O plenário do Senado aprovou na noite desta 4ª feira (27.set.2023), por 43 votos a 21, o projeto de lei 2.903/2023, que estabelece a tese do marco temporal para a demarcação de terras indígenas.
No entanto, na mesma data em que a Casa aprovou o marco temporal, o STF (Supremo Tribunal Federal) retomou a análise do caso e definiu a tese que fixará sobre o tema, que tem repercussão geral. Ou seja, o entendimento deverá ser aplicado em outros casos que tramitam na Justiça sobre demarcação de terras.
O texto trata da demarcação de terras indígenas tradicionalmente ocupadas em 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição. Esse marco temporal estabelece que só as áreas ocupadas ou em disputa até essa data estariam elegíveis para a demarcação.
No Senado, o projeto de lei foi aprovado mais cedo pela CCJ (Comissão de Constituição e Justiça). A comissão também aprovou o requerimento de urgência para a votação do texto.
Saindo da CCJ, o requerimento ainda precisava ser pautado pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG) –que afirmou que colocaria o tema para ser discutido.
O pedido de urgência foi analisado e aprovado pelo plenário do Senado. A aprovação dava aos senadores a possibilidade de votar o texto já nesta 4ª feira (27.set).
Agora, o texto segue para sanção presidencial. O líder do Governo no Congresso, senador Randolfe Rodrigues (sem partido-AP), já adiantou que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) irá vetar os trechos da lei que determinam o marco temporal.
VONTADE DA OPOSIÇÃO
Desde a chegada do texto no Senado, congressistas da oposição têm tentado acelerar a tramitação do projeto. Ao Poder360, o relator do marco temporal, senador Marcos Rogério (PL-RO), afirmou que a vontade da oposição era que o texto fosse votado ainda nesta 4ª.
O marco temporal foi aprovado na Câmara em 31 de maio, com 283 votos favoráveis, 155 contra e uma abstenção. O avanço do texto na Casa Baixa foi considerado uma derrota para o governo Lula. A tese é uma das pautas prioritárias da gestão petista, que é contra o marco temporal.
Em seu relatório, Marcos Rogério manteve o mesmo texto aprovado na Câmara. Caso fossem feitas alterações, o projeto teria que voltar para a Casa Baixa para ser analisado novamente.
Em contrapartida, o governo tentou atrasar a tramitação do texto, insistindo para que o projeto fosse avaliado por mais comissões.
Além disso, governistas apresentaram um texto substitutivo ao projeto de lei que, até então, estava tramitando na CCJ. O senador Alessandro Vieira (MDB-SE) protocolou uma emenda ao texto que, na prática, retirava a tese do marco temporal. No entanto, a proposta foi rejeitada pela comissão nesta 4ª feira (27.set).
Para o senador Randolfe Rodrigues, a insistência da oposição em relação ao tema se dá por uma “ofensiva ideológica”.
“Como eles não conseguem responder à pauta econômica e à melhoria da qualidade de vida do povo, como eles não conseguem dar resposta à circunstância concreta de que o povo voltou a comer picanha e voltou a comer filé mignon e, no tempo deles, estava atrás de osso, como não conseguem dar resposta a essa realidade concreta, ficam buscando pautas ideológicas”, disse Randolfe a jornalistas.
TENSÃO ENTRE SENADO E SUPREMO
O STF (Supremo Tribunal Federal) rejeitou na última 5ª feira (21.set), por 9 votos a 2, a tese do marco temporal. A decisão da Corte aumentou a tensão com o Legislativo.
A relação entre os 2 Poderes já estava abalada por conta de julgamentos do Supremo. A discussão sobre o piso da enfermagem, o marco temporal, a descriminalização do porte pessoal de drogas e a descriminalização do aborto irritou os congressistas, que consideram que a Corte não tem capacidade constitucional para analisar os temas.
Em resposta à decisão do Supremo de rejeitar a tese, congressistas de oposição protocolaram uma PEC (Proposta de Emenda à Constituição) para a retomada do marco temporal. Como mostrou o Poder360, a decisão do STF, além de irritar ruralistas do Congresso, suscitou de vez o desejo do Legislativo de dar uma resposta ao Judiciário.
Depois da sessão na CCJ, o relator Marcos Rogério declarou que a aprovação do projeto de lei pela comissão não era uma “afronta” à Corte, mas acrescentou que o fato do STF defender uma tese diferente da aprovada no Senado e na Câmara significaria “suprimir” e “aniquilar” as competências do Congresso Nacional.
MARCO TEMPORAL
A tese do chamado marco temporal, defendida por proprietários de terras, estabelece que os indígenas somente teriam direito às terras que estavam em sua posse em 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal, ou que estavam em disputa judicial nesta época.
Em 2009, ao julgar o caso Raposa Serra do Sol, território localizado em Roraima, o STF decidiu que os indígenas tinham direito à terra em disputa, pois viviam nela na data da promulgação da Constituição.
De lá para cá, passou-se a discutir a validade do oposto: se os indígenas também poderiam ou não reivindicar terras não ocupadas na data da promulgação.
Assista ao Poder Explica e entenda o que é o marco temporal (6min14s):