Investing.com - O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central inicia nesta terça-feira (5) a reunião de dois dias para decidir a nova taxa de juros. A expectativa do mercado é de aceleração da alta da taxa básica de juros, a Selic, de 0,25 para meio ponto percentual, de 10,75% para 11,25%.
As dúvidas do mercado estão em relação ao tom e ao conteúdo do comunicado a ser divulgado amanhã, após o fechamento do mercado (por volta de 18h30). “Vai ser tão duro quanto o anterior, com uma interpretação neutra”, projeta Leonardo Costa, economista do ASA. “Questão é se o Copom vai indicar uma mensagem mais agressiva de que vai ter alta acima de 50 pontos-base por reunião”, questiona Drausio Giacomelli, head de pesquisas sobre mercados emergentes no Deutsche Bank e responsável por análises macroeconômicas sobre a América Latina.
Variáveis internas da economia brasileira corroboram a aceleração do aperto monetário. “São os dados fortes de crescimento e inflação para cima”, complementa Giacomelli. Colabora também para a alta da taxa Selic a incerteza no exterior com as eleições nos EUA, as dificuldades econômicas na China e o crescente risco geopolítico no Oriente Médio, que aumentaram o preço dos ativos, entre os quais o dólar no Brasil. Além disso, a ausência de uma política fiscal de contenção de gastos pesa contra o Copom, assim como a sucessão do comando do Banco Central ainda causa um desconforto entre os agentes de mercado.
Inflação
“A inflação não melhorou desde a reunião anterior, os núcleos tampouco melhoraram e andando no mesmo ritmo, além da inflação de serviço acelerando”, explica José Francisco de Lima Gonçalves, economista-chefe do Banco Fator. “A inflação corrente como as condicionantes da inflação futura estão na direção errada”, avalia o economista Tony Volpon.
O próximo dado do IPCA, índice oficial de inflação do país, será conhecido na próxima sexta-feira, com risco de ter rompido em outubro o teto da meta de inflação no acumulado de 12 meses. O dado de setembro apresentou um IPCA anual de 4,42%, sendo que o teto é 4,5%, 1,5 ponto percentual acima da meta de inflação de 3% ao ano. O IPCA-15, prévia da inflação divulgado no fim de outubro, ainda se manteve abaixo do teto, a 4,47%.
“A média móvel de 3 meses, que o Copom gosta de olhar, está entre 5% e 5,5%”, avalia Costa do ASA. “Há os riscos de inflação no curto prazo, como os alimentos, além da taxa de câmbio”, relembra Gonçalves do Fator.
Vale relembrar que o Copom não conduz a política monetária sob a ótica da inflação corrente. Os membros do colegiado estão observando o nível de preços no horizonte relevante da política, que é de 18 meses. De acordo com o último Boletim Focus, divulgado ontem, continua a deterioração da expectativa de inflação. As estimativas para 2025 subiram de 4% para 4,03%, e as de 2026 passaram de 3,60% para 3,61%, sendo, respectivamente, a terceira e a primeira semana de alta nessas projeções.
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PIB e mercado de trabalho
Apesar da economia brasileira apresentar sinais de desaceleração no terceiro trimestre, os dados continuam surpreendendo os analistas, especialmente no mercado de trabalho. “A taxa de desemprego está no nível recorde, na mínima histórica, com geração de postos de trabalho muito fortes”, aponta Costa do ASA. “A massa salarial está desacelerando, mas ainda cresce acima da inflação”, complementa Gonçalves do Fator.
O Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil cresceu 1,4% no 2º trimestre em relação aos três meses anteriores. “Provavelmente o crescimento do terceiro trimestre vai ser menos da metade ou a metade em relação ao trimestre anterior”, projeta Giacomelli do Deutsche Bank. As vendas no varejo apresentaram queda na margem em agosto, mas ainda com forte alta na base anualizada. A produção industrial apresentou um crescimento robusto em setembro. Já a taxa de desemprego atingiu 6,4% no trimestre encerrado em setembro.
Dólar, fiscal e exterior
A cotação do dólar chegou a ficar próximo de R$ 5,90 na última sexta-feira sob uma combinação de incertezas no exterior e no risco fiscal. “Se esse nível for persistente, isso vai acabar passando para preço. Eu estou surpreso, até certo ponto, que não tenha passado ainda”, diz Gonçalves do Banco Fator, chamando a atenção para a ausência de aceleração de preço em bens industriais, sensíveis ao câmbio.
“Não é possível atribuir toda a queda do real a fatores domésticos”, relembra Volpon. O economista, ex-diretor do Banco Central (BC) vê a alta do dólar no Brasil e no mundo como o posicionamento de investidores no exterior em ativos que podem ser favorecidos por uma vitória de Donald Trump na eleição americana - os chamados “Trump Trades”, entre os quais os títulos do Tesouro dos EUA. “É muito difícil prever o vencedor da eleição dos EUA, mas esse prêmio Trump ainda não está totalmente retirado do mercado”, complementa o ex-diretor do BC, que vê a possibilidade do rendimento das Treasuries de 10 anos subirem para 5% em eventual vitória de Trump. “Se ele perde, teria um trade mais perto de 4%”, completa Volpon.
O ex-diretor do BC faz, porém, um alerta em relação ao fiscal. “Isso tem impactado os prêmios de risco que acabam retroagindo sobre a perspectiva de inflação”, diz Volpon. O governo brasileiro está postergando o anúncio de corte de gastos e declarações desencontradas da equipe econômica reforçam a desconfiança do mercado. “Mesmo que saia alguma coisa hoje do lado fiscal, não tem tempo de avaliar, digerir e se balizar por essas medidas”, diz Gonçalves, que relembra que não são medidas simples, algumas delas necessitando passar pelo rito de votação no Congresso.
Sucessão no Banco Central
Janeiro de 2025 marca a saída de Roberto Campos Neto e a entrada de Gabriel Galípolo na presidência do BC. Há ainda desconfiança sobre a condução da política monetária sob a gestão Galípolo, o que impacta na expectativa do mercado em relação à projeção da inflação futura. “Qual é a vontade realmente dele de assegurar a alta de juros em janeiro?”, questiona Volpon em relação ao compromisso do Galípolo com a condução da inflação para o centro da meta de 3% ao ano. “Se tiver esse compromisso, a Selic deve rumar mais para 13% do que para 12%”, completa o economista, que relembra que o Boletim Focus hoje projeta que o próximo BC não vai entregar a inflação na meta.
A desconfiança do mercado tem origem no voto dividido na reunião de maio, quando os quatro membros indicados pelo governo Lula indicaram continuação da orientação sugerida no encontro anterior de cortar a taxa Selic em meio ponto percentual. No entanto, os cinco membros indicados pelo governo anterior optaram por uma diminuição do corte para 25 pontos-base.
Além disso, há incerteza se Galípolo vai ser parte de um projeto político ou vai respeitar os ritos institucionais do BC e seu compromisso com a estabilidade de preços. “Pelo que já aconteceu até agora, acho que vai ser melhor do que [o mercado] está esperando”, avalia Gonçalves. O economista do Fator relembra a atuação recente de Galípolo em conduzir a inflação para o centro da meta.
“O alerta em relação ao cenário fiscal [que se vê no comunicado] não é de alguém que esteja combinado com o Lula, ou que vai sofrer com o Lula”, completa Gonçalves, que avalia os últimos comunicados do Copom como “uma tentativa bem-sucedida de um perfil no outro”.