda em 2020 em listas em que figuram países como Argentina e Venezuela! Postei essa imagem no meu instagram na semana que passou:
Isso fica claro quando olhamos a comparação de 12 meses do IBOV em USD (verde) com o índice americano S&P 500 (preto) e os demais mercados emergentes (vermelho).
Aqui não tem muito o que falar. Ganhamos competitividade externa, nossos produtos ficam baratos e isso nos ajuda a competir no cenário internacional, tende a ajudar o ajuste na balança comercial. Fora que com juros mais baixos (um dos fatores dessa alta do dólar), os juros da dívida também diminuem, o que é bom para orçamento fiscal. Mas isso tudo é paliativo e não resolve nada no longo prazo. Fora isso, quem não tem investimento em dólar ficou 45% mais pobre esse ano. Simples assim.
SEMPRE SERÁ ASSIM?
Assim como o dólar deixou os produtos brasileiros mais baratos, também o fez com os ativos. Então penso que basta um pouquinho mínimo de estabilidade no campo político, digo algo como um mês sem grandes balburdias ou escândalos, para ajudar nessa percepção de que tudo tem um preço e talvez atrair investidores para o Brasil, mesmo com o cenário econômico ainda incerto, afinal sempre foi assim.
Esse é o ponto aqui. Se você esperar que a situação política brasileira esteja calma para investir, talvez nunca investirá! Política sempre foi uma zona no Brasil. Tivemos diversos pedidos de impeachment e crises no governo FHC e LULA que, em tese, foram mais estáveis!
ALGUMAS COISAS CHAMAM ATENÇÃO
Então, junto com Breno e Eliseu, resolvemos escrever algumas coisas que nos chamam atenção.Não encarem isso como recomendação, são apenas coisas que nos chamam a atenção.
- SOBRE BANCOS (por Will e Eliseu)
Tenho 31% da minha carteira no setor. Para os mais descrentes, além do valuation absurdamente barato, teve notícia interessante para o setor, quem viu? Para quem estava apavorado com as provisões, inadimplência e o impacto disso nos bancos, essa foi uma notícia positiva que contrapõe esse medo todo. Se liga:
[Eliseu…]
Hoje, esse setor é o que mais chama atenção, pois todos os bancos estão muito descontados.
O Bradesco (SA:BBDC4) está abaixo do preço de 2005 em dólar. Convém salientar que o banco lucrava R$ 5 bilhões e, em 2019, o lucro foi de quase R$ 22 bilhões. Mesmo em dólar a diferença fica evidente e, fazendo um exercício de cortar esse lucro pela metade, ainda temos um banco que lucra o dobro, por um preço inferior. Fora isso, o banco negocia a 1x o book e cai 48,75% no ano!
O Banco do Brasil (SA:BBAS3) me parece ser o mais barato, ainda que logicamente mereça um desconto por ser estatal. O Banco negocia a preço similar ao de 2015-2016, período em que tivemos dois anos de queda em nosso PIB com juros em 14,5%. Analisando o preço-valor patrimonial por ação, temos os seguintes resultados para o Banco do Brasil, cuja cotação cai 49,90% no ano!
Itaú (SA:ITUB4) é outro ativo descontado. Em 2015 ele não tinha a compra da XP Investimentos, de que ele é dono de 49,90%, e cujo valor de mercado em 2020 acabou atingindo R$ 75 bilhões. No ano, as ações do Itaú caem 39,90%.
Para justificar tamanha queda na avaliação dos bancos, o mercado está precificando que os bancos negociados a valor patrimonial irão ter um return on equity, ou retorno sobre o patrimônio líquido, menor que o custo médio ponderado de capital, o que a meu ver não faz sentido.
- E A AVIAÇÃO (by Will)
Não é um setor que eu goste muito, nem aqui e nem no mundo! Mas algumas coisas chamam atenção. As ações da AZUL4 (SA:AZUL4) caem 10 pregões consecutivos! Desde que o mês de maio começou, suas ações só caem! Não tenho em carteira, mas isso é o tipo de coisa que não vemos corriqueiramente e me chamou atenção! Bizarro…olha o gráfico:
Digo isso porque começamos a ver movimentação em aeroportos e aviões voltando a voar. Estou só jogando a ideia aqui, mas sabe como é, o mercado adora exagerar!
Nos EUA é a mesma coisa! Essa imagem circulou na internet, e eu inclusive postei no meu Instagram. A empresa Zoom, que de fato se destacou muito durante esse corona com uma excelente solução para vídeo conferências, vale hoje mais do que sete companhias aéreas gigantescas! Meio bizarro isso, não?
