Por Walter Bianchi e Rodrigo Campos
BUENOS AIRES/NOVA YORK (Reuters) - A Argentina e o Fundo Monetário Internacional (FMI) têm um dilema de 44 bilhões de dólares, com os dois lados prestes a se reunirem para negociações cruciais para renovar o enorme e instável acordo de dívida do país, fundamental para evitar a inadimplência de bilhões em pagamentos de dívidas iminentes.
O país sul-americano, um inadimplente em série que vem lutando há anos com a inflação e crises cambiais, fechou um acordo de empréstimo de 57 bilhões de dólares com o FMI em 2018, que fracassou e foi substituído no ano passado por um novo programa de 44 bilhões de dólares.
Mas com reservas internacionais negativas e atingida por uma grande seca que afundou as principais colheitas de soja e milho, a Argentina corre o risco novamente de não pagar vencimentos da dívida, com 2,7 bilhões de dólares devidos ao Fundo somente neste mês.
O Ministro da Economia, Sergio Massa, é esperado em Washington já nesta semana para tentar desbloquear as negociações visando acelerar os desembolsos do FMI e aliviar as metas econômicas associadas ao acordo, em processo que será acompanhado de perto por investidores.
"O Fundo sabe que a Argentina é um problema, é seu principal devedor, mas me parece que a negociação estagnou. Não se vê um progresso significativo", disse Ricardo Delgado, da empresa argentina de serviços financeiros Analytica.
Em um sinal de possíveis dificuldades, uma fonte do Ministério da Economia disse na sexta-feira que a viagem de Massa, anteriormente prevista para acontecer nos próximos dias, poderia ser adiada, dependendo do progresso das negociações virtuais.
"Até que tudo esteja fechado, ninguém viaja. Quando tudo estiver pronto, eles viajarão para colocar as coisas no papel. E quando tudo estiver escrito, Massa viajará", disse a fonte.
Nas ruas de Buenos Aires, a pressão está aumentando. A inflação chegou a 114%, corroendo salários e o poder aquisitivo, as reservas caíram e uma em cada quatro pessoas está na pobreza, com muitos culpando -- não pela primeira vez -- a austeridade ligada ao FMI.
"Precisamos mudar essas políticas econômicas, precisamos romper com a dependência do FMI", disse Hugo Godoy, um líder sindical que marchou na sexta-feira em Buenos Aires em protestos contra a forma como o governo lida com a economia e a austeridade.
"Cerca de 43% dos argentinos vivem abaixo da linha da pobreza e 4,5 milhões, 10% da população, passam fome", disse ele.
CONTROLE DE DANOS
O governo espera antecipar mais de 10 bilhões de dólares em desembolsos do FMI programados para este ano, embora esteja relutante em concordar com medidas de austeridade rígidas, de olho nas eleições gerais de outubro, nas quais provavelmente será derrotado.
"Os investidores estão prestando muita atenção aos sinais das negociações com o FMI", disse o economista Gustavo Ber.
"O recebimento de novos fundos, ou pelo menos a reprogramação de desembolsos e pagamentos, seria crucial para reduzir as tensões cambiais e financeiras nesta fase."
Enquanto isso, a Argentina tem rolado a dívida local para adiar os pagamentos denominados em pesos, estendeu uma linha de swap de moeda com a China e enfrenta obrigações com credores estrangeiros privados no próximo ano.
As trocas de dívidas locais e as esperanças de progresso com o FMI fizeram com que os títulos argentinos denominados em dólares subissem de 20 centavos de dólar em maio para 30 centavos agora, embora sigam enfrentando dificuldades.
E muitos temem que mesmo os pagamentos acelerados do FMI não resolverão os problemas da Argentina por muito tempo.
"A antecipação dos desembolsos poderia ser uma solução de 'controle de danos' até o final do mandato do atual governo em dezembro", disse em um relatório o Instituto de Finanças Internacionais (IFF), um grupo de comércio bancário com sede em Washington.
A Argentina recebeu um indício de boas notícias esta semana, com a inflação mensal arrefecendo em maio pela primeira vez em meio ano e ficando abaixo das expectativas dos analistas, embora ainda tenha sido de 7,8% no mês.
"A inflação continua muito alta e afeta todo o cenário econômico, mas o fato de ter diminuído um pouco em relação a abril ajuda a remover alguma pressão", disse um banqueiro argentino, que pediu para não ter seu nome revelado.
"É como um paciente doente com uma febre que diminuiu um pouco. Mas o paciente ainda está doente e ainda tem febre."