Esse é um setor complexo, no qual você pisca e uma empresa quebra. Combustível, demanda, vulcão, acidentes, atraso em entrega de aeronaves, etc… Tudo pode afetar o setor. Mas o mercado adora “jogar tudo num mesmo saco” e exagerar.
Só para dar um exemplo de como o mercado exagera, a Southwest (LUV) é uma empresa com uma dívida super bem equacionada (Dívida Líquida de ~US$1BI) que tinha gerado mais de US$ 3 bilhões de Ebitda nos últimos 12 meses. Sim, ela parou e deve ter números muito ruins durante dois trimestres, mas, com uma dívida equacionada e com o Ebtida normalizando pós pandemia, a empresa estaria negociando a 5x EV/Ebitda. Longe de ter risco de quebrar. Continua sendo uma das maiores companhias que faz voos nos EUA. A Zoom entregou um Ebitda de US$ 25 milhões nos últimos 12 meses.
- PROPERTIES (por Breno)
Já olharam como está o setor de properties? Eu tenho uma palavra para esse setor: desconto! Se olharmos Log (LOGG3), podemos ver que a mesma apresentou um bom resultado, continua com uma vacância historicamente muito baixa (que eu acho difícil aumentar para um nível preocupante, pois seus principais clientes parecem estar sobrevivendo bem ao impacto da covid-19):
Além disso, cresceram o Lucro Líquido, EBITDA, FFO Ajustado e renovaram a maior parte dos contratos que estavam para vencer. Negociando a um desconto de cerca de 40% em relação ao seu valor patrimonial para 2020 e com uma cap rate (taxa de capitalização) de 7%.
Outra empresa do setor que também está descontada em cerca de 50% em relação ao seu valor patrimonial e possui uma cap rate de cerca de 10% é a BR Properties (SA:BRPR3), que, por sinal, também apresentou um resultado nada mal em relação ao 1T19:
Negociando a um EV/m² bem interessante:
Para os que não sabem, essa companhia está com um portfólio reciclado e possui na sua maior parte (83% do portfólio) escritórios triplo A concentrados no Rio de Janeiro e São Paulo. O que não me parece um mal negócio pós crise, pois não vejo este tipo de escritório deixando de existir ou diminuindo drasticamente.
- VALOR DE MERCADO X CAIXA (por Eliseu)
Dada a queda acelerada desses dois últimos meses, começam a surgir alguns ativos negociados abaixo ou perto do caixa que certas empresas têm! A última vez que vi um cenário parecido foi em 2015-2016 e um desses ativos acabei adquirindo por R$ 2,20 (atualizados), que foram as ações de Petrorio (SA:PRIO3). Vejo hoje três empresas negociando em patamares similares:
1) Uma delas é do mesmo setor que Petrorio, o petrolífero. Essa empresa tem dívida líquida negativa, possui em caixa cerca de 70% e ainda tem um recebimento de US$ 144 milhões, o que dá mais que o valor de mercado atual, apenas em caixa e em recebimentos. Além disso, o número de sondas de produtores de shale cai mês após mês, diminuindo os produtores de petróleo, o que pode fazer com que o mesmo tenha uma elevação na cotação.
2) A segunda possui o risco de um controlador que está em problemas, porém tem 80% do valor de mercado dessa empresa em caixa. Ela não tem dívidas e apresenta lucro! O problema é que os seus clientes estão querendo resgatar pontos em dinheiro, além do fato de que a empresa pode ser utilizada pelo controlador para sair da crise, incluindo usar o caixa que a empresa controlada possui.
3) E a terceira é uma empresa que recentemente ingressou na bolsa e está com um caixa em um momento esplêndido, pois atua no setor de construção civil. Entendo que os preços de terrenos possam cair e ela se aproveitar disso adquirindo terrenos em boas condições. Ela tem cerca de 80% do valor de mercado em caixa, podendo comprar terrenos em um momento interessante como o atual.
Não posso comentar especificamente sobre os ativos, falando em nomes, mas certamente quem é ligado, saberá quais são os ativos que mencionei pelas características elencadas.
- BONS SÓCIOS…(por Will)
Não tenho posição, mas me chamou atenção o movimento de dois bons e renomados gestores, caras que focam no longo prazo e na buscam por boas assimetrias na bolsa, comprando dois ativos ligados ao mercado interno e que sofreram muito esse ano.
1) CVCB3 (SA:CVCB3). Não vou aqui entrar no detalhe ou analisar a empresa, mas me chama atenção que a queda de mais de 75% no ano e a entrada recente do Opportunity.
2) BKBR3 (SA:BKBR3). Ação cai 50% no ano. Eles contam com três caras de peso como acionistas: Vinci, 3G e Atmos - a última, inclusive, aumentou participação recentemente.
Era isso.
Aquele Abs